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Florbela Espanca chocou a crítica portuguesa com seus versos sensuais há cem anos

Sonetos da escritora integram o próximo volume da Coleção Folha Clássicos da Literatura Luso-Brasileira

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Porto Alegre

Parecia tratar-se de um texto elogioso. "Numa senhora nem com uma flor se bate", escreveu Nemo, pseudônimo do jornalista português J. Fernando de Souza, em 1923. Nas páginas do jornal A Época, ele acrescentou: "E se o seu nome é Florbela, quem terá a coragem da rudeza?".

Na crítica literária escrita há cem anos, Nemo se referia à poeta Florbela Espanca, a quem não poupou senões em nome do "dever de dizer a verdade salutar". Mas, enquanto tentava apontar aquilo que considerava negativo, acabou elogiando os versos da conterrânea.

florbela espanca lê carta em ambiente escuto iluminado por luz na janela
A atriz portuguesa Dalila Carmo como Florbela Espanca em cena do filme 'Florbela', dirigido por Vicente Alves do Ó - Divulgação

"Logo no primeiro soneto nos impressiona a música do verso heroico, fluido como o murmuro de água serpenteando mansamente entre flores", escreveu sobre os poemas de "Livro de Soror Saudade".

Em outro elogio-ataque, deixou transparecer o que de fato lhe incomodava. "Fecha o livro com um soneto poeticamente perfeito, se a forma, o ritmo e a cor fossem tudo na arte, mas que é revoltantemente pagão, digno de ser recitado em honra da Vênus impudica".

Espanca estava sendo julgada moralmente, na verdade. Era o conteúdo e não a forma que aborrecia o seu crítico. Quando o eu lírico da autora diz que está "de rastros" diante do amado, que considera, como "um Deus", Nemo diz que é "atitude de escrava de harém, que não de mulher cristã". E conclui: "com pesar afirmo que é um livro mau o seu, um livro desmoralizador".

O recorte centenário do jornal consta no espólio de Florbela Espanca do Museu Nacional de Portugal, disponível na internet. Ao contrário do registro, cuja argumentação foi derrotada pelo tempo, a poesia de Espanca sobreviveu ao século entre as mais relevantes em língua portuguesa.

O conjunto de sonetos da poeta integra a Coleção Folha Clássicos da Literatura Luso-Brasileira e chega às bancas no domingo, dia 17.

No volume estão poemas que tratam sobretudo de paixões, delírios sensuais, saudade, natureza e a passagem do tempo. O eu lírico da autora frequentemente se dirige a um homem adorado, exaltando suas qualidades, seja por um amor romântico ou fraternal.

Em "Frieza", ela escreve sobre um interlocutor acusado de indiferença e "abandonos cruéis e desleais". "Os teus olhos são frios como as espadas,/ E claros como os trágicos punhais,/ Têm brilhos cortantes de metais/ E fulgores de lâminas geladas."

Espanca escreve sobre condições humanas que são muito contemporâneas, como a ansiedade. Em "Rústica", ela inveja a "moça mais linda do povoado", que caminha "sempre contente" pelo "mesmo trilho" enquanto vive uma rotina simples e rural. O eu lírico lamenta: "Meu Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!/ Dou por elas meu trono de Princesa,/ E todos os meus Reinos de Ansiedade."

"A rigidez do formato e das rimas contrasta com a temática sombria e de uma sensualidade inovadora para a época", afirma Adriano Schwartz, professor de literatura da Universidade de São Paulo, na contracapa da edição. O formato é justamente o soneto, composto por dois quartetos e dois tercetos.

A poeta teve uma vida trágica, marcada por mortes, abortos espontâneos, divórcios e tentativas de suicídio. Sua intimidade também era motivo de escândalo.

"Num espaço de menos de dez anos, no início do século 20, assumiu três matrimônios e dois divórcios, mantendo ainda relações adúlteras, que terão sido motivo de escândalo na ética social portuguesa dos anos 1920, essencialmente tradicional, provinciana e 'masculina'", escreve a introdução do volume.

Ela se matou aos 36 anos, em 1930. Em um poema, escreveu: "Dona Morte dos dedos de veludo,/ Fecha-me os olhos que já viram tudo!/ Prende-me as asas que voaram tanto!".


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Site da coleção: colecoes.folha.com.br

Telefone: (11) 3224-3090 (Grande São Paulo) e 0800 775 8080 (outras localidades)

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Nas bancas: R$ 25,90 o volume

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