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'Triangle of Sadness', de Ruben Ostlund, vence a Palma de Ouro em Cannes

Festival ainda distribuiu prêmios a filmes de Hirokazu Koreeda e Claire Denis; veja a lista completa

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Cannes (França)

O Festival de Cannes chegou ao fim neste sábado premiando o longa "Triangle of Sadness", de Ruben Ostlund, com a Palma de Ouro, maior honraria do evento francês. O troféu foi entregue numa pomposa cerimônia na qual também saíram vitoriosos, em empates, "Close" e "Stars at Noon", escolhidos para o grande prêmio, e "Le Otto Montagne" e "EO", para o prêmio do júri.

O diretor de "EO", Jerzy Skolimowski, agradeceu nominalmente os seis burros que estrelam seu longa e foram a grande sensação da Riviera, arrancando risadas da plateia. "Obrigado, meus burros. I-ó", disse.

Cena do filme "Triangle of Sadness", de Ruben Ostlund, que integra a mostra competitiva do Festival de Cannes de 2022
Cena do filme "Triangle of Sadness", de Ruben Ostlund - Divulgação

"Triangle of Sadness" causou furor ao tecer uma crítica bastante afetada e estapafúrdia aos super-ricos, fazer piadas com capitalismo e comunismo e levantar bandeiras como a do feminismo, ao acompanhar um casal de modelos e influenciadores que é convidado para um cruzeiro que acaba naufragando.

Houve ainda a entrega de um prêmio especial pelos 75 anos do festival, destinado aos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, de "Tori et Lokita". Os atores que apresentaram os melhores trabalhos desta 75ª edição, segundo o júri, foram Zar Amir Ebrahimi, do filme "Holy Spider", e Song Kang Ho, de "Broker".

As honrarias de direção e roteiro foram para Park Chan-Wook, de "Decision do Leave", e Tarik Saeh, de "Boy from Heaven", nesta ordem, enquanto a Câmera de Ouro, destinada ao melhor estreante de qualquer seção do festival, ficou com Riley Keough e Gina Gammell e seu "War Pony", com menção especial a "Plan 75". A Palma de Ouro de curta-metragem foi arrematada por "The Water Murmurs", enquanto "Lori" recebu uma menção especial.

Encabeçado pelo ator francês Vincent Lindon, o júri que escolheu os vencedores da competição principal foi formado pelo cineasta iraniano Asghar Farhadi, o cineasta americano Jeff Nichols, a atriz e diretora britânica Rebecca Hall, a atriz indiana Deepika Padukone, a atriz sueca Noomi Rapace, a atriz e diretora italiana Jasmine Trinca, o diretor francês Ladj Ly e o diretor norueguês Joachim Trier. ​

Mesmo tendo sido bem aceito por público e crítica, "Triangle of Sadness" surpreendeu, afinal, Ostlund venceu a Palma de Ouro não há muito tempo, por "The Square: A Arte da Discórdia", de cinco anos atrás. A vitória mais inesperada, no entanto, foi a de Claire Denis, com um filme que desagradou a boa parte do público.

Logo que o nome da cineasta foi anunciado para o grande prêmio do júri, o auditório da premiação foi tomado por vaias vindas dos fundos da sala. O público também começou a aplaudir no meio do discurso da diretora para interromper. Na sala ao lado, onde membros da imprensa e da indústria assistiam à transmissão ao vivo, as vaias foram avassaladoras.

"Stars at Noon", um thriller sensual ambientado na Nicarágua, foi um dos mais mal recebidos dentre os longas da competição. Denis, vale dizer, já dirigiu Vincent Lindon anteriormente, o que suscitou queixas de que ela poderia ter sido favorecida a despeito da recepção de seu filme.

"É muito raro um grupo de nove pessoas, de personalidades e culturas diferentes, se reunir por 15 dias e não ter nenhum desentendimento", se limitou a dizer Lindon em conversa com a imprensa logo após a cerimônia. Normalmente, os jornalistas podem fazer perguntas sobre os premiados do júri, o que não aconteceu nesta edição.

Foi estranho ver Lukas Dhont e "Close", celebradíssimos nesta edição, empatarem no grande prêmio justamente com Claire Denis e "Stars at Noon". Os aplausos recebidos pelo primeiro e as vaias para a segunda, alternando-se em questão de segundos, explicitaram um tanto da incoerência das escolhas deste júri.

Robert Ostlund com a Palma de Ouro que venceu por "Triangle of Sadness" - Stephane Mahe/Reuters

"Close", aliás, parecia estar com a Palma de Ouro nas mãos nas últimas horas do festival, então vê-lo perder o troféu para "Triangle of Sadness" foi um balde de água fria para muita gente. Até porque soa precipitado premiar com uma segunda Palma de Ouro um diretor ainda tão jovem e que está longe de ser uma unanimidade.

Foram poucos os cineastas já premiados em dose dupla e a escolha talvez reflita um ano em que Cannes não apresentou nada que tenha de fato arrebatado os espectadores. As conversas pelos corredores do Palácio de Festivais com frequência descreviam a seleção deste ano como morna.

"Triangle of Sadness" foi um dos poucos a gerar grande comoção, apesar de também atrair críticas por funcionar como uma série de esquetes de humor estridente.

"Eu gosto, nos meus filmes, de trazer o público para ambientes divertidos e neles promover discussões importantes, sobre a sociedade que construímos. Eu quero respeitar o público, deixar que ele se divirta ao meso tempo em que trato de coisas importantes", disse Ostlund em conversa com a imprensa, com a Palma dourada brilhando à sua frente. "Agora eu pretendo continuar filmando na Europa, quem sabe com algum dinheiro americano."

"Close", por sua vez, concetrou mais apostas e teria sido uma escolha mais interessante para a Palma de Ouro, no sentido de reconhecer um novo talento cinematográfico em ascensão –e a desculpa de ele ser jovem e iniciante demais não cola, ao menos não após Julia Ducournau levar o troféu no ano passado.

Dos 21 longas em competição, 10 saíram com prêmios. Houve empate nas duas categorias mais importantes após a Palma de Ouro e também a entrega de um troféu comemorativo especial. Este foi um júri em nada mesquinho, o que pode mostrar ou uma discrepância entre as escolhas individuais, ou certa falta de critério e convicção.

Num ano também sem grandes atuações, Zar Amir Ebrahimi e Song Kang Ho fizeram por merecer, assim como Tarik Saleh, que construiu um complicado e envolvente thriller político no mundo árabe, juntando especificidades locais a um gênero largamente utilizado com maestria.

Ele e Ebrahimi, aliás, são dois premiados da noite que vivem em exílio –o diretor e roteirista tem sua obra banida no Egito, enquanto a atriz caiu em ostracismo no Irã nos anos 2000 após o vazamento de um vídeo íntimo. É um fato notório numa lista que também premia os irmãos Dardenne por fazerem o que sempre fazem, e que pode ter sido inconscientemente conduzida por uma demanda por discussões sociais latentes.

Ao menos os Dardenne não levaram com ineditismo uma terceira Palma de Ouro, algo que muitos acrediatavam ser possível. "Tori et Lokita", seu filme, é embaraçosamente eurocêntrico —o que também pode ser dito de Claire Denis—, e parece ter amolecido o júri majoritariamente euro-americano e branco.

Antes da cerimônia de encerramento do Festival de Cannes, alguns prêmios paralelos e de fora da mostra principal já haviam sido entregues. Na seleção Um Certo Olhar, o grande vencedor foi "Les Pires", de Lise Akoka e Romane Gueret. Outros contemplados foram "Joyland", com o prêmio do júri; "Metronom", em direção; Vicky Krieps, de "Corsage", e Adam Bessa, de "Harka", com as melhores atuações; "Mediterranean Fever", em roteiro, e "Rodéo", com o Coup de Coeur, espécie de prêmio de consolação. ​

A Associação Internacional de Críticos de Cinema, a Fipresci, entregou seus troféus a "Leila's Brothers", na competição oficial, "The Blue Caftan", na Um Certo Olhar, e "Love According to Dalva", na Quinzena dos Realizadores. Já a Palma Queer, destinada a filmes com temática LGBTQIA+, foi para "Joyland", entre os longas, e "Will You Look at Me", entre os curtas.

O Brasil, que nesta edição de Cannes teve apenas uma participação simbólica, saiu sob a promessa de, quem sabe, retornar ao evento com candidatos fortes –o país foi contemplado, na figura de "O Casamento", de Maíra Bühler, com o fundo Hubert Bals, que ajuda projetos cinematográficos a saírem do papel.

Colaborou Guilherme Genestreti

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