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Filme de Carlos Vereza indicado a prêmio não usou Lei Rouanet, mas não se enquadrava nas regras

Por ser um longa-metragem, 'o Trampo' se enquadraria a outros mecanismos, como a Lei do Audiovisual

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São Paulo

Dois artigos virais nas redes sociais exaltam o fato de o filme “o Trampo”, dirigido e estrelado por Carlos Vereza, ter concorrido em agosto ao prêmio de melhor filme estrangeiro no Festival Internacional de Cinema de Madri mesmo “sem dinheiro da Lei Rouanet”.

Como verificado pelo projeto Comprova, de fato, a produção não recebeu financiamento da Lei Rouanet. E nem poderia. Isso porque o financiamento de longas-metragens de ficção, como é o caso de "o Trampo", e séries acontece de forma independente desse mecanismo. Obras desse porte são ancoradas em outra lei, a Lei do Audiovisual, e costumam usar recursos do Fundo Setorial do Audiovisual.

E é verdade que “O Trampo” foi selecionado para a competição mencionada, mas o texto viralizado exagera a importância do festival. O evento faz parte do circuito independente e não figura entre os mais tradicionais da Europa. Enquanto festivais de renome como Cannes, Veneza e Berlim já tiveram mais de 60 edições, o Festival Internacional de Cinema de Madri teve oito edições.

Postagem de site afirmando "sem dinheiro da lei rouanet, filme de carlos vereza é selecionado como melhor filme estrangeiro no festival de madri
De fato, a produção não recebeu financiamento da Lei Rouanet. E nem poderia. - Reprodução Projeto Comprova

De acordo com a Agência Nacional do Cinema (Ancine), órgão que regulamenta essas formas de incentivo público, não há nenhum projeto de nome “O Trampo” em sua base de dados de fomento. O Comprova também consultou o Sistema Ancine Digital (SAD) e não encontrou referências ao filme, a Carlos Vereza ou à produtora do longa, Petci Pedron.

Um longa como “o Trampo” poderia pedir apoio da Lei do Audiovisual — que, de forma similar à Rouanet, funciona por meio de incentivos fiscais (fomento indireto) — ou do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), que financia com recursos públicos (fomento direto) os projetos selecionados.

A Lei Rouanet permite o financimento de curtas e média-metragens. No caso de longas, ela permite apenas o financiamento de documentários, de acordo com o professor da Universidade Federal do Ceará Marcelo Ikeda, especialista em política pública cinematográfica. O professor ressalta que, mesmo para documentários, a Rouanet não costuma ser utilizada.

Ao Comprova, Vereza afirmou ter financiado a produção usando suas economias, com investimento total de R$ 300 mil. A maioria das cenas do filme foi rodada em estúdio — o diretor contou que a maior parte da história se passa dentro do quarto.

Carlos Vereza em quarto escuro, com cortinas vermelhas e aspecto antigo, apontando um revolver, não é possível ver quem está na mira da arma.
Carlos Vereza em cena de 'O Trampo' - Divulgação

Dirigido, produzido, escrito e estrelado por ele, o filme “o Trampo” conta a história de dois matadores de aluguel que se encontram em um quarto de hotel após assassinarem uma juíza. A atriz Rosamaria Murtinho vive uma cantora de cabaré na trama.

Crítico das políticas de incentivo fiscal, Vereza disse que não recorrer à Ancine foi uma escolha. “Quando fiz meu filme, tanto a Rouanet quanto a Ancine só estavam privilegiando produções que fossem ligadas à esquerda. Eu sabia que não ia ser beneficiado nisso e preferi fazer com meus próprios recursos”, disse.

Vereza citou ainda que as dificuldades de financiamento impediram que o filme entrasse no circuito comercial de exibição. De acordo com ele, a produção ainda será exibida nos festivais de Brasília, Rio de Janeiro, Mar del Plata e Cuba.

O Festival Internacional de Cinema de Madri faz parte de um grupo de eventos chamado Film Fest International, que existe há 15 anos e tem sede no Reino Unido. A mesma companhia também produz eventos em Londres (Reino Unido), Nice (França) e Milão (Itália).

De acordo com a descrição no site da competição, o evento em Madri busca “ajudar cineastas a encontrar distribuição e financiamento para sua próxima produção cinematográfica”.

Ao Comprova, Vereza disse considerar que o festival de Madri é um dos mais importantes da Europa, junto com Cannes, Veneza e Berlim. O diretor afirmou que o evento madrileno teve a participação de “Wim Wenders, Manoel de Oliveira e Marco Bellocchio”, mas o coordenador da Film Fest International informou que nenhum desses três cineastas fez parte do festival nas oito edições realizadas até aqui.

Vereza é um dos poucos atores que declararam voto no presidente Jair Bolsonaro (PSL). Em setembro do ano passado, ele visitou o então candidato à Presidência no hospital após ele ter sido esfaqueado durante a campanha eleitoral. Em janeiro, o ator publicou em suas redes sociais uma foto com Bolsonaro.


Também participaram da apuração deste texto O Estado de S.Paulo e Nexo.

Projeto Comprova

O Comprova é uma coalizão de veículos jornalísticos que visa identificar, checar e combater rumores, manipulações e notícias falsas sobre políticas públicas. É possível sugerir checagens pelo WhatsApp da iniciativa, no número (11) 97795-0022.

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