Titãs fazem 40 anos com histórico de brigas e disco de inéditas criado com Rita Lee

Sérgio Britto, Branco Mello e Tony Bellotto celebram aniversário com músicas que mesclam MPB com punk anarquista

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Os Titãs, Branco Mello, Tony Bellotto e Sergio Britto, que lançam disco Zanone Fraissat/Folhapress

São Paulo

O novo disco dos Titãs, ainda que seja inédito, é como uma viagem às diferentes fases da banda, que agora faz 40 anos e, desde 2016, traz só três dos oito integrantes da formação original.

Ora num ritmo acelerado de punk anarquista, ora numa MPB sossegada, "Olho Furta-Cor", lançado nesta sexta-feira, reúne os gêneros pelos quais o grupo é conhecido e surge, segundo o vocalista Sérgio Britto, para mostrar que, mesmo com tantas mudanças nessas quatro décadas, a essência segue a mesma daquela plantada pelo octeto nos anos 1980, no pátio do colégio Equipe, em São Paulo, onde os artistas estudaram durante a adolescência.

"Este álbum é para comemorar os 40 anos, mas também para provar para nós mesmos que a nossa química continua viva", diz o músico. "A gente faz o que pode para manter a chama acesa. O que mais nos aproxima é fazer coisas novas e, talvez, isso seja mais prazeroso do que ficar olhando o passado."

Com 14 faixas inéditas, "Olho Furta-Cor" faz alguns acenos ao clima conturbado da atual política brasileira em canções como "Apocalipse Só" —marcada por um coral indígena do Xingu e versos sobre uma catástrofe anunciada— e "Caos", que usa o lema anarquista "si hay gobierno, soy contra" e é composta por Rita Lee, Roberto de Carvalho e Beto Lee.

Há também referências ao escândalo envolvendo soldados das Nações Unidas que abusaram sexualmente de crianças no Haiti, em 2018, em "Por Galletas". Mas, mesmo com temas violentos e letras recheadas de desilusão política, o guitarrista Tony Bellotto afirma que "Olho Furta-Cor" oferece, acima de tudo, boas doses de otimismo.

"Nós acompanhamos o processo da redemocratização brasileira de maneira muito visceral. Na nossa infância e adolescência, vivíamos numa ditadura militar. Britto mesmo viveu anos fora do Brasil, exilado, com o pai. Então, é assustador ver que, depois disso tudo, um governo de extrema direita chegou ao poder com tanto apoio popular", afirma o músico. "Mas o disco é como um olho furta-cor. Estamos chocados, mas também esperançosos."

Complementando o colega, Britto diz que, embora o país viva hoje com ameaças à democracia, existe no ar o cheiro de renovação, com uma busca por novos rumos políticos, o que ele aponta estar no novo disco em canções como "Há de Ser Assim", que clama por empatia.

três homens lado a lado
Retrato da banda Titãs - Zanone Fraissat/Folhapress

Além da famosa veia anarquista dos Titãs —destaque de alguns dos maiores sucessos deles, como os discos "Cabeça Dinossauro", de 1986, e "Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas", de 1987—, o lado romântico do grupo também tem espaço em "Olho Furta-Cor".

Em "Preciso Falar", por exemplo, há versos sobre uma paixão gay cercada por conflitos de insegurança e sexualidade, cantados sob um arranjo romântico para dançar a dois. Em evidência no novo disco, a mescla entre punk rock contestador e MPB romântica não é um feito novo na carreira do grupo, mas, assim como em obras anteriores, deve fazer alguns fãs torcerem o nariz.

"No geral, as pessoas esperam que a gente explore outros terrenos e misture as coisas, porque é uma marca nossa", diz Britto. "Mas a gente tem alguns fãs desse nosso lado mais, digamos, pesado, que acreditam que falta autenticidade para outros gêneros, que essas são músicas comerciais ou de mentira."

Não foi só entre gêneros musicais que os Titãs transitaram nessas quatro décadas. Um vaivém de integrantes também já mexeu bastante com o grupo. Isso porque há quem diga que estar numa banda é como estar num casamento e, nessa lógica, os Titãs já passaram por cinco divórcios.

Pivôs da maioria das separações, atritos entre membros atuais e antigos são detalhados num documentário lançado há pouco pela série "Bios. Vidas que Marcaram a Sua", no Star+. No filme, o trio Britto, Bellotto e Branco Mello se reúne ao lado da maioria dos ex-integrantes e conta como o octeto foi se desmanchando ao longo tempo.

"Todos nós estamos, agora, mais maduros. Foi muito revelador ver como os ex-integrantes enxergam certos momentos", afirma Bellotto. "Hoje em dia, a gente pensaria muito diferente se fosse mandar alguém embora", afirma, ao comentar a saída de André Jung, que deixou a banda em 1984, numa espécie de expulsão.

Antes mesmo de o primeiro álbum dos Titãs ser lançado, já havia acontecido, na verdade, o primeiro rompimento. Inicialmente, os adolescentes eram nove, mas Ciro Pessoa deixou o grupo em tão pouco tempo que sua saída foi ofuscada.

Depois dele, veio a despedida de Jung, que foi substituído por Charles Gavin. Oito anos depois, Arnaldo Antunes rompeu com a banda e foi seguir carreira solo. Em 2001, foi a vez do guitarrista Marcelo Fromer deixar saudade —e não por uma saída voluntária ou forçada, mas sim por uma morte causada num trágico acidente, episódio que ganha destaque no documentário.

No ano seguinte, Nando Reis fez como Antunes e decidiu seguir a carreira solo. Em 2010, Gavin também deu adeus aos Titãs e, quatro anos depois, o cantor e ator Paulo Miklos fez o mesmo.

Além de trazer diferentes versões desses rompimentos, o filme mostra rusgas que os músicos travaram com artistas como Lulu Santos e Liminha. "Apesar das eventuais rusgas que tivemos, existe um respeito e convívio civilizado entre nós. E acho que o documentário atesta bem isso", diz Bellotto.

Recentemente, o grupo anunciou uma pausa das atividades, devido ao estado de saúde de Mello, que, no fim do ano passado teve um nódulo diagnosticado na hipofaringe e precisou fazer uma cirurgia. Depois de operar, o músico ficou sete meses afastado do microfone e, em junho, voltou a cantar, com parcimônia.

"Nesses 40 anos juntos, aprendemos a lidar com as situações adversas que a vida nos apresenta", afirma Branco, por email. "Já estou de volta aos shows tocando baixo e cantando 'Cabeça Dinossauro'. Em nenhum momento pensamos ou tememos pelo fim da banda."

Já Bellotto diz que os músicos do grupo não só se surpreendem pelo tempo de carreira, como também se questionam com frequência sobre o futuro.

"A permanência dos Titãs é uma coisa que surpreende até a nós mesmos, porque foram muitas transformações, mas a cada mudança houve um espírito coletivo que se sobrepôs às individualidades", afirma ele. "A gente sempre questiona se vai prosseguir."

Olho Furta-cor

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  • Autor Titãs
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