Astrud Gilberto ganhou US$ 120 por 'Garota de Ipanema' e foi boicotada por Stan Getz

Saxofonista americano recebeu cerca de US$ 1 milhão por álbum 'Getz/Gilberto', do qual a baiana participou

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São Paulo

"Ela era apenas uma dona de casa". Foi assim que o saxofonista americano Stan Getz definiu a cantora Astrud Gilberto, morta nesta segunda-feira, responsável pela gravação em inglês de "Garota de Ipanema" que levou a bossa nova para o mundo.

Astrud Gilberto, cantora brasileira de bossa nova e jazz de fama internacional - Divulgação

Enquanto o músico faturou cerca de US$ 1 milhão pelo disco "Getz/Gilberto", de 1964, a então esposa de João Gilberto ganhou apenas o valor que o sindicato dos músicos americanos pagava por uma noite de trabalho: US$ 120 —o equivalente a cerca de US$ 1.180 hoje, ou R$ 5.800, com os ajustes de inflação ao longo das décadas.

Ela tinha 22 anos quando fez a gravação, em 18 de março de 1963. O disco vendeu mais de cinco milhões de cópias pelo mundo, ficou nas paradas da Billboard por 96 semanas e venceu quatro Grammy. Na primeira prensagem do disco, Astrud não foi creditada no vinil.

Os dados são do livro "Chega de Saudade: A História e as Histórias da Bossa Nova", de Ruy Castro, colunista da Folha. Ele ainda lembra que João Gilberto, por sua vez, ganhou US$ 23 mil pelo trabalho. Astrud foi casada com o pai da bossa nova entre 1959 e 1964.

Na ocasião da gravação, com João Gilberto, Getz e Tom Jobim, o letrista Norman Gimbel discutia como seria feita a tradução das composições para o inglês e Astrud se ofereceu para cantar o clássico da bossa nova. Ela ainda daria voz à versão de "Corcovado", vertida como "Quiet Nights Of Quiet Stars".

Mesmo reconhecendo o sucesso, em entrevista, Getz disse que a pôs no disco porque João Gilberto não podia cantar a música em inglês. "A música foi um sucesso, e isso se consagrou como um golpe de sorte para ela", disse ele.

Astrud respondeu à repercussão arrogante anos depois, lembrando dos produtores como "lobos que se fazem passar por ovelhas", mas que considera mentirosa a versão da história de que teria sido descoberta por eles.

"Acho que eles se sentiram importantes por terem sido os que tiveram a 'sabedoria' para reconhecer o potencial no meu canto. Suponho que deveria me sentir lisonjeada com a importância que eles dão a isso... Mas não posso deixar de me incomodar por terem recorrido à mentira", disse.

Gene Lees, editor da revista DownBeat, relembrou em entrevista que, na época do lançamento do disco, Getz buscava Creed Taylor, o produtor, insistentemente para garantir que Astrud não recebesse royalties pelo trabalho.

Na época do lançamento do disco, Astrud se separou de João Gilberto, enquanto o cantor fazia uma turnê na América do Norte como parte da banda de Getz.

"Além de estar no meio de uma separação e lidar com as responsabilidades de ser uma mãe solteira em meio a uma nova carreira exigente, eu também estava lidando com o fato de estar sozinha pela primeira vez na minha vida, em um país estrangeiro, viajando com um filho, passando por dificuldades financeiras", disse Astrud, anos depois, ao relembrar o período.

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