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Cartas contestam versão de que Mário de Andrade seria ateu

Correspondência do modernista com Alceu Amoroso Lima é lançada em livro

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Alceu Amoroso Lima foi um dos críticos literários mais importantes de seu tempo --e um dos primeiros fora de São Paulo a entender a importância do que acontecia na Semana de 1922.

Baseado na então capital, o Rio de Janeiro, o crítico passou a receber obras e cartas de novos escritores que despontavam. Em 1925, começou uma correspondência com um dos líderes do movimento paulista, Mário de Andrade, que lhe enviava uma edição do livro "A Escrava que Não Era Isaura", com uma dedicatória.

Esse grupo de cartas está reunido em uma edição que acaba de chegar às livrarias, com organização do pesquisador Leandro Garcia Rodrigues.

O encontro dos dois nomes pode parecer inesperado. Amoroso Lima era católico e conservador; Mário, o contrário disso. Mas o crítico não via a divisão desse modo --para ele, Mário representava a direita do modernismo, enquanto Oswald seria a esquerda.

"Alceu vai dizer que a literatura moderna brasileira se tornou adulta com Mário. Ele percebia no escritor uma evolução que respeitava a tradição literária, sem ignorar o passado, o que seria o contrário do Oswald. Ele via uma veia conservadora ali", diz o organizador das cartas.

Outro ponto que em tese oporia os dois seria a religiosidade. O modernista costuma ser apontado como ateu, embora tenha tido uma educação católica. Amoroso Lima, além de tudo, chegou a fazer a ponte entre o varguismo e a Igreja Católica --isso em um momento no qual Mário se opunha ao governo.

Mas Rodrigues acha que as cartas permitem questionar a descrença do autor modernista. Em uma das missivas, Mário diz soltar "um grande grito para Deus me escutar".

Alceu Amoroso Lima Filho em foto de 1965
Alceu Amoroso Lima Filho em foto de 1965 - Folhapress

O afastamento de Mário do catolicismo se acirrava com a aproximação da Igreja com Vargas. Isso se agrava em 1938, quando ele é demitido do Departamento de Cultura de São Paulo --é quando entra em um processo depressivo, se muda para o Rio e, não à toa, rompe a correspondência com Amoroso Lima.

Não custa lembrar que o período no Rio, se é uma época de muita tristeza do escritor, também é visto como de desbunde com a sexualidade --o que deveria fazer o colega carola corar. Eles voltam a se falar em 1941, e Mário está mais revoltado com o catolicismo, escreve cartas longas. Mas confessa ao colega que não consegue dormir sem rezar.

"Ele se revolta com a instituição, mas não perde a fé. Como teólogo, vejo uma rachadura no espírito. Ele não consegue deixar de crer em Deus. Quando o Mário morre, Alceu vai escrever que a questão religiosa foi o maior drama da vida dele", diz Rodrigues.

Correspondência - Mário de Andrade e Alceu Amoroso Lima

  • Preço R$ 43,20 (328 págs.)
  • Editora Edusp e PUC-Rio
  • Organização Leandro Garcia Rodrigues
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