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Wes Anderson em Cannes faz celebração do jornalismo com 'A Crônica Francesa'

Décimo longa do diretor americano conta narrativas de revista fictícia baseadas em casos e personagens célebres reais

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Cannes (França)

“A Crônica Francesa” é o nome de uma revista fictícia do século passado que “levou o mundo para Kansas” e vai morrer junto com seu dono. Mas é também 107 minutos de mágica do cinema do começo ao fim, no décimo longa-metragem do diretor Wes Anderson, que estreou nesta segunda no Festival de Cannes.

Narrado pela atriz Anjelica Huston, a história começa com a criação da revista pelo jornalista Arthur Howitzer Jr., vivido por Bill Murray. Baseado em Harold Ross, cofundador da americana The New Yorker, na qual Anderson se inspirou.

Howitzer é um publisher excêntrico e meticuloso que ostenta sobre a porta a tabuleta “é proibido chorar nesta sala” e, morto logo na introdução, deixou instruções detalhadas sobre seu funeral. Entre elas está a de que o próximo número da publicação, que trará seu obituário, será também o último.

Três capítulos então se seguem, cada um representando uma seção da revista –artes e artistas, política e sociedade e “tortas e aromas”, no que é descrito pela divulgação oficial como “uma declaração de amor aos jornalistas”.

A reportagem cultural mostra o detento psicopata Moses Rosenthaler, vivido por Benicio del Toro, que bebe água dentifrícia e pinta telas abstratas tendo como modelo Simone, papel de Léa Seydoux, uma das guardas da prisão, que posa nua para seus devaneios.

Rosenthaler é descoberto casualmente e transformado em expoente da arte moderna por Julien Cadazio, um galerista baseado no barão britânico Duveen, considerado um dos mais poderosos negociantes de arte de todos os tempos. Foi a série “Os Dias de Duveen”, publicada pela New Yorker, que inspirou esse capítulo.

Outro artigo da revista americana sobre o movimento estudantil francês em maio de 1968 inspirou o capítulo político, em que o ator Timothée Chalamet, de “Me Chame pelo seu Nome”, interpreta o líder estudantil Zeffirelli, se envolve com Lucinda Krementz, uma jornalista que tem idade para ser sua mãe, vivida por Frances McDormand.

Na seção de gastronomia, Jeffrey Wright vive o jornalista Roebuck Wright, baseado em duas personagens reais, o escritor James Baldwin e o repórter AJ Liebling. Na ficção cinematográfica, o tenente e chef de cozinha Nescaffier se torna a chave para resgatar o filho de um comissário de polícia sequestrado por criminosos.

É do comediante Stephen Park, que vive o cozinheiro, uma das melhores tiradas no filme. Obrigado a provar os pratos antes de servir à quadrilha, ele se intoxica. Antes de ser socorrido, filosofa “o veneno me fez descobrir um novo sabor, um pouco amargo, acre, terroso, até então desconhecido". "Na minha idade, isso é muito raro.”

"A Crônica Francesa" é mais um bom exemplo de por que o diretor americano já virou nome de uma categoria de cinema, como na frase “é um filme do tipo Wes Anderson”. É surpreendente, original, interessante, divertido, fácil de ver e lindamente enquadrado.

Também alterna sem solavancos trechos em branco e preto com outros em cores suaves mas expressivas, que também são sua marca, a ponto de atrair mais de 1,5 milhão de seguidores para uma conta do Instagram que exibe objetos que deveriam estar em seus filmes.

As imagens do chamado “tapete vermelho”, em que as equipes vestidas de black tie posam para fotos e sobem as escadarias do Grand Théâtre Lumière para uma sessão de gala exibida a mais de 2.300 convidados, também revela parte do seu sucesso. Ao lado de Anderson, de 52 anos, estavam Tilda Swinton, Bill Murray, Benicio del Toro, Adrian Brody e Timothée Chalamet.

Para completar o que a mídia francesa chamou de “chuva de estrelas no Palácio dos Festivais”, faltou Léa Seydoux, que precisou cancelar a viagem após um teste positivo para coronavírus, na semana passada.

Wes Anderson volta ao Festival de Cannes quase dez anos depois de competir pela Palma de Ouro com "Moonrise Kingdom", em 2012. A obra estava pronta para a edição do ano passado, cancelada por causa da pandemia.

Anderson, assim como Nanni Moretti e outros diretores, preferiram segurar o lançamento por um ano para ganhar as gigantescas telas do evento presencial retomado neste ano —nas palavras de um dos jurados, esta não é a 74ª edição, mas a primeira de uma nova era.

O americano já concorreu várias vezes ao Oscar, como melhor roteiro original por “Moonrise Kingdom”, “Os Excêntricos Tenenbaums”, de 2001, e “O Grande Hotel Budapeste”, de 2014 —indicado também para melhor diretor e melhor filme. “O Fantástico Sr. Raposo”, de 2010, concorreu como melhor animação.

Outra animação, “Ilha dos Cachorros”, de 2018, deu a Anderson o Urso de Prata de melhor diretor no Festival de Berlim.

Depois de filmar na França, Anderson começa em setembro a rodar seu novo projeto nos arredores de Madri, e deve mais uma vez ter Tilda Swinton no elenco.

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