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São Paulo Cia. de Dança executa versão completa de 'O Lago dos Cisnes'

Em temporada com várias montagens do clássico balé, Teatro Guaíra ainda faz adaptação contemporânea da coreografia

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São Paulo Companhia da Dança posa para fotos do espetáculo "O Lago dos Cisnes" no Jardim Botânico de São Paulo Mônica Bento/Folhapress

São Paulo

Pessoas aprisionadas em corpos que não são seus, desejo e frustração, lutas pelo poder, bem e mal que se confundem, a passagem para a vida adulta.

Um roteirista esperto poderia juntar esses elementos em uma série de sucesso, mas os russos chegaram antes —no final do século 19, criaram "O Lago dos Cisnes".

Com música de Tchaikóvski coreografada por Lev Ivanov e Marius Petipa para o Teatro Imperial de São Petersburgo, tornou-se o balé mais visto de todos os tempos. Neste quase final de 2018, uma sucessão de cisnes brancos, negros, tradicionais e modernos tem passado por São Paulo, algo que não ocorria há tempos.

A Paula Castro Cia. de Dança, companhia da escola do mesmo nome, apresentou a obra no final de outubro. No último fim de semana, o Balé Teatro Guaíra, de Curitiba, mostrou seu "Lago" contemporâneo no Alfa. E nesta semana, a São Paulo Companhia de Dança estreia a versão completa do clássico.

É a primeira vez que uma companhia pública paulista faz uma grande temporada —até 2 de dezembro— dos quatro atos do "Lago dos Cisnes".

Há mais de um ano a SPCD vem preparando a estreia. No final do ano passado, apresentou na Sala São Paulo, junto com a Osesp, o segundo ato do balé. Foram apenas duas apresentações, e os ingressos se esgotaram no mesmo dia em que foram postos à venda. 

Em seguida, começaram os preparativos para a megaprodução, envolvendo mais de 50 bailarinos em cena, solistas convidados e a vinda de um coreógrafo internacional.

Mario Galizzi, ex-diretor do Ballet del Teatro Colón, em Buenos Aires, e da Compañía Nacional de Danza, do México, veio coreografar a montagem. O argentino já havia trabalhado com a SPCD em outros clássicos de repertório, mas, como boa parte da turma do balé, considera o "Lago dos Cisnes" especial.

"Dançar um clássico desses define o estado técnico da companhia. Para a protagonista, é o auge, depois disso pode dançar qualquer coisa", afirma Galizzi.

Os personagens Odete e Odile, o cisne branco e o negro, são em grande parte responsáveis por manter o mito da coreografia. Interpretados pela mesma bailarina, eles representam de maneira facilmente compreendida a ambiguidade humana. Bem e mal, castidade e sensualidade, verdade e mentira —cada época ou cultura pode escolher uma interpretação do cisne para chamar de sua.

Embora poucas pessoas tenham assistido ao vivo ao balé completo, ele faz parte do imaginário do público. Para Inês Bogéa, diretora artística da SPCD, é uma tradição que repercute no tempo por falar da humanidade.

"Trata dessa divisão entre dois lados de uma pessoa e de uma sociedade", diz ela. Com esse viés, dá para imaginar como o clássico pode ser interpretado no Brasil de hoje.

Nos quatro atos, o duplo entre a princesa-vítima transformada em cisne e a vilã-predadora disfarçada de mocinha é replicado na alternância de cenas na corte, o mundo civilizado e repressor, e na floresta, o selvagem e o potencialmente libertador.

Na versão da SPCD, a sequência é feita com apenas um intervalo. A mudança de cenário realizada em palco aberto potencializa o drama. Depois de o príncipe descobrir ter sido enganado por Odile, o cisne negro, e seu pai, o mago Rothbart, o castelo desmorona em frente ao público.

Além do efeito cênico, juntar os dois primeiros e os dois últimos ajuda a reduzir a duração do espetáculo. "O público não quer ficar quatro horas assistindo a um balé. Uma obra muito longa, hoje, não faz tanto sentido", diz Galizzi. Sua versão para a SPCD ficou com 150 minutos.

Contar uma história que todos conhecem traz uma vantagem e um problema para Luiz Fernando Bongiovanni, coreógrafo do "Lago" contemporâneo do Balé Guaíra. 

"Você precisa de muito pouco para as pessoas entenderem o que está falando, mas é uma tarefa hercúlea fazer as pessoas se engajarem naquilo como se fosse a primeira vez."

Seu caminho foi ancorar a montagem não na mulher-cisne, e sim no príncipe. É o lado "romance de formação" da obra, também responsável por seu sucesso atemporal.

Na trama, o príncipe Siegfried é obrigado pela rainha-mãe a escolher uma noiva e assumir as responsabilidades de uma vida adulta. Ao conhecer Odete, a mulher transformada em cisne branco, descobre o desejo. Libertar o cisne branco do feitiço do mago é também sua libertação.

Casado com uma psicanalista, Bongiovanni deu tons freudianos ao clássico da dança. A rainha é uma mãe dominadora, que surge com uma saia de 30 metros, debaixo da qual saem todos seus cortesãos na cena do palácio.

Além de castrar os desejos do filho, a rainha faz quase um dueto amoroso com Rothbart, o pai-vilão de Odile, o cisne negro. Esta não faz por menos. "O figurino lembra a mulher-gata do fetiche. Só falta o chicotinho", brinca o coreógrafo.

Mesmo assim, Odile consegue fazer o príncipe acreditar que ela é a verdadeira e casta Odete, na mais famosa fake news do balé, a história conhecida por todos.

A estrutura e a trama do clássico foram mantidas por Bongiovanni. Os movimentos são contemporâneos, a cenografia minimalista. Alguns trechos da composição de Tchaikóvski foram cortados, mas, de uma forma ou de outra, o espetáculo não deixa de ser, no imaginário do público, um autêntico "Lago dos Cisnes".

O Lago dos Cisnes

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