Um banquinho, um violão, um piano de cauda e 2.800 pessoas cantando baixinho, em uma das mais celebradas salas de concerto do mundo, o Carnegie Hall, em Nova York.
Foi uma festa de aniversário muito bossa nova a do show "The Greatest Night Bossa", que celebrou a histórica apresentação de Tom Jobim, João Gilberto, Roberto Menescal, entre outros, que colocou o estilo musical no mundo e aconteceu naquele mesmo auditório há 61 anos.
A base do concerto foi o repertório da homenagem a Tom Jobim de Seu Jorge e Daniel Jobim, neto do músico, em turnê pelo Brasil e exterior desde 2020. À dupla se juntaram Menescal, Carlinhos Brown, Carol Biazin, a cantora britânica Celeste —indicada ao Oscar por melhor canção original em 2021 por "Os 7 de Chicago"— e Alaíde Costa. A direção musical foi do músico Max Viana, filho de Djavan.
Após a introdução do apresentador de TV Serginho Groisman, Seu Jorge e Jobim abriram o show com a peso-pesado "Chega de Saudade", emendando com "Samba de uma Nota Só" e "Samba do Avião".
A plateia praticamente lotada cantando junto mostrou que se a comemoração era pela globalização da bossa nova, a festa era para nós mesmos: a maioria dos presentes era brasileira, e com a exceção pontual de Seu Jorge, todos os cantores se dirigiam à plateia em português alto e claro.
Apenas "Dindi" e "Insensatez" foram cantadas em inglês, assim como um trecho curto de "Garota de Ipanema", cantado por Celeste durante o bis.
Carlinhos Brown imprimiu seu estilo durante seu set, como quando introduziu trechos de gravações da voz de Vinicius de Moraes durante "Aos Pés da Santa Cruz", e tocou a única música original do show, "Ararinha", uma bossa nova de sua composição.
"Me lembrei das minhas performances em barzinho. O repertório predileto de barzinho é esse, você tocava Clube da Esquina, bossa nova e um pouco de Jovem Guarda", disse ele à Folha após a apresentação. "Porque o ‘um banquinho e um violão’ foi mais que uma poesia, foi um grito que todo mundo podia estar ali."
Roberto Menescal, o único presente que participou do show original de 1962, afirma que ficou surpreso com a recepção do público. "Eu nem toquei e já me receberam daquela maneira!", referindo-se aos momentos em que foi ovacionado pela plateia ao entrar no palco para fazer duetos com as cantoras convidadas. "Foi tão bom que já estou animado para o show dos próximos 60 anos."
Mas foi a veterana Alaíde Costa, de 88 anos, a favorita do público e aplaudida de pé várias vezes, não só pela sua interpretação dramática e potente de "Sabe Você" e "Demais", mas pelo significado histórico de sua presença ali no Carnegie Hall.
Junto com Johnny Alf, Alaíde é considerada uma das grandes precursoras da bossa nova, mas que nunca recebeu o mesmo reconhecimento que outros artistas brancos tiveram.
Sua participação foi mesmo pensada como reparação, segundo a produtora Camila Almeida, idealizadora do projeto. "Abraçamos a ideia de fazer uma retratação histórica, pelo apagamento histórico que ela sofreu durante tempo, apesar de toda sua contribuição para a música brasileira", diz.
Carol Biazin representou a nova geração da música pop brasileira, e fez dueto com Menescal, cantando "Samba de Verão" e "O Barquinho". Esta última, inclusive, foi a primeira canção de bossa nova que a jovem cantora aprendeu a tocar no violão, aos oito anos, quando se iniciou no instrumento. "Fiquei fascinada com aqueles acordes e melodias e falei 'é isso, eu quero fazer música com esses acordes também'."
Menescal também elogiou Celeste, com quem fez dueto durante "How Insensitive" —a versão em inglês de "Insensatez". Sua interpretação, imprimindo um tom mais soul à faixa, arrancou aplausos de pé de quase todo o auditório. "Ela cantou tão bonito. Fiquei tão arrepiado por dentro, que coisa maravilhosa que foi isso".
Ao fim do show, Seu Jorge e Jobim voltaram para arrematar com mais uma sequência de jobinianas, como "Águas de Março", "Wave" e "Corcovado". O bis terminou com "Desafinado", de João Gilberto, e como não poderia faltar, "Garota de Ipanema", com Menescal, Brown, Alaíde, Carol e Celeste.
A festa de aniversário foi emocionante e agradou aos presentes, mas para Menescal, o significado da comemoração dos 61 anos é que a música brasileira não pode se prender ao passado. "A bossa nova esteve aqui há 60 anos, mas quantas coisas aconteceram depois? Esses artistas também não podem ficar presos ao que a gente fazia," afirmou. "Foi ótimo o que nos fizemos, o passado foi maravilhoso, mas estou é com saudade do futuro".
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.