Descrição de chapéu
Governo Lula

Lula resgata o verde e amarelo na posse e ecoa ufanismo de Villa-Lobos

Presidente transmitiu apreço por diversidade e acenou para a imensidão do povo brasileiro, numa tentativa de unir o país

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Foi coerente a escolha de executar peças de Heitor Villa-Lobos durante a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Pela televisão, era possível ouvir o quarto movimento das "Bachianas Brasileiras nº2", "O Trenzinho Caipira", de 1930, e excertos das "Bachianas Brasileiras nº5", de 1945, pouco antes de Lula discursar no parlatório, para uma multidão.

O presidente Lula, com a primeira dama Janja, o vice-presidente Geraldo Alckmin e sua esposa Lu Alckmin, na subida da rampa do palácio do Planalto, com o povo brasileiro, durante cerimônia de posse de Lula à presidência da República, em Brasília - Eduardo Anizelli/Folhapress

Embora irregular, a execução da Orquestra Sinfônica de Músicos pela Democracia serviu para responder às críticas sobre a ausência da música de concerto na cerimônia de posse. A ausência desse repertório ignoraria a história da música brasileira e seria um desprestígio para instituições públicas, que divulgam a obra de importantes compositores nacionais.

Villa-Lobos não deixa de ser um nome óbvio, mas sua presença na cerimônia se mostrou fundamental —assim como ocorreu na nossa música, afinal, Villa-Lobos influenciou até mesmo o piano de Antônio Carlos Jobim. Sobremaneira, a inserção do autor das "Bachianas Brasileiras" fez parte da tentativa de resgatar os símbolos nacionais, sequestrados pela ideologia bolsonarista nos últimos quatro anos.

De inspiração nacionalista, a obra de Villa-Lobos se articula politicamente de modo complexo, à imagem e semelhança do compositor, que vislumbrou o patrimônio natural do Brasil, mas apoiou o autoritarismo do Estado Novo varguista. Como boa parte de sua obra, as composições executadas na posse de Lula mimetizam os sons de uma nação grandiosa, de vasta fauna e flora e tom ufanista.

Acontece que a música de Villa-Lobos, também por estar acima de disputas partidárias, é, não raro, admirada por setores conservadores da sociedade. Ou mesmo bolsonaristas, que identificam na obra uma orientação de "bom gosto" do "cidadão de bem", aliando o nacionalismo ufanista, cultivado pela extrema direita.

Ainda mais curioso é lembrar que as "Bachianas Brasileiras" datam de um período de conservadorismo
formal na obra de Villa-Lobos. Em tempos recentes, dois episódios exemplificaram tentativas de apropriação política da obra do compositor.

A reinauguração do Museu do Ipiranga, em setembro de 2022, e a discussão na plateia num concerto da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Osesp, no Carnegie Hall, em Nova York, também no ano passado. Tocando Villa-Lobos, Lula quis resgatar a ideia de compositor nacional, aquele que recria a identidade brasileira pelos sons.

Sob o aspecto visual, o cerimonial da posse teve ativa participação do público para passar a mensagem desejada. Durante o discurso no parlatório, uma imensa bandeira do Brasil foi estendida e agitada pela multidão.

Na parte da noite, os shows do intitulado Festival do Futuro, com apresentações de Pabllo Vittar e da nova ministra da Cultura, Margareth Menezes, ocorreram em palcos com a estrutura da bandeira nacional com suas estrelas.

Semanas antes da posse, quartéis de todo o país foram tomados por militantes bolsonaristas, todos vestidos nos mesmos verde e amarelo. Ao trazer um distintivo bolsonarista para a própria posse, Lula mostra consonância estética com o lema de seu terceiro mandato, "União e Reconstrução".

Não por acaso, o presidente salientou, em seu discurso, que governará para todos, num esforço para apaziguar os ânimos do país dividido pela política. Mas, nessa disputa, a vitória foi do PT,
salientou a militância.
A bandeira, afinal, cobriu uma massa toda vestida de vermelho, reafirmando a posse de um governo mais à esquerda.

Na subida da rampa do Palácio do Planalto, o vasto Brasil, imaginado por Villa-Lobos ganhou forma, com a presença de um indígena, uma mulher negra, um rapaz com deficiência e um menino negro.
É um equilíbrio que deve ser desenvolvido por Lula o quanto antes.

Lula terá de subir outra vez na corda bamba, trocando, com o vice, Geraldo Alckmin, do PSB, sua gravata vermelha por uma toda azul.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.