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'How to Have Sex' leva olhar feminino aos filmes de bebedeira

Ganhador de mostra paralela em Cannes abre mão da comédia adolescente para contar uma história sobre amadurecimento

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How to Have Sex

  • Onde Estreia nos cinemas nesta quarta (15)
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Mia McKenna-Bruce, Shaun Thomas, Lara Peake
  • Produção Reino Unido, Grécia, 2023
  • Direção Molly Manning Walker

Filmes de festa não são novidade no cinema. "A Vingança dos Nerds", de 1984, e "American Pie", de 1999, são exemplos desse gênero que põe o homem solteiro —ou alguns deles— como protagonistas ousados, espontâneos e intrépidos. Nesses filmes, transar está diretamente ligado a amadurecer e vale tudo para passar essa mensagem, inclusive fazer piadas machistas e objetificar as mulheres.

O problema —ou solução— é que esses filmes envelheceram como leite e já não ressoam mais com o público. Diante disso, o gênero vem sendo aperfeiçoado por diversos cineastas.

Mia McKenna-Bruce em cena do filme 'How to Have Sex', de Molly Manning Walker
A atriz Mia McKenna-Bruce em cena do filme 'How to Have Sex', de Molly Manning Walker - Divulgação

Em "Projeto X", de 2012, o filme de festa é feito em estilo documentário com um humor que foge da misoginia usual. Já em "Spring Breakers", daquele mesmo ano, o gênero se desdobra em um filme de ação recheado de ironia e com um elenco cheio de nomes conhecidos, incluindo as cantoras Selena Gomez e Vanessa Hudgens.

"How to Have Sex" entra para essa lista ao trazer uma perspectiva feminina de amadurecimento em meio a dias seguidos de muita festa. Por isso, o filme venceu o prêmio principal da Um Certo Olhar, a principal mostra paralela do Festival de Cannes.

Trazendo uma experiência semiautobiográfica, o longa de estreia da diretora Molly Manning Walker rompe com a maioria das "regras" do gênero. É quase um guia de como não fazer um filme de festa clássico. Mas o começo do longa engana.

O primeiro ato nos introduz a um trio de amigas britânicas de férias na Grécia. Elas estão no último ano do colégio e a viagem foi planejada para ser a melhor da vida das três. É nessa parte do filme que temos as cenas de balada, festas na piscina, bebedeira e pegação, tudo isso iluminado por luzes neon e muito bem coordenado pelo diretor de fotografia Nicolas Canniccioni.

É em meio a essa excitação toda que o filme revela que uma das meninas do trio é virgem. Tara, interpretada por Mia McKenna-Bruce, quer se livrar da alcunha de mulher inexperiente o quanto antes e desvia do assunto do sexo toda vez que ele surge, seja em uma conversa mais íntima ou um em jogo de verdade ou desafio.

O problema é a pressão que o ambiente exerce sobre Tara. Não se envolver com ninguém só deixaria mais claro que ela não sabe o que está fazendo. De uma vez por todas, então, ela resolve aprender, mas não do jeito certo.

A partir daí, a fotografia abre mão das luzes neon para dar lugar a zooms dramáticos. A atmosfera do filme muda, e a vida real aparece.

Tara não foge da polícia depois de afundar um carro na piscina, como acontece em "Projeto X", ou vira uma criminosa empoderada, como acontece em "Spring Breakers". Ela fica confusa e envergonhada com o que aconteceu na noite de uma viagem que deveria ser memorável por outro motivos.

Mesmo o sexo, tema ubíquo e constantemente tratado de maneira apelativa no gênero, é tratado de forma sutil e delicada, rompendo nossa expectativa ao lembrar o título do filme.

Quando um dos interesses amorosos de Tara, por exemplo, é levado para cima de um palco, despido e agarrado por diversas outras meninas, as entrelinhas da cena sugerem que o sexo e consentimento não funcionam da mesma maneira para homens e mulheres.

Quando um exemplar do gênero masculino é o protagonista do tesão mostrado, a diretora evoca o arquétipo do personagem Stifler, de "American Pie" —o sexo que representa o amadurecimento não precisa ser escondido ou inseguro. Ele pode ser, inclusive, engraçado —uma situação da qual se ri em conjunto, sem espaço para humilhação.

Entretanto, se o tesão está atrelado a uma personagem feminina, a diretora faz questão de pontuar que a mulher será motivo de vexame.

Numa das cenas do filme, uma amiga de Tara traz o assunto da virgindade da personagem de forma indireta na frente de pessoas que acabaram de conhecer. Quando questionada por Tara sobre o motivo pelo qual a amiga agiu desse modo, ela responde "é que é muito engraçado você ser virgem".

Abrindo mão da comédia, traço tão comumente atrelado a filmes de festa, "How to Have Sex" traz um retrato do que é sofrer em silêncio enquanto a vida adulta chega a galope, atropelando tudo. O filme mostra que, por mais lotada que uma festa esteja, a solidão do trauma ocupa mais espaço do que uma multidão.

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