Descrição de chapéu

Antes formadores de opinião, famosos agora são pressionados a declarar voto

Influência decrescente da TV vem sendo substituída por tretas na internet

Tony Goes

Anitta passou por um apuro nos últimos dias. A cantora, que diz apoiar a diversidade e a inclusão, foi pressionada pelos fãs a aderir ao movimento #EleNão, de repúdio a Jair Bolsonaro.

Depois de muitas tentativas de sair pela tangente, Anitta finalmente capitulou, ao ser desafiada por Daniela Mercury. Divulgou um vídeo no domingo (23) no qual não só se une à campanha como repassa o desafio a Ivete Sangalo, Claudia Leitte e Preta Gil.

Foi um gesto político, mas a favor dela mesma. Anitta não deve convencer eleitores a mudar de opinião. No entanto, ao declarar sua posição, ela dá um mínimo de coerência à imagem de guerreira pró-minorias que construiu.

O caso de Anitta é o mais vistoso no turbilhão de manifestos online. Sem poder participar do horário eleitoral, famosos de todas as áreas encontraram na internet um canal de expressão. Um observador mais atento perceberá, porém, que nesta eleição atípica eles não estão liderando movimentos, e sim se incorporando a ondas espontâneas que surgem de anônimos.

Nem sempre foi assim. Artistas e atletas tiveram papel crucial na campanha pelas Diretas Já, em 1984. Deram visibilidade a um movimento que nasceu à revelia do governo militar. De repente, ser contra a ditadura deixou de ser coisa de hippie ou de guerrilheiro. 

Gente que não ligava para política viu seus ídolos pedirem eleições diretas e passou a pedir também. Nomes como Christiane Torloni, Osmar Santos, Sócrates e Fafá de Belém eram constantes nos comícios.
Desde então, o mundo dos famosos nunca mais se despolitizou. Em 1989, a classe artística aderiu em peso a Lula. Com algumas dissonâncias: Marília Pêra e Claudia Raia apoiaram Collor e sofreram intenso patrulhamento dos colegas.

Em 2002, Regina Duarte disse que tinha “medo” da possível eleição de Lula em uma peça publicitária do PSDB. A frase a persegue até hoje e foi uma das razões que levaram a Globo a proibir seus contratados de se engajarem em campanhas eleitorais. Mas a emissora nunca impediu, por exemplo, que José de Abreu ou Paulo Betti declarassem paixão ao PT nas redes sociais.

Com seu tempo reduzido e fragmentado entre muitos candidatos, o horário eleitoral gratuito perdeu importância. Mas é discutível se a televisão como um todo também perdeu: a exposição nos telejornais pode ter ajudado Bolsonaro a se manter no topo das pesquisas depois do atentado que o levou para o hospital.

Nos EUA, o apoio maciço de Hollywood a Hillary Clinton não evitou a eleição de Donald Trump. Coisa parecida pode acontecer no Brasil. Envolvidos em bate-bocas com anônimos na web, famosos veem sua influência diminuir. Mas, goste-se ou não, eles ainda fazem parte do jogo.

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