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Elena Ferrante tem falsa morte anunciada em pegadinha de jornalista

Tommaso De Benedetti imitou perfil de casa que publica a autora em espanhol para divulgar notícia falsa

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São Paulo

O mundo literário foi pego de surpresa na noite desta quarta-feira, quando o jornal The Independent publicou a notícia de que a escritora Elena Ferrante teria morrido. O texto dizia que seu editor, Sandro Ferri, tinha confirmado a informação. Mas o susto demorou pouco mais de meia hora, quando a notícia saiu do ar.

Capa do livro 'A Amiga Genial', de Elena Ferrante
Capa do livro 'A Amiga Genial', de Elena Ferrante - Divulgação

Na verdade, a informação circulava no Twitter desde as 20h, num perfil com o nome de Editorial Lumem, imitando uma das casas que publica os textos da autora em espanhol.

Cerca de uma hora depois de essa conta anunciar a morte da autora em Roma, a pegadinha foi revelada. "Esta conta é uma farsa criada pelo jornalista italiano Tommasso Debenedetti", dizia o perfil. Minutos depois, a página foi tirada do ar e alterada para o nome Pino J. Picchio.

Tuíte anunciando que a conta que divulgou a morte de Elena Ferrante era falsa
Tuíte anunciando que a conta que divulgou a morte de Elena Ferrante era falsa - Reprodução

Seu nome é velho conhecido do mundo das armadilhas virtuais e fake news envolvendo grandes personalidades. Seus tuítes já mataram papa Bento 16, Fidel Castro, Pedro Almodóvar e já houve até mesmo a publicação de declarações falsas em nome do presidente afegão Hamid Karzai, de um ministro espanhol e do presidente sírio, Bashar al-Assad.

Em entrevista ao jornal The Guardian, há dez anos, Debenedetti afirmou que faz esse tipo de pegadinha para mostrar como as redes sociais não são confiáveis. "A mídia social é a fonte de informação mais inverificável do mundo, mas os meios de comunicação acreditam nela por sua necessidade de ser veloz", disse ele.

Suas farsas incluem ainda a invenção de entrevistas de autores como John Grisham, Arthur Miller, Gore Vidal, Toni Morrison, Derek Walcott e Philip Roth, que chegaram a ser vendidas para jornais italianos. O farsante foi descoberto pela primeira vez em 2010, quando um jornalista perguntou a Roth sobre as suas críticas a Obama numa entrevista ao jornal italiano Libero. O escritor negou ter dado a entrevista.

"A imprensa italiana nunca verifica nada, especialmente se estiver próximo de sua linha política, e é por isso que o jornal de direita Libero gostou dos ataques de Roth a Obama", afirmou Debenedetti.

A suposta morte de Ferrante já espantava diversos usuários nas redes sociais, que também traziam à baila o dado de que seu nome, na verdade, é um pseudônimo. A autora da famosa tetralogia napolitana, iniciada no livro "A Amiga Genial", de 2011, nunca teve sua identidade revelada, mesmo que seus livros tenham feito grande sucesso e até virado filmes, como "A Filha Perdida", de 2021, e uma série da HBO.

Em entrevista dada ao jornal El País em 2010 e republicada neste jornal, Debenedetti relatou fazer notícias falsas desde o ano 2000. "A técnica consistia em procurar os jornais pequenos. Não pagavam muito, mas compravam tudo", ele contou. Na ocasião, ele inventou entrevistas com o autor Gore Vidal, que não conversava com a imprensa, mas que foram publicadas em diversos veículos da Itália.

Ele seguiu praticando esses golpes com grandes nomes, já que suas farsas eram de interesse da mídia. "Percebi que o que interessava não era a cultura, mas os grandes nomes. A verdade é que me diverti horrores nesses dez anos."

Debenedetti afirmou ainda que os veículos sabiam que os conteúdos eram falsos. "Todo o mundo sabe que os escritores dão entrevistas para promover seus livros. Minhas entrevistas iam além disso —quase sempre eram políticas. Eu atribuía a eles um viés de direita. Isso me divertia, e eu sabia que aqueles jornais pediam isso."

No Brasil, os livros de Elena Ferrante são publicados pela Intrínseca. Sua mais recente obra, "I Margini e il Dettato", foi publicada no final do ano passado pela editora Edizioni E/O, mesma casa responsável por toda a sua obra na Itália —tanto a de ficção, quanto a de não ficção.

O novo livro é uma antologia de textos com poucas páginas —no original, apenas 160— e muita densidade. Já saiu em Portugal com o título "As Margens e a Escrita". No Brasil, deve sair em 2023.

"L’Invenzione Occasionale", lançada na Itália em 2019, e em Portugal no mesmo ano, como "A Invenção Ocasional", também é inédita no país. Trata-se de uma coletânea de textos publicados no britânico The Guardian, quando Ferrante foi colunista do jornal. As colunas, que poderiam ser lidas como ensaios ou crônicas, de outro lado, também poderiam ser acompanhadas como contos.

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