Descrição de chapéu Virada Cultural

Sem projeto, Prefeitura de São Paulo gastará R$ 10 mi para metaverso na Virada

OUTRO LADO: Município diz que os detalhes serão anunciados depois que uma empresa for contratada

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São Paulo

A Prefeitura de São Paulo lançou um edital que prevê gastos de R$ 10 milhões para realizar parte das atividades da Virada Cultural —as que supostamente vão acontecer no metaverso, realidade virtual em que o público pode interagir por meio de avatares.

A Folha pediu explicações sobre como vão funcionar as atividades, mas a Prefeitura não soube informar os detalhes. A administração não explicou, por exemplo, como as pessoas vão acessar o festival na realidade virtual nem se os shows serão transmitidos no metaverso. Algumas plataformas exigem o uso de aparelhos específicos para isso.

Público acompanha show dos Barões da Pisadinha durante a Virada Cultural de 2022 na zona Leste de São Paulo - Eduardo Knapp/Folhapress

Em nota, a Prefeitura afirmou que "as parametrizações e diretrizes" do evento dependerão da empresa contratada por meio do edital, e não da administração municipal. Disse ainda que a liberdade que a entidade terá para criar o evento impede que detalhes sejam divulgados de antemão.

Segundo o edital, a organização da sociedade civil escolhida pelo poder público deverá desenvolver uma plataforma que tenha alta capacidade de receber o público e conteúdo transmitido ao vivo em canais de streaming.

"As ações a serem realizadas pela organização parceira visam ampliar o debate sobre as novas possibilidades para os usuários e cidadãos interagirem com o mundo real e virtual", diz o documento.

Para Diogo Cortiz, professor de design e inteligência artificial da Pontifica Universidade Católica de São Paulo, a PUC-SP, a redação do edital é confusa e não especifica o que a prefeitura entende como metaverso. "Não está claro se terá avatar nem se os usuários poderão interagir uns com os outros por meio deles."

Outro ponto que o professor considera problemático é o pouco tempo para desenvolver o projeto. A Prefeitura diz que o edital está com o prazo de apresentação de propostas em aberto, mas o documento já define 22 de abril como data limite, isto é, um mês antes do evento.

O pesquisador afirma que o prazo não é viável para criar uma boa ferramenta. "É muito difícil em um mês fazer uma plataforma que tenha boa interação, experiência de uso adequada e que suporte o tráfego de pessoas."

As duas primeiras Viradas Culturais ocorreram em novembro de 2005 e maio de 2006 com o objetivo de democratizar o acesso à cultura e de ocupar a cidade, atraindo as pessoas para fora de suas casas, oferecendo atrações gratuitas ou a preços populares.

No ano passado, a virada voltou a ser realizada após dois anos de hiato em razão da pandemia de Covid, trazendo shows de nomes como Ludmilla, Luísa Sonza e Criolo. Com um público de 3 milhões de pessoas, a Virada foi marcada por manifestações políticas, roubos e arrastões.

Cortiz acredita ainda que fazer uma virada no metaverso pode comprometer o caráter democrático do festival. Este também é um dos argumentos que o vereador Toninho Vespoli, do PSOL, usou para acionar o Tribunal de Contas do Município, que diz que vai analisar o caso.

O vereador pede que o órgão investigue por que o poder público está investindo dinheiro para realizar o festival usando uma tecnologia pouco difundida no país. "Não é razoável investir tanto dinheiro em um evento que o público não tem o mínimo acesso, quando nas outras partes da cultura só se fala em corte de despesas e terceirização", diz ele, em nota.

Cineasta e sócio da Árvore Experiências Imersivas, Ricardo Laganaro diz que o metaverso foi importante durante a pandemia para aproximar de forma virtual o público de exposições e espetáculos. "Mas tem que fazer de maneira bem pensada porque pode virar um recurso que poucas pessoas vão saber como usar e ter acesso", diz ele, que dirigiu o curta-metragem de realidade virtual "A Linha".

Para evitar que isso aconteca, ele diz ser importante criar plataformas que não exijam o uso de óculos de realidade virtual, um utensílio pouco acessível. O cineasta também considera o prazo inviável. "É possível criar um mundo virtual usando plataformas que já existem, como o VR Chat, mas mesmo assim não é muito adequado."

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