Conselheiros do Iphan vão ao MPF contra desmonte do órgão sob governo Bolsonaro

Funcionários dizem que direção da entidade de preservação tomou decisões monocráticas, atropelando o colegiado

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Brasília

Conselheiros do Iphan pediram que o MPF, o Ministério Público Federal, apure a conduta da direção do órgão após a atual presidente, Larissa Peixoto, atropelar o conselho da entidade e orquestrar mudança dos membros do grupo.

O pedido foi feito em representação assinada por dez nomes. Eles se baseiam em reportagem da Folha que revelou que Peixoto tem tomado decisões sem a aprovação do conselho consultivo, instância máxima do instituto. Paralelamente, a presidência trabalha na recomposição de seus membros.

A presidente do Iphan, Larissa Peixoto
A presidente do Iphan, Larissa Peixoto - Pedro Ladeira - 13.dez.2021/Folhapress

Ao MPF eles afirmam que foram surpreendidos com a publicação da reportagem e pedem "apuração e adoção das medidas administrativas e judiciais que [o MPF] entender pertinentes". O grupo também considera que a possível retirada dos atuais membros da sociedade civil do conselho "representa violação frontal à democracia e retrocesso social" e que tem o "nítido propósito de 'deixar passar a boiada'", em referência à fala do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. ​

O conselho consultivo do Iphan é a instância que, na prática, decide sobre tombamentos, patrimônios a serem preservados ou a liberação para que obras protegidas viajem para exposições fora do país.

No entanto, em pelo menos dois processos deste último tipo aos quais a reportagem teve acesso —um deles, de obras do acervo do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, o MAC—, a direção do Iphan deliberou sem a aprovação dos conselheiros. A justificativa é de que o grupo está em "processo de recomposição de seus assentos" e que as decisões serão ratificadas após as renomeações.

Procurados pela reportagem de forma reservada, conselheiros disseram que não sabiam de qualquer tipo de recomposição e que não haviam sido consultados sobre o assunto na ocasião.

"Registre-se que nenhum dos conselheiros foi convidado para qualquer reunião, ordinária ou extraordinária, para tal finalidade ou mesmo para discussão/aprovação das pautas apreciadas unicamente pela presidente", dizem ao Ministério Público.

Eles citam ainda que Larissa Peixoto autorizou, sem os consultar, o destombamento de obras e que "um conjunto de ações vem se implementando, com o passar do tempo, no sentido de enfraquecer o conselho consultivo, inclusive diminuindo o número de reuniões e afastando da apreciação do colegiado questões complexas".

O conselho é composto por 23 nomes —a presidência, cinco representantes do poder público, quatro representantes de entidades independentes e 13 profissionais de notório saber que representam a sociedade civil.

Como mostrou a Folha, sob Bolsonaro, o grupo vive uma paralisia histórica. Agora, a direção do órgão estuda também trocar a maior parte dos conselheiros, que por sua vez temem que o grupo seja aparelhado por pessoas alinhadas ao governo, como aconteceu com outras áreas do instituto.

A brecha para alteração dos nomes foi aberta após o decreto do próprio Bolsonaro, que, em abril de 2019, extinguiu diversos conselhos federais com participação da sociedade civil, inclusive o do Iphan —que foi reconstituído posteriormente.

Como mostram outros documentos aos quais a reportagem teve acesso, em janeiro deste ano, a presidência do Iphan —por meio do secretário do conselho consultivo— questionou a procuradoria do órgão sobre qual seria a data de término do mandato desses representantes da sociedade civil.

A brecha está numa portaria de janeiro de 2021 do Ministério do Turismo que renomeou o conselho após Bolsonaro extinguir o órgão.

O documento cita, explicitamente, que os membros do poder público e de entidades independentes têm mandato de quatro anos contados a partir daquela data, mas não diz nada sobre o mandato dos membros de notório saber.

"A portaria mencionada foi silente, entretanto, quanto à data a partir da qual contaria o prazo do mandato dos membros de notório saber", alerta o Iphan.

A procuradoria responde, então, que concorda com a visão da secretaria de que, para os representantes da sociedade civil, vale na verdade a data da portaria de nomeação anterior, de 18 de abril de 2018 —essa que cita explicitamente o tempo do mandato dos representantes da sociedade civil.

A portaria de 2021 só "oportunizou novas designações aos representantes das entidades" e os membros de notório saber "encerrarão seu mandato em 20 de abril de 2022", diz a procuradoria.

Na teoria, isso significa que o mandato dos membros da sociedade civil, de notório saber, que constituem a maior fatia do grupo, já se encerrara e que pode haver trocas a qualquer momento. E, pela lei, é a presidência do Iphan quem nomeia esses representantes.

Procurado, o Iphan não se posicionou até a publicação desta reportagem.

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