Stella McCartney e Givenchy mostram fusão de gêneros sem resvalar na androginia

Em Paris, grifes aposentam moletom em troca de alfaiataria que suaviza a rigidez dos cortes

Modelo desfila para a Givenchy em Paris Alain Jocard/AFP

Paris

Há uma confusão quando se tenta definir moda "sem gênero", um tipo de roupa que homens e mulheres podem usar. O varejo traduziu esse padrão, já antiquado nas novas passarelas de verão 2019, ou com androginia ou com quilos de moletom, matéria-prima usada à exaustão por Stella McCartney e Givenchy em temporadas passadas.

Agora, ambas retomam o embaralhamento dos guarda-roupas de uma forma mais inteligente e difícil de reproduzir, lançando mão de uma alfaiataria relaxada que suaviza a rigidez dos cortes com cores, mesclando-a a uma imagem essencialmente feminina.

Porta-voz da moda de luxo sustentável, McCartney abusou de linhos e viscose ecológica —que quase não leva petróleo na composição— para criar uma alfaiataria relaxada e bem amarrada em tons de off-white, rosa, oliva e azuis.

As formas são soltas, têm detalhes assimétricos e são levemente ajustadas, para criar a imagem feminina em uma seara reservada aos homens. Macacões forrados de zíperes e com gola esportiva potencializam o viés despojado característico do estilo da estilista.

Os modelos masculinos, novidade no portfólio da grife, recebem o mesmo tratamento de corte e tonalidade da ala feminina, como extensão do discurso de fundir os gêneros sem separá-los completamente.

Não há nem sinal dos moletons, que foram substituídos por vestidos de tricô tingido em técnica de tie-dye. Esse padrão, próprio da moda hippie, assume uma imagem luxuosa quando aplicado no "acid jeans", um tipo de lavagem manchada que usa tons escuros e iluminados.

Os desenhos foram milimetricamente aplicados nas blusas de gola "V", nos conjuntos de calça e camisa masculina e no macacão trajado pela modelo Kaia Gerber, filha de Cindy Crawford e uma das recordistas de passarela desta temporada internacional.

McCartney ainda balanceia a coleção com vestidos fluidos, alguns construídos como lingerie, para reafirmar que sua moda, mesmo relaxada, pende para público feminino.

Bermudas de ciclista, outra aposta já confirmada para o próximo verão, vieram embebidas de estampa floral, padronagem poucas vezes utilizada pela monocromática designer inglesa.

Um nível acima de austeridade veio a Givenchy. A estilista Clare Waight Keller, tesoura do vestido de casamento da atriz Meghan Markle com o príncipe britânico Harry, permitiu-se usar echarpes, tomara que caia e plissados, mas foi a interseção dos armários que conduziu seu estudo.

A escritora e fotógrafa suíça Annemarie Scwarzenbach (1908-1942), que se vestia de homem e é reconhecida como uma das primeiras mulheres andróginas do século 20, inspirou a coleção de cartela baseada em verde militar, beges e lavandas.

Trench coats, calças de cintura alta e jaquetas perfecto, estruturadas com fechos transversais e acabadas com zíperes, compuseram o repertório de Keller para o verão 2019 da marca.

A estilista questiona os signos relacionados à masculinidade e ao conceito de castidade feminina do início dos anos 1910. Por exemplo, em um vestido preto com a parte que vai da linha dos ombros ao pescoço tingida de branco, parecido a um hábito de freira.

No meio, entre o umbigo e a genitália, ela cola linhas metálicas em formato de triângulos com ponta para cima, símbolo da masculinidade.

McCartney e Keller parecem querer desafiar as normas da silhueta perfeita, curvilínea e ajustada, para oferecer uma nova versão de feminilidade, chique, sem rebusco e de alta voltagem imagética.

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