Mostra contrasta telas de Guignard com mobiliário e as paisagens de Minas Gerais

Universo rural aparece em peças de madeira da designer Etel Carmona e série de pinturas inéditas feitas por David Almeida

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'Noite de São João', pintura de Alberto da Veiga Guignard de 1961

Detalhe de 'Noite de São João', pintura de Alberto da Veiga Guignard de 1961 Sergio Guerini

São Paulo

Quando era criança, Etel Carmona serrou os pés de sua cama enquanto seus pais dormiam porque ela era muito alta. O pequeno ato de rebeldia foi um dos primeiros gestos estéticos da garota que, décadas mais tarde, se tornaria designer. "Comecei desde pequena. Depois, fui morar num sítio em Louveira, no interior de São Paulo, chamei um marceneiro e ele me ajudava. Comecei a fazer as coisas na garagem", ela conta.

Hoje com 76 anos, a designer de móveis autodidata se tornou designer no momento em que a palavra mal existia para descrever a profissão, na segunda metade do século 20, graças a diversas visitas de pesquisa ao Liceu de Artes e Ofícios, em São Paulo, e aos ensinamentos do marceneiro Moacir Tozzo, um de seus principais mestres. Mais tarde, há 30 anos, ela fundou a Etel, galeria que se tornou referência na produção e venda de clássicos do mobiliário moderno brasileiro.

'Serração' (2023), pintura a óleo sobre madeira de David Almeida
'Serração', de 2023, pintura a óleo sobre madeira de David Almeida - Sergio Guerini

Agora, as três décadas de ofício de Carmona são celebradas numa exposição que reúne diversas de suas peças menos vistas na Casa Zalszupin, um espaço de exposições em São Paulo, antiga residência do arquiteto e designer Jorge Zalszupin.

São bancos, banquetas, mesas de jantar, um aparador, vasos, castiçais e outros objetos diversos feitos artesanalmente com madeiras grossas, de aspecto meio bruto, trabalhando o encaixe de uma parte na outra, com o uso mínimo de parafusos.

"Toda peça tem que ter beleza, funcionalidade e ergonomia para ser boa", afirma a designer, sobre os princípios norteadores de seu trabalho. A seleção de peças exposta foi escolhida de modo a remeter ao universo da infância de Carmona no interior rural de Minas Gerais —isso aparece de forma mais clara, por exemplo, numa espreguiçadeira com rodas tipo as de carro de boi e nas mesinhas laterais com o tampo no formato da flor maria-sem-vergonha.

Os laços da designer com o interior do Brasil são reforçados na mostra pelas pinturas de escala diminuta do jovem David Almeida, por um lado, e, por outro, pelas telas clássicas de Alberto da Veiga Guignard.

Pintor do cânone, Guignard consagrou em suas obras as montanhas, os céus e o povo dos rincões de Minas Gerais.

A convite dos organizadores da exposição, Almeida passou uma semana na casa onde Carmona nasceu, no alto da serra da Mantiqueira, período no qual conta ter estabelecido uma rotina monástica de acordar às cinco da manhã e pintar in loco as paisagens dos arredores até a hora do sol cair.

O resultado são 14 pinturas inéditas, a maioria sobre madeira, algumas mais figurativas e outras mais abstratas.

"A pintura tem essa coisa espiritual de padre arrumando a missa. Todo dia o pintor tem que ir ao ateliê e prestar contas àquele altarzinho da pintura, ouvir o que ela tem a dizer e depois voltar. É uma relação de labor", afirma Almeida, acrescentando que Guignard foi uma forte influência na sua formação.

Paisagem Interior - Etel Carmona, David Almeida e Alberto da Veiga Guignard

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