Descrição de chapéu terrorismo

'Governo de Netanyahu luta contra Israel e precisa acabar', diz Amos Gitai

Diretor israelense lança no Brasil filme sobre o assassinato de Yitzhak Rabin, premiê que tentou negociar a paz com Palestina

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São Paulo

Enquanto uma multidão de israelenses queima cartazes e grita "morte a Rabin", referindo-se ao então primeiro-ministro Yitzhak Rabin, um jovem Binyamin Netanyahu inflama o ódio dos manifestantes ao criticar a negociação de paz com os palestinos.

"Estamos lutando pela paz verdadeira e duradoura, não por uma falsa paz...estamos lutando pela expansão dos assentamentos judaicos, pela imigração judaica sionista, não para que volte a lei palestina", discursa Netanyahu, durante protesto em 1995, alguns meses antes de Rabin ser assassinado por um extremista de direita judeu.

Imagem mostra homem branco de meia idade, cabelo grisalho, de perfil
O cineasta israelense Amos Gitai - Divulgação

A cena ominosa é parte do thriller político "O Último Dia de Yitzhak Rabin", dirigido por Amos Gitai, que estreia no Brasil nesta quinta-feira (2). O filme acompanha os últimos momentos do ex-primeiro-ministro de Israel, Itzhak Rabin, vencedor do prêmio Nobel da Paz de 1994 por seus esforços para negociar um acordo de paz com os palestinos.

Para retratar o assassinato de Rabin em 1995 e a tentativa de elucidar o crime, o longa mistura imagens originais, inclusive do momento do atentado, com entrevistas de Rabin, e reconstituições, usando atores, da comissão de investigação e da radicalização do assassino, Yigal Amir, por rabinos de extrema direita.

Quase 28 anos depois, Israel e os palestinos estão mais distantes da paz do que nunca. Um ataque terrorista do Hamas em Israel deixou 1.400 mortos em 7 de outubro. A retaliação de Israel já matou 8.300 palestinos em Gaza, a grande maioria civis. Não há cessar-fogo no horizonte e o conflito periga transbordar para o resto do Oriente Médio.

"Se Rabin não tivesse sido assassinado, tenho certeza de que estaríamos em uma situação diferente. Não sei se ele teria conseguido chegar à paz, porque também dependia dos palestinos, mas certamente estaríamos em um lugar melhor hoje", diz Amos Gitai, em entrevista por videoconferência.

"Quis fazer um filme sobre o assassinato de Rabin porque, ao fazê-lo, conservamos a memória do momento em que um estadista tentou enfrentar a questão mais explosiva, a relação Israel-Palestina. Rabin percebeu que isso deveria ser prioridade, e ele estava certo. Talvez Rabin não teria conseguido, mas entendeu que esta é a questão essencial. Se Israel quiser permanecer seguro nesta região perigosa, teremos de criar a perspectiva de um novo 'modus vivendi'."

O longa retrata como o clima de ódio no país e a radicalização de nacionalistas de extrema direita foram o gatilho para o crime, e levanta questionamentos sobre a investigação do caso.

Indagado sobre a atuação do atual premiê Binyamin Netanyahu, Gitai não economiza críticas.

"Este governo precisa acabar, eles têm que ir embora. É um governo que luta contra o seu próprio país e o enfraquece", diz Gitai. "Netanyahu causou muito mal a Israel ao incitar judeus contra árabes, judeus seculares moderados contra judeus religiosos, ao fragmentar para continuar a governar, essa foi a tática. Seu único propósito ao criar fricções na sociedade é manter o senhor Netanyahu no poder."

O cineasta lembra que, recentemente, milhares de israelenses foram às ruas protestar contra a reforma proposta por Netanyahu para enfraquecer o poder judiciário do país.

"O Hamas tenta usar estas fricções e estas fraquezas de uma forma cínica, eles pensaram que este era o momento certo para atacar, porque o país poderia entrar em colapso."

Cinquenta anos atrás, Gitai lutou na Guerra do Yom Kipur, ficou ferido, e viu um amigo morrer ao seu lado. Ele acha que o conflito atual é pior.

"A situação hoje é pior do que em 1973, quando eclodiu a guerra do Yom Kippur, porque, hoje, temos um governo de pessoas messiânicas corruptas e ultranacionalistas, que estão perdendo a consciência de que Israel está numa zona de perigo", diz. "Vocês tiveram [Jair] Bolsonaro, os EUA tiveram [Donald] Trump. Mas quem são seus vizinhos? O oceano Atlântico, a Argentina, um país amigo. Nós estamos no Oriente Médio, com vizinhos hostis."

O cineasta israelense, diretor de longas como ‘Kedma" e "Kadosh", aborda o conflito entre Israel e Palestina em seus filmes há décadas, e repudia o Hamas, o grupo extremista islâmico que domina a faixa de Gaza.

"Não há justificativa [para o que o Hamas fez]. É uma selvageria contra os cidadãos israelenses. Mas o Hamas também é contra os palestinos. Não desejo que meus amigos palestinos fiquem sob o regime do Hamas, desejo que eles que vivam em um regime secular moderno que respeite a liberdade de expressão e as liberdades das mulheres, da comunidade LGBT, e não sob uma facção fundamentalista fanática como o Hamas."

O filme foi lançado inicialmente em 2015, durante o Festival de Veneza, onde levou o prêmio da Human Rights Film Network. É a primeira vez que "O Último Dia de Yitzhak Rabin" entra em circuito no país. A data de estreia foi escolhida para coincidir com o aniversário da morte do premiê, em 4 de novembro de 1995 —plano anterior à eclosão do conflito atual em Israel.

O Último Dia de Yitzhak Rabin

  • Quando Estreia nesta quinta (2) nos cinemas
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Ischac Hiskiya, Pini Mitelman, Tomer Sisley
  • Produção Israel, França, 2015
  • Direção Amos Gitai
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