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Feira do Livro sai de rascunho para arte-final em sua segunda edição

Evento literário firma os dois pés no calendário de São Paulo e incrementa vendas de editoras ao atrair público plural

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São Paulo

Pessoas esticadas na grama passando protetor solar, crianças se lambuzando com sorvete, cachorros trotando de lá para cá. Isso é, também, uma Feira do Livro —como ficou claro durante esse feriado de Corpus Christi em São Paulo.

Os dias, ensolarados sem trégua, cooperaram para que o evento da Associação Quatro Cinco Um e da Maré Produções, enfim, mostrasse a que veio. Era como se fosse a primeira vez em que ele se realizou plenamente, ou ao menos a primeira vez que os paulistanos se apropriaram dele como comunidade.

Plateia cheia na mesa com os romancistas Ana Maria Gonçalves e Itamar Vieira Junior - Gabriel Cabral/Folhapress

Numa das mesas mais cheias do festival, o historiador Luiz Antonio Simas louvou o encantamento que surge dos encontros nas ruas a um público que corroborava justamente o que ele estava dizendo.

Uma feira do livro é congraçamento popular, como às vezes dá para esquecer ao ver os principais eventos literários brasileiros —a Bienal, realizada dentro de pavilhão fechado, e a Flip, que exige dos visitantes de fora de Paraty um considerável investimento financeiro.

Chamariz clássico, as palestras com autores e intelectuais eram gratuitas em meio às tendas das editoras, aproximando tanto quem chegava cedo para garantir um bom lugar quanto quem passava ali casualmente depois de comprar churros para o filho.

Escritores populares como Itamar Vieira Junior, Ana Maria Gonçalves e Geovani Martins atraíram multidões em torno de suas conversas; as plateias testemunharam falas emocionadas de João Silvério Trevisan, Txai Suruí e Fatima Daas; e pensadoras de ponta como Sueli Carneiro e Patricia Hill Collins fizeram aparições raras, fruídas com atenção.

Mas a mesa de Collins demonstrou um dos problemas mais chamativos do evento. Numa decisão fora do comum, a organização optou por transmitir pelos alto-falantes a tradução simultânea, e não a voz dos autores.

É uma escolha justificável pela tese da acessibilidade, mas que ficou particularmente incômoda quando a palestra dela sobre o combate ao patriarcado passou a ser amplificada ao público por um tradutor homem.

A decisão também produzia um efeito estranhamente silenciador. Quem estivesse um pouco mais distante da mesa do poeta Jericho Brown acharia, pela voz, que se tratava de uma pessoa sóbria e monocórdia, e não a figura expansiva e cativante que seduzia no palco.

Esses encontros, contudo, ocupavam apenas uma de um mar de tendas brancas que se espalhava pela praça Charles Miller. Editoras, livrarias e até autores independentes sorriam de orelha a orelha com um público ávido por comprar livros.

A lotação impressionou ao longo dos cinco dias, com uma presença massiva de leitores desde o começo da manhã —quando a contação de histórias no Espaço Folhinha, fruto de parceria da feira com o jornal, era disputada por dezenas de crianças em êxtase— até a noite alta. Segundo estimativa da organização, cerca de 35 mil visitantes passearam pela praça.

Algumas tendas, distribuídas em torno do gramado, estavam tão concorridas que mal era possível encontrar brecha para entrar. Mas a disposição do espaço não favorecia a todas igualmente, o que gerou reclamações que valem menção.

Se havia editoras com posição de destaque —na entrada, perto da tenda de autógrafos, do auditório principal— outras exigiam mais boa vontade dos visitantes para encontrar seus livros. Algumas casas, viradas para o barranco que circunda o Pacaembu, sofreram mais para atrair gente.

O caso gerou celeuma, por exemplo, com a editora Tabla, focada em literatura árabe, que chegou a pagar por um espaço, mas depois desfalcou a feira ao ver que tinha sido colocada num lugar que considerou desfavorável.

São ajustes que podem ser feitos para os próximos anos. E a Feira do Livro tem mostrado que sabe corrigir erros —neste ano, havia muito mais oferta de comida e café gratuito para os visitantes, como prometido.

A Feira tem tudo para entrar com os dois pés no calendário paulistano. Num momento em que ainda não se sabe nada sobre a próxima edição da paratiense Flip exceto a data em novembro, o campo parece mais aberto do que nunca para novidades.

E a demanda por esse tipo de evento grita de todo lado. Das editoras, que têm suas vendas arejadas numa nova época do ano, dos leitores, que querem estar perto de quem os inspira, e da cidade, que bem que merece mais convites singelos assim para se acomodar, sentar e abrir um livro.

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