Otavio Frias Filho, jornalista e dramaturgo morto em agosto do ano passado, aos 61 anos, foi assistir diversas vezes a “O Terceiro Sinal”, que entrou em temporada no Teatro Oficina pouco antes de sua morte.
“Ele ficou muito feliz com a montagem, ficou feliz com a reação do público”, conta a editora Fernanda Diamant, viúva de Otavio, que foi diretor de Redação da Folha entre 1984 e 2018. “Foi uma coisa bem marcante nos últimos meses de vida dele.”
A atriz Bete Coelho, que adaptou com ele o texto, a partir de ensaio publicado pelo jornalista sobre uma breve experiência como ator no mesmo Oficina, confirma: “Foi delicioso, foi feliz. A peça serviu para encontros bem próximos. Serviu para brindarmos o encontro dele com o teatro”.
A adaptação está agora no volume “Tutankáton + O Terceiro Sinal”, que será lançado pela Cobogó no dia 12 de novembro, em São Paulo —com bate-papo entre Diamant, Coelho, a diretora Mika Lins e o colunista Marcelo Coelho.
A peça central do livro, “Tutankáton”, havia saído em duas edições anteriores, em 1991 pela Iluminuras, no que foi o primeiro passo do jornalista no teatro, e em 2013 pela Cosac Naify, numa versão refeita por ele mesmo.
A nova publicação, agora, coincide com a primeira montagem de “Tutankáton”, que volta ao cartaz nesta quinta (7).
A ideia de juntar as duas, diz Diamant, foi buscar “um pouco esse jogo entre, de certa maneira, a primeira e a última peça dele”. Para tanto, ela resgatou passo a passo o texto publicado pela Cosac Naify, editora fechada há quatro anos.
“O Otavio editou essa versão minuciosamente, eu acompanhei”, diz ela. “O raciocínio dele foi ganhar precisão, simplificar o vocabulário, um tratamento muito parecido com o que aconteceu com a escrita dele ao longo dos anos.”
A publicação pela Cobogó recupera também uma longa nota do autor sobre a peça, que havia saído apenas na edição da Iluminuras.
O volume como um todo é “teatral”, como descreve Bete Coelho. “Um livrinho de teatro”, como diz Diamant.
A preocupação foi tornar a versão reduzida e revisada de “Tuntankáton” mais acessível, após o fechamento da Cosac, e novamente acompanhada da nota, que abrange indicações para a montagem.
O mesmo raciocínio vale para “O Terceiro Sinal”, que o livro trata como de autoria dele e de Coelho, mas a atriz sublinha que “não tem uma palavra que não seja do Otavio”, do ensaio jornalístico original de mesmo título.
Cortes e reestruturação foram sugeridos pela atriz e aprovados por ele. “Otavio achava que eu tinha criado um personagem de ficção”, lembra ela, que representou o papel do autor. “Chegou uma hora em que passou a ver com distância, como uma peça.”
Na nota que acompanha esta nova edição de “Tutankáton”, Otavio encerra dizendo: “Pede-se que os atores se movam o menos possível e que procurem declamar as falas em vez de interpretá-las”.
A instrução foi especialmente difícil de seguir para Augusto Pompeo, que faz o juiz Fei e responde por alguns dos textos mais longos, os “bifes”, da peça que retorna nesta quinta (7) para quatro apresentações únicas.
Pompeo, 71, marcou a primeira temporada da encenação pela ironia que trouxe ao papel, à primeira vista discursivo. “É um ator extraordinário, que enfrenta esse texto de maneira verdadeira e conta a história, com a escuta mais poderosa e expressiva em cena”, descreve a diretora da peça, Mika Lins.
Ele tem uma trajetória de quase 50 anos que o distanciava das duas demandas da nota. Desde o início, associou-se a musicais e à dança, em espetáculos como “Hair”, “Ópera do Malandro” e o recente “Cartola” ou em grupos como o histórico Dzi Croquettes de Lennie Dale, que vê como mestre.
E se destacou em papéis cômicos shakespearianos como Puck, no “Sonho de uma Noite de Verão” dirigido por Cacá Rosset no Central Park, em Nova York. Outra referência declarada sua é Grande Otelo.
Pompeo abordou a verborragia de Fei, nesta montagem que manteve muito do texto original e mais extenso de 1991, com algumas perguntas para si mesmo.
“Como é que segura o público falando, falando, falando?”, pergunta ele. “Percebi que o texto articulava. Fei não é bonzinho, também não é cruel. Ele é maquiavélico. Ele joga com a situação, percebendo os interesses.”
Outra questão: “Como seria, neste momento do Brasil, um juiz negro? Aí me veio a figura enigmática de Joaquim Barbosa, o sorriso. Eu fui por esse caminho. Tentei humanizar Fei. Ele fala, fala, fala, mas é brincalhão, tem essa coisa da ironia, da sutileza”.
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