Descrição de chapéu Livros Flip Rita Lee

Adriana Calcanhotto abre a Flip com show lento e intelectualizado sobre Pagu

Apresentação pensada para a festa literária trouxe versões especiais de Rita Lee, Elza Soares e Augusto de Campos

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Paraty (RJ)

Adriana Calcanhotto subiu ao palco com 15 minutos de atraso se inclinando em reverência a um público meio impaciente: milhares de pessoas suando em bicas numa tenda rodeada por chuva na noite desta quarta. Era a abertura da Flip.

E a artista começou saudando "a alegria como a prova dos nove", numa de suas músicas que fazem referência direta ao movimento modernista tão impactado pela homenageada do ano, Patrícia Galvão.

Show da cantora Adriana Calcanhotto no primeiro dia da Festa Literária Internacional de Paraty - Zanone Fraissat/Folhapress

"Temos uma diferença", disse ela à plateia. "A Pagu largou a antropofagia e eu não. Em compensação, ela foi se dedicar às ideias comunistas, que eu larguei."

As prometidas saudações a Rita Lee, Gal Costa e Elza Soares —representantes posteriores da insubmissão de Pagu— começaram como referências oblíquas.

Isso mudou apenas no final, quando a artista não só trouxe a canção "Pagu", para delírio do público, como levou o celular ao microfone para mostrar um áudio de Zélia Duncan, parceira de composição de Rita, falando emocionada sobre a música.

Em seguida, Calcanhotto apresentou "Rainha Africana", composta num átimo pela roqueira para Elza há poucos anos, e uma versão de "Balada do Louco" com eu lírico feminino ("se elas são bonitas/ eu sou Sharon Stone/ se elas são famosas/ I'm a rolling stone"), que, segundo Rita, era a maneira como a canção foi originalmente pensada.

Houve antes disso um texto de autoria de Maria Bethânia, "Caras e Bocas", escrito para Gal em primeira pessoa; e uma versão de "Sophisticated Lady", canção de Duke Ellington gravada por Elza sobre tradução de Augusto de Campos, também celebrado na festa.

Foi uma apresentação em ritmo lento, no geral, montada e extensamente roteirizada a pedido da Flip por Calcanhotto com Cid Campos, filho de Augusto, que esteve no palco com ela. Ao fundo, projeções de Omar Salomão e Emilio Rangel misturavam fotos da intérprete a desenhos de Pagu, uma compondo a outra.

Fazia tempo que uma cantora tão famosa não abria a Flip. A última vez deve ter sido a própria Gal, que cantou em julho de 2014 antes da festa que homenageou Millôr Fernandes.

É verdade que esta foi uma apresentação que extrapolou bem a música —a literatura deu o tom na leitura de cartas de Pagu elogiando Clarice Lispector, em poemas da autora musicados por Cid e até numa pormenorizada declamação da lista de autores traduzidos por Augusto de Campos.

Logo antes do show, uma mesa de abertura com ar mais pesado de simpósio acadêmico abriu os trabalhos de homenagem a Pagu.

Era uma conversa entre o brasilianista americano David Jackson e a escritora Adriana Armony, com mediação da professora Eneida Leal Cunha.

Ele acaba de lançar volumes robustos que reúnem a produção jornalística da autora, um lado pouco conhecido em meio a seu prisma de personalidades. Já Armony publicou "Pagu no Metrô", mistura de relato romanceado sobre a temporada dela em Paris e a busca da própria pesquisadora por seus registros na França.

Leal Cunha terminou a mesa afirmando que todos sairiam dali com o "dever de casa" de ir atrás dos livros, e não foi o único termo que deu ao encontro um clima de sala de aula.

A professora levantou a hipótese de que o trabalho de Pagu como jornalista era onde a autora se fazia mais desenvolta, ao comentar a quente o tempo presente. Sua militância política foi um traço tão marcante de sua atuação quanto a literatura.

Alguns espectadores foram embora antes que a mesa se encerrasse, apressados pelo barulho de trovão que anunciava a chuvarada que tomaria o resto da noite.

Esta Flip primaveril continua até domingo em Paraty, com mesas que tomam a cidade da manhã até a noite entre programação principal e diversas casas paralelas.

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