FLAVIA LIMA
DE SÃO PAULO

A consultoria americana Eurasia desenha um quadro político-econômico bastante sombrio para 2018.

"Se tivesse que escolher um ano em que possa ocorrer uma grande crise inesperada —o equivalente geopolítico da crise financeira de 2008— este ano seria 2018", disse o presidente da Eurasia, Ian Bremmer, em conversa com jornalistas.

Em uma análise sobre os principais riscos que podem afetar a economia mundial neste ano, a consultoria cita o aumento do protecionismo comercial. Graças à pressão populista, afirma Bremmer, os governos apelam ao protecionismo como se estivessem fazendo algo em favor dos muitos empregos perdidos. "Como resultado, os muros estão subindo", diz.

O que a consultoria chama de "protecionismo 2.0" criaria barreiras não apenas na indústria e no agronegócio, mas na economia digital e nas indústrias intensivas em inovação. Em vez de tarifas de importação ou imposição de cotas, as ferramentas atuais "para dentro das fronteiras" incluem subsídios e requisitos de conteúdo local.

As novas barreiras são menos visíveis e não driblam necessariamente os compromissos com a OMC (Organização Mundial do Comércio ), mas se escoram na incapacidade global de fortalecer regras de comércio já existentes, aponta.

Uma das fontes a alimentar esse quadro é o crescente avanço chinês sobre ativos estratégicos estrangeiros. Esse avanço, diz a Eurasia, alimenta a preocupação de que a transferência de propriedade intelectual está ocorrendo num ritmo que exige uma resposta política, mas nenhum líder –nem os EUA– se mostrou capaz de garantir as novas regras desse jogo.

CONTROLE SOBRE INVESTIMENTO EXTERNO

Nesse ambiente, diz a consultoria, a origem dos investimentos externos é cada vez mais monitorada por cada país, na tentativa de evitar o controle estrangeiro sobre campeões domésticos e sobre tecnologias consideradas sensíveis.

"A suspeita é maior entre a Europa e Estados Unidos e entre China e Rússia".

Segundo a Eurasia, os governos não estão apenas tentando proteger vantagens comparativas em setores tradicionais, como agricultura, produtos químicos e máquinas, em razão da preocupação com empregos perdidos ou interesses econômicos domésticos. Eles também estão intervindo nas indústrias intensivas em inovação para preservar propriedade intelectual e tecnologias críticas à competitividade nacional.

A expectativa da consultoria é que o chamado "protecionismo 2.0" acabará infligindo maiores danos geopolíticos do que esperam aqueles que o praticam, a despeito de os principais mercados ao redor do globo registrarem alta e o desempenho econômico se manter em níveis relativamente bons.

Esse novo protecionismo vai coexistir com um impulso contínuo para negociar acordos regionais de livre comércio, o que tornará o ambiente regulatório global mais complexo e contraditório, afirma.

Como resultado, empresas e investidores vão ter que administrar cadeias de oferta mais complexas, o custo de fazer negócios aumentará e as cadeias de fornecimento serão menos confiáveis. As perdas, diz a consultoria, serão absorvidas pelos consumidores.

DECLÍNIO AMERICANO

A Eurasia diz ainda que o declínio da influência dos EUA no mundo vai acelerar em 2018, diante da crise de credibilidade da mistura de 'soft power' econômico e liberalismo político.

Para a consultoria, o mundo está agora mais perto da depressão geopolítica do que de uma reversão da estabilidade passada.

E avalia que a política americana delineada pelo "América primeiro", slogan do presidente Donald Trump, corroeram a ordem liderada pelos EUA e suas barreiras de segurança, enquanto nenhum outro país ou conjunto de países está pronto ou interessado em reconstruí-la, aumentando significativamente o risco global.

"Agora vemos mais claramente um mundo sem liderança", dizem. Para a consultoria, as democracias liberais têm menos legitimidade do que em qualquer momento desde a Segunda Guerra Mundial, os cidadãos estão divididos e os governos pouco governam.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.