Margaret Atwood diz que as pessoas são vulneráveis às fake news porque têm medo

Autora de 'O Conto de Aia' conversou com Bruna Lombardi no Fronteiras do Pensamento

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Buenos Aires

"O que fazem as ovelhas quando escutam um lobo? Param e prestam atenção, porque sabem que podem ser devoradas. Por isso paramos para ler sobre furacões e tragédias e outras más notícias. E é porque as pessoas têm medo que consomem notícias falsas e alarmantes, por sentido de sobrevivência."

A escritora canadense Margaret Atwood, autora de "O Conto de Aia", ganhadora do Booker Prize, conversou com a atriz e escritora Bruna Lombardi, por meio de teleconferência, no evento Fronteiras do Pensamento, na quarta-feira (27).

Atwood afirmou que espera que o mundo recupere a normalidade após a pandemia do coronavírus o mais rápido possível, porque "o isolamento é muito desnorteante para muita gente, porque se perdeu a noção do tempo". Por outro lado, afirmou que os eventos online "permitiram que atingíssemos muito mais gente, e isso deve continuar e ser acompanhado por melhorias tecnológicas".

Com respostas que devolviam a reflexão para os espectadores e um fino humor, Atwood respondeu a perguntas sobre literatura, política, feminismo e sua visão do mundo de hoje.

Sobre a democracia, disse que "se trata de uma aspiração, mas é uma eleição das pessoas se aproximar dela ou se afastar". "É um trabalho em construção, em nenhum país se atingiu a utopia democrática, mas há os que escolhem estar perto ou longe dela."

E acrescentou que as ditaduras e autocracias costumam se instalar em contextos caóticos, "quando surge um líder que diz que pode organizar as coisas, organizar a bagunça". "É sempre reconfortante ouvir alguém que diz que a situação está sob controle." Nesse contexto, o medo seria um item importante. "Tudo que um autocrata quer é que as pessoas tenham medo de algo para dizer que ele as pode proteger."

Para a escritora, os autoritarismos "estão no cardápio da humanidade", e que, durante a Guerra Fria, se pensou que os totalitarismos podiam ter terminado, mas que a história mostrou que as coisas podem mudar muito rápido e que nenhum país está livre de uma mudança radical de regime.

Atwood falou de seu engajamento e de seu ativismo pela mudança de leis, junto à organização Equality Now. "A partir desse universo, é possível conseguir muitas coisas. É preciso pensar que nos Estados Unidos e no Canadá, por exemplo, as mulheres não podiam ter uma conta de banco e um cartão de crédito nos anos 1970. Um conjunto de leis por mais igualdade mudou comportamentos. Com uma mudança de lei, isso passou a ser possível."

Atwood participa de campanhas feministas em vários lugares no mundo. Na Argentina, por exemplo, acompanhou a aprovação pelo Congresso da lei do aborto, em dezembro do ano passado. "Os coletivos são se uma força extraordinária nos dias de hoje, e acho que estamos vendo um novo momento de forte consciência social, só é necessário transformar essa consciência em ação", afirmou.

Atwood se definiu como uma escritora que deixa seus romances fluírem e que às vezes se surpreende com os caminhos que eles tomam. "Acho que os únicos autores de ficção que precisam ter tudo sob controle são os de romances policiais, porque precisam deixar pistas, manter o suspense e surpreender o leitor no final. Prefiro deixar que a história flua e não a predefino antes, senão estaria apenas completando espaços em branco até o final."

Sobre o futuro, Atwood disse que "não há sentido em não ser otimista". E afirmou que livros sobre o futuro que "parecem sombrios, como '1984', têm um final feliz, porque toda distopia mantém algo da utopia".

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