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Cinema

'Homem Onça', que faz alusão ao governo FHC, é um filme bem frustrante

Longa que retrata tentativa de renomear Petrobras como Petrobrax promete bem mais do que tem a oferecer

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Homem Onça

  • Quando Estreia em 26 de agosto
  • Onde Nos cinemas
  • Elenco Chico Diaz, Emilio de Mello, Silvia Buarque, Valentina Herszage, Bianca Byington, Tom Karabachian e Álamo Facó
  • Produção Brasil, 2021
  • Direção Vinícius Reis

Em “Homem Onça”, a ação gira em torno da passagem da Gás do Brasil para algum grupo estrangeiro —não sem antes mudar o nome para GasBrax, alusão à tentativa do governo FHC de renomear a Petrobras como Petrobrax.

Com a Gás do Brasil devidamente desestatizada, o novo grupo proprietário —estrangeiro— tem como prioridade a eficiência, ou seja, o aumento do lucro. Isso culmina, claro, em demissões. E essas épocas de demissões testam até o limite o caráter das pessoas, desde o arrivismo mais evidente até a busca pela “própria empresa” como alternativa ao desemprego.

Ou seja, “Homem Onça” está em dia com pautas bem contemporâneas –desnacionalização, desemprego, sustentabilidade (ou falta de). A questão é clara. Bem mais clara, digamos, do que as relações familiares, que se dão em dois momentos relativamente próximos, ambos nos anos 1990.

No primeiro —isto é, o mais antigo—, Pedro —papel de Chico Díaz— mora no Rio de Janeiro, é casado com Silvia Buarque, tem uma filha, que estuda algo como economia ou administração e na faculdade tem aulas com um professor que acha que vender estatais vai dar em mais investimento no país e toda aquela coisa que por sinal nunca acontece.

Algum tempo depois, Pedro vive em companhia de Bianca Byington, numa casa que parece realizar os sonhos de um homem voltado à natureza (na companhia seu negócio são projetos de sustentabilidade). Mas ali não está completamente feliz, já que foi aposentado pela empresa, devido à sua notória recusa em aderir às pautas dos novos proprietários.

Temos então um tema razoavelmente simples, pois nessa altura somos todos pela sustentabilidade e pelo emprego. A desnacionalização é tema controverso, mas, enfim, o público-alvo do filme ao menos estará a par do assunto.

Aqui começam a se mostrar os problemas do filme. A primeira questão é: partindo de questões na ordem do dia se deve optar pelo didatismo —tipo Costa-Gavras, por exemplo—, por uma narrativa mais tradicional —próxima das novelas— e capaz de alcançar um público mais amplo —como se pode pressentir já nas primeiras cenas— ou investir numa narrativa que se pretenda mais contemporânea (e menos popular, portanto)?

É um problema, pois não raro o filme soa antiquado, pronto a adotar a forma de um melodrama tradicional. Mas nem tanto, porque a narrativa faz se encontrarem o passado e o presente, o momento da crise na empresa e o momento posterior —a crise existencial—, a casa no Rio e a outra, no mato, onde Pedro cura —ou não cura— as feridas da derrota na batalha não propriamente contra os novos donos, mas sobre o sentido de sua empresa e, no limite, da própria existência.

Os dois tempos se sobrepõem, pois é disso, afinal, que se trata, do momento em que o modo de vida se transforma de forma um tanto brutal no Brasil (no mundo todo; no Brasil é apenas mais brutal, como de costume), em que o sentido de solidariedade —isto é, de um bem-estar que seja coletivo, compartilhado— cede a um individualismo bastante acentuado.

É uma transformação a que se pode chamar de globalização ou neoliberalismo, possivelmente ambos. Não é coisa pequena. Observar isso à luz de uma dramaturgia antiga não leva muito longe. Mas misturar dois momentos da vida de Pedro e a eles acrescentar eventuais recordações da infância ou momentos de delírio não leva a muito longe.

Tudo isso serve para tornar a narrativa mais opaca, mas nem por isso mais densa. É como se a forma melodramática tradicional estivesse lá, só que encoberta por uma temporalidade enganosa, que não acrescenta nada a ela.

Nada contra a forma melodrama, aliás. O problema é bem menos o gênero do que, vá lá, a escrita, que não se define entre política, poética intimista, novelesca ou vanguardista. Transitando um pouco por todas elas, sem se definir, “Homem Onça” não se completa em nenhuma delas. Não é um mau filme, mas é um filme frustrante que promete bem mais do que oferece.

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