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Porchat refaz passos de Saramago por Portugal em série sobre seu centenário

Comediante conversou com celebridades portuguesas em viagem que vai ao ar em seis episódios na RTP

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Lisboa

Celebridade também do outro lado do Atlântico, o ator e apresentador brasileiro Fabio Porchat recebeu a missão de refazer os passos de José Saramago, morto em 2010, na jornada pelo território lusitano que deu origem a uma das obras mais marcantes do escritor: "Viagem a Portugal", publicada há mais de 40 anos.

O resultado da expedição –que inclui muitas conversas com moradores e entrevistas com personalidades portuguesas– será mostrado em uma série, batizada com o mesmo nome do livro, a ser exibida em 2022 na RTP, a TV pública portuguesa.

Com seis episódios de uma hora de duração, a produção será um dos destaques das comemorações do centenário do nascimento do vencedor do Nobel de literatura, celebrado em 16 de novembro de 2022.

Fã de Saramago antes de participar do projeto, Porchat diz que se lembra bem da sensação da primeira vez em que leu uma obra do português.

"Estava lendo ‘Ensaio sobre a Cegueira’ indo para uma tribo indígena no meio da Amazônia. Eu estava numa canoa, lendo na ponta do barco, com aquele sol na cabeça. Enquanto o livro de Saramago ia descrevendo os personagens já andando em meio aos excrementos, o barco fez um movimento e entrou água no fundo. A primeira coisa que passou pela minha cabeça foi 'que nojo, pisei nesses excrementos’", conta.

"Aí eu percebi que eu tinha me desconectado completamente do lugar onde eu estava e tinha entrado no livro. Foi a primeira vez que isso aconteceu comigo. Foi tão impactante que eu demorei alguns segundos para me dar conta de que eu estava em outro lugar", completa.

Apesar do fascínio pelo trabalho de Saramago, Porchat diz que só foi ler e conhecer "Viagem a Portugal" após receber o convite para a série. Mistura de crônica, narrativa e recomendações, a obra é resultado da jornada feita pelo autor de Norte a Sul do país entre outubro de 1979 e julho de 1980.

Além de se impressionar com o que viu em Portugal, Porchat também se diz surpreendido com o reconhecimento do público lusitano, mesmo nas cidades menores.

O brasileiro afirma que o processo de refazer os passos de Saramago, inclusive se encontrando com pessoas que estiveram com ele durante o percurso, tem sido muito marcante.

"Visitamos lugares onde ele esteve, conversamos com pessoas com quem ele falou. Em Tentúgal, comi os pastéis que ele comeu, servidos pela mesma pessoa que o serviu, feitos pelas mesmas mãos que fizeram os dele", relata.

"É emocionante e muito gostoso, é bonito estar dentro deste Portugal que talvez muitos portugueses ainda não conheçam e que eu, como brasileiro, não conhecia", diz.

O diretor da série, Ivan Dias, conta que a escolha de um brasileiro como protagonista ajuda a trazer mais frescor e novos olhares ao que se passa em Portugal, uma vez que permite captar nuances às vezes imperceptíveis para quem vive no país.

"O próprio Saramago, quando começou sua viagem, teve de ir primeiro à Espanha. Ele ficou alguns dias por lá, porque ele tinha de ter a sensação de quem vinha de fora", relembra.

Dias também relacionou o posicionamento e o ativismo de Porchat aos valores de Saramago.

"O humor do Saramago é um humor muito fino, por vezes hermético. Só um humorista ou um ator com esta veia poderia realmente contar a história que o Saramago tenta contar, aparentemente hermética e densa, mas com um fino humor. E depois eu fui descobrindo também o engajamento social e político dele [Porchat] com ideias muito próximas das do Saramago", destaca.

Em um trecho da série antecipado para a imprensa, Porchat conversa com desenvoltura com idosos de uma cidade do interior. O diálogo entre gerações e a ampliação do público do escritor também no mercado internacional são um dos objetivos do projeto.

Viúva de Saramago e à frente da fundação que leva o nome do escritor, a espanhola Pilar del Río, 71, detalha uma programação intensa para o centenário de nascimento do autor, que em 1998 tornou-se o primeiro (e até agora único) escritor lusófono a vencer o Nobel de literatura.

"Vai haver uma série de acontecimentos culturais, múltiplos e transversais. Vai ter teatro, música, leitura, congressos acadêmicos, apresentações de livros e novas edições dos livros de Saramago. Mas nós, no fundo, temos um objetivo: que Saramago seja um motor que provoque atividades culturais", diz.

Em Portugal, as novas edições de Saramago chegam às livrarias na última semana de novembro, incluindo uma versão ampliada de "Viagem a Portugal", que inclui fotos inéditas feitas pelo próprio escritor.

Pilar del Río não segura as lágrimas ao folhear a novíssima edição, com quase 700 páginas.

"É emotivo, mas é o que se tem de fazer. Quando alguém tem de fazer algo, faz e ponto. Saramago me pediu para continuá-lo, e por acaso disse isso em São Paulo. Ele me pediu para que o continuasse. Então vou continuá-lo. Como? Escrevendo? Não, é impossível. Protegendo seus livros? Sim, mas, sobretudo, militando nessa ideia humanista de compaixão e solidariedade que Saramago tinha. É minha forma de continuá-lo, não tenho outra", completa.

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