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Cinema

Kiyoshi Kurosawa faz seu melhor filme desde 'Sonata de Tóquio'

Em 'O Fim da Viagem, O Começo de Tudo' , a poesia nasce de um olhar apurado para as manifestações da vida e do mundo

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O Fim da Viagem, o Começo de Tudo

  • Quando Estreia nesta quinta (12)
  • Elenco Tokio Emoto, Atsuko Maeda, Ryo Kase
  • Produção Japão, Uzbequistão, Catar, 2019
  • Direção Kiyoshi Kurosawa

O título brasileiro é bem pomposo: "O Fim da Viagem, O Começo de Tudo". O original japonês, diz o Google tradutor (bem mais confiável do que anos atrás), é algo como "O Começo de Cada Vez".

Fosse um diretor qualquer, seria tamanha a responsabilidade depois de um título desses. Porque o espectador pode já comprar o ingresso à espera de poesia em imagens, por vezes sem se preocupar que tipo de poesia qualifica que tipo de imagem (se for algo como Xavier Dolan, melhor fugir). 

Acontece que o diretor do filme em questão é Kiyoshi Kurosawa (dos clássicos "Cure", de 1997, e "Pulse", de 2000). É, sem exagero, um dos três ou quatro melhores do cinema contemporâneo, e certamente o melhor do Japão desde meados dos anos 1990. Por isso, o que se passa na tela grande é puro deleite cinematográfico.

Cartaz do filme 'O Fim da Viagem, O Começo de Tudo', de Kiyoshi Kurosawa
Cartaz do filme 'O Fim da Viagem, O Começo de Tudo', de Kiyoshi Kurosawa - Reprodução

Acompanhamos uma jovem apresentadora japonesa chamada Yoko (Atsuko Maeda), que chega à etapa final de seu programa de viagens. Neste último episódio, ela vai ao Uzbequistão e toma conhecimento de um outro mundo.

Seu sonho é ser cantora, e os momentos musicais, todos embalados por um onirismo contagiante, são o escape que ela encontra nas andanças pelo belo e desconhecido país que um dia pertenceu à União Soviética.

Mais do que mostrar um programa de viagens, desses que tem aos montes na televisão, em forma de longa, Kurosawa (nenhum parentesco com o mestre Akira) expõe os desejos e as fragilidades da apresentadora, seu cansaço, as discussões da equipe que ela testemunha, incluindo um breve entrevero com a polícia local.

Yoko descobre a gentileza do povo usbeque, mas descobre também um bazar onde se vende de tudo, um parque de diversões com brinquedos raros, um teatro com intensa ligação japonesa (que a equipe ignora por uma mistura de cansaço e arrogância) e a vida pulsante da capital Tashkent.

Da mesma forma, Kiyoshi Kurosawa, em seu melhor filme desde "Sonata de Tóquio" (2008), descobre uma personagem que, apesar de apresentar um programa de TV e de ser vista por muitas pessoas em seu país natal, é gente como a gente, com medos, enjoos, frustrações e sonhos suspensos. 

E o faz com uma poesia que nasce e termina nas pequenas coisas e nos menores gestos, exatamente como pedia Truffaut (nunca a poesia calculada, "a priori", dizia o crítico e cineasta francês). É a vida e nada mais.

Em "O Fim da Viagem...", a poesia nasce de um olhar apurado para as manifestações da vida e do mundo, de uma observação cuidadosa e delicada de costumes diferentes e de pessoas que falam uma outra língua (raramente há o atalho para o inglês, e quando há, é quase sempre infrutífero). Parece pouco, mas é muito mais do que temos ordinariamente no cinema atual.

O filme estreia no Brasil menos de um mês após sua exibição no Festival de Locarno, e três meses após sua estreia no Japão. Nunca um filme de Kiyoshi Kurosawa chegou tão depressa ao circuito comercial.

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