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Dois tipos de perigo rondam “Takara - A Noite em que Nadei”, projeto conjunto do francês Damien Manivel com o japonês Kohei Igarashi.
Um é acreditar que a ideia de fazer uma narrativa sem diálogos é algo muito original. O conceito pode produzir algo do porte de “A Ilha Nua”, maravilha poética feita em 1960 por Kaneto Shindo, ou servir para criar mais uma redundância experimental sobre o vazio.
Outro é se encantar com a própria fofura, ao colocar em cena um garotinho japonês vestido com roupinhas de lã, perambulando por uma cidade coberta de neve e se perder nesse olhar afetuoso. Manivel e Igarashi conseguem sobreviver a esses riscos dosando controle e distração.
O périplo do garoto Takara combina aspectos da infância, como o devaneio e descoberta, sempre prazerosos de revisitar. Sozinho em casa, quando o pai sai ainda de madrugada para trabalhar no mercado de peixes, Takara desperta e encontra conforto, primeiro, no mundo imaginário o qual projeta numa folha de papel.
Depois, a caminho da escola, o menino embarca num jogo de se perder e achar, mapeando um mundo despovoado, percorrendo a cidade encoberta de neve. O pequeno explorador vagueia à vontade neste espaço em que os códigos urbanos tradicionais desapareceram soterrados pela brancura e não há adultos para definir rumos.
As tomadas à distância amplificam o espaço e miniaturizam ainda mais o pequenino protagonista, que de longe se confunde com um ponto colorido em movimento num quadro abstrato.
Quando se aproxima do garoto, o olhar ganha um aspecto documental, observando sem dramatizar suas indecisões, as dificuldades de movimento na neve, o frio e o cansaço. Assim, o filme segue as pegadas de “O Balão Vermelho”, hino à liberdade infantil criado pelo francês Albert Lamorisse em 1956.
O fato de Takara estar sempre sozinho justifica a ausência de diálogos, o que não implica silêncios. Ao contrário, a escolha aguça nossa percepção dos sons, dos ruídos que dão outro corpo e concretude ao mundo.
Tal como no inquietante “O Parque”, longa anterior de Manivel, o ambiente ganha uma presença mais palpável que os humanos e se impõe com outra linguagem, que pode não ter falas, mas está sempre em diálogo.
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