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Justiça determina despejo do Estação Net Rio, um dos últimos cinemas de rua do Rio

Com mais de seis mil assinaturas, abaixo-assinado pede a permanência do cinema

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Rio de Janeiro

O Rio de Janeiro pode perder em breve um de seus principais cinemas de rua, espaços que vêm definhando na cidade. No final de outubro, a Justiça determinou o despejo do Estação Net Rio, cinema localizado no bairro de Botafogo, na zona sul carioca, e um dos mais emblemáticos da capital fluminense.

Em novembro do ano passado, a cidade já havia perdido o Cine Joia, cinema de rua que encerrou as atividades por problemas financeiros.

Localizado no bairro de Botafogo, a Estação Net Rio foi alvo de uma ordem de despejo no final de outubro - Divulgação/Grupo Estação Net

A decisão sobre o Estação faz parte do processo movido pelo GSR, o Grupo Severiano Ribeiro, que é proprietário do imóvel e alega que os aluguéis e outras taxas do prédio estão atrasados desde março do ano passado, quando a pandemia começou. A dívida até outubro era de pouco mais de R$ 860 mil.

Na decisão, a juíza Elisabete Franco Longobardi determinou o pagamento dos aluguéis atrasados e a desocupação do imóvel em até 15 dias. Caso não seja desocupado de forma voluntária, ele poderá ser alvo de uma ordem de despejo.

Para embasar a decisão, a magistrada escreveu que os problemas financeiros causados pela pandemia não são motivo para a falta de pagamento.

Diretora executiva do Grupo Estação Net, Adriana Rattes não vê o problema dessa forma. Ela explica que a pandemia obrigou os cinemas do Rio a fecharam as portas a partir de março, cenário que mergulhou o setor em uma crise.

"Naquele momento, a gente não tinha nenhuma reserva de caixa. Empresas pequenas e médias trabalham hoje para pagar o gasto de ontem. Ainda mais em uma economia que vinha em crise desde 2016", diz Rattes, acrescentando que precisou usar os recursos disponíveis para pagar os funcionários do grupo, formado por 75 pessoas na época.

Como o aluguel vencia em 15 de março, dois dias após o fechamento dos cinemas por causa da pandemia, Rattes diz que entrou em contato com Mauricio Benchimol, diretor de patrimônio do grupo GSR, para falar que não poderia arcar com o aluguel, uma vez que precisava pagar os funcionários.

Em agosto, porém, Rattes voltou a falar com Benchimol e disse que já tinha recursos para pagar o aluguel de março. A essa altura, o Estação Net havia conseguido dinheiro graças a uma vaquinha, na qual arrecadou cerca R$ 750 mil, e a um adiantamento financeiro da Net, empresa que patrocina o cinema.

Em razão do fechamento das salas, Rattes tentou negociar um reajuste no aluguel mínimo do imóvel, fixado em R$ 60 mil por mês. A ideia era voltar ao valor normal quando a reabertura acontecesse. No entanto, segundo ela, o representante do GSR disse que só falaria por meio de advogados.

"Isso foi uma resposta surpreendente e até um pouco brutal. Até o momento, a gente vinha conversando normalmente sobre esse assunto.", diz ela. "Nunca houve uma situação desse tipo com a gente."

O grupo GSR então foi à Justiça pedir o encerramento da renovação do aluguel por causa da inadimplência. Em paralelo, solicitaram também o despejo do Estação Net Rio. A juíza acolheu o primeiro pedido em fevereiro deste ano. Já a decisão favorável ao despejo veio no dia 26 de outubro.

Rattes explica que, sem o cinema, o grupo Estação pode perder de 35% a 40% de seu faturamento. Isso, diz ela, colocaria em risco a existência da empresa, que tem quatro complexos de cinema e emprega atualmente 56 pessoas.

Para tentar salvar o cinema, foi feito um abaixo-assinado que já contava com mais de seis mil assinaturas na manhã desta quinta (11). O objetivo é chegar a 7.500 mil signatários

"A gente nem sabe se vai continuar existindo, porque nem sequer vai ter a possibilidade de, durante alguns anos, recuperar os prejuízos", diz ela, referindo-se às perdas financeiras geradas pela pandemia. "É um cenário gravíssimo para a gente."

Rattes diz que, em uma reunião com o grupo, tentou negociar mais uma vez, mas soube de um plano para transformar o cinema em um prédio residencial.

"Entendo e respeito que eles sejam donos do imóvel e que tenham interesses econômicos sobre ele. A gente tentou negociar o tempo inteiro com essa premissa", diz ela. "Mas também entendo que temos direitos comerciais sobre aquele imóvel pelos anos que estamos lá." O Estação Net recorre da decisão da Justiça em segunda instância.

Em nota, o Grupo Severiano Ribeiro, por meio de Mauricio Benchimol, afirma que não tem nada definido sobre o futuro do imóvel e que tentou por várias vezes quitar a dívida com o Grupo Estação. O GSR afirma ainda que tomou a decisão porque a relação comercial com a empresa teria se tornado insustentável.

"É o tipo de decisão difícil, mas que por vezes se torna necessária, para a sobrevivência de uma empresa familiar, de 104 anos, com mais de 1.000 colaboradores, que também foi drasticamente afetada pela pandemia e em nenhum momento deixou de buscar seus parceiros em busca de negociações justas para ambas as partes."

Morador de Botafogo e cineasta, Cavi Borges diz que frequenta o Estação há 30 anos. "Eu vi meu primeiro Almodóvar, meu primeiro Truffaut, meu primeiro Godard", lembra. "Tempos depois, nesse mesmo cinema onde descobri esses diretores , eu consegui lançar os meus filmes."

Com um eventual despejo do Estação, ele diz que os impactos sobre o audiovisual do país serão grandes. "A gente quase não tem cinema que passa filme brasileiro. O Estação é um bunker de resistência", afirma o cineasta. "A gente perde uma casa para o cinema brasileiro e para os realizadores. Sem esse espaço, a nossa situação, que era difícil, vai ficar mais difícil ainda."

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