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No centenário de Salinger, destino de seus inéditos continua um mistério

Criador de personagem símbolo da rebeldia juvenil continuou a escrever em décadas de reclusão

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São Paulo

É possível criar uma pequena biblioteca de autores que se exilaram. Um dia, depois do sucesso, o escritor resolve se recolher do mundo, e sua recusa —bem como seu silêncio— começa a pairar para sempre como um mistério.

Um dos mais famosos por não querer ser famoso foi J. D. Salinger, que completaria cem anos nesta terça (1º). Depois do sucesso estrondoso de “O Apanhador no Campo de Centeio” (1951) e de lançar três livros, o autor americano resolveu se escafeder da vida pública em 1965.

Sua vida, hoje se sabe, não era exatamente reclusa. Ia todos os dias à agência de correios de Cornish, cidadezinha no estado americano de New Hampshire onde se enfiou, para receber cartas que trocava com Deus e o mundo —mulheres muito mais novas em especial. A discrição, porém, contribuiu para fazer crescer a mitologia em torno dele.

No próximo ano, completam-se também dez anos de sua morte. E, depois dela, o véu de mistério que criou para si passou pouco a pouco a ser rompido —com biografias, exposições de cartas e, em 2013, contos inéditos que vazaram na internet.

Cem anos depois de seu nascimento, os principais mistérios não são as histórias de alcova, como seus casos com adolescentes, mas se seus inéditos virão à tona. E quando.

Hoje não há mais dúvidas que Salinger continuou a escrever em sua reclusão. Em 1974, irritado com o fato de uma editora tentar publicar textos seus inéditos em livro, ele deu uma entrevista ao New York Times. Nela, revelou ainda escrever todos os dias e por longas horas —agora, contudo, apenas para si mesmo.

Em 2000, a filha do autor Margaret Salinger contou que o pai um dia lhe mostrou um cofre no qual guardava seus escritos, marcados com cores para sinalizar o que deveria ser publicado ou destruído após sua morte.

Em 2014, a biografia “Salinger”, de Shane Salerno e David Shields, trouxe um novo fato. O autor não só continuara a escrever, diziam os biógrafos, como deixara instruções para a publicação de uma série de inéditos entre 2015 e 2020.

Um dos livros seria uma reunião de contos sobre a família de Holden Caulfield, protagonista e narrador de “O Apanhador”. Outro traria contos antigos e inéditos sobre a família Glass, recorrente na obra de Salinger. Estariam previstos ainda outros três —dois inspirados na experiência do autor no front da Segunda Guerra Mundial e outro inspirado no vedanta, religião indiana seguida por ele.

Mas 2015 passou e nada. À imprensa americana, Salerno sustentou o que escreveu e tem dito que só aceita questionamentos sobre a informação depois de 2020.

Nenhuma das obras descritas pelo biógrafo estavam entre os contos vazados em 2013. O que ajuda a lembrar que Salinger tem textos publicados em revistas, como a New Yorker, que nunca foram reunidos em livro.

Em 2015, uma pequena editora americana lançou em livro três desses contos, publicados nos anos 1940 e já em domínio público. Ao tentar vender a obra para o exterior, contudo, foi impedido pelo espólio de Salinger —os herdeiros argumentavam que, fora dos EUA, os textos ainda estavam sob seu domínio.

Os leitores continuarão curiosos. No centenário do autor, a leitura de “O Apanhador no Campo de Centeio” continua um rito de passagem para adolescentes de todo o mundo —e Holden ainda encarna para eles a rebeldia juvenil contra o mundo adulto.

O romance, junto a “Franny e Zooey” e “Nove Histórias”, é publicado no Brasil pela histórica Editora do Autor, fundada por Rubem Braga e Fernando Sabino —Salinger é hoje o único escritor publicado pela casa. “Carpinteiros, Levante Bem Alto a Cumeeira!”, último livro dele, está no catálogo da L&PM.

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