Crédito imobiliário avança e sobram recursos, mas juro não cai na mesma velocidade

Financiamento imobiliário com recursos da poupança atingiu R$ 25,2 bi no primeiro semestre

Anaïs Fernandes
São Paulo

O financiamento imobiliário com recursos da poupança atingiu R$ 25,29 bilhões no primeiro semestre do ano, alta de 23% ante igual período de 2017, informou a Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) nesta quarta-feira (25). 

É a primeira vez em quatro anos que os empréstimos pelo SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) registram crescimento de janeiro a junho em relação ao primeiro semestre do ano anterior. Foram 98,84 mil imóveis financiados no período em 2018, avanço de 19,8% ante 2017.

Segundo a Abecip, o segmento cresce embalado pelo desempenho positivo da poupança. 

"Tradicionalmente, o primeiro semestre é de saldo negativo. Neste ano, tivemos captação líquida de R$ 2,5 bilhões, o que sinaliza uma reversão de tendência, com mais dinheiro entrando, e gera uma expectativa positiva", diz Gilberto Duarte de Abreu Filho, presidente da Abecip.

 

Só para a aquisição de imóvel pela pessoa física foram R$ 20,2 bilhões financiados, sendo R$ 11,3 bilhões para unidades novas. “Quem puxa a cadeia é o consumidor. Essa fatia de imóveis novos sinaliza consumo de estoque, o que pode originar demanda futura por mais construção”, afirma Abreu Filho.

A aquisição para construção, no entanto, cresceu menos, 14,5%, somando apenas R$ 5,1 bilhões. “Os empresários ainda estão comedidos, começando a acelerar o negócio em ritmo diferente do consumidor."

Para 2018, no entanto, a entidade elevou suas projeções de crescimento do crédito com recursos da poupança de 10% para 16%, chegando a R$ 50 bilhões. Se a expectativa se confirmar, será a primeira recuperação também em quatro anos, desde o pico de R$ 113 bilhões atingido em 2014, mas em patamares ainda similares a 2010.

O argumento para rever a previsão é que agentes financeiros demonstraram maior otimismo. “Hoje, vemos os bancos com apetite para emprestar. O que está difícil é encontrar projetos de incorporadoras para esse dinheiro e consumidor com vontade consistente de comprar”, diz Abreu Filho.

As instituições financeiras estão dispostas a financiar porque há mais recursos disponíveis para o crédito imobiliário. Além do avanço no saldo da poupança, os bancos vêm se beneficiando, por exemplo, da recente liberação de compulsórios, explica Abreu Filho. No fim de 2017, o Banco Central anunciou redução na parcela que as instituições são obrigadas a deixar parada na autoridade monetária, o que liberaria um total de R$ 6,5 bilhões para elas ampliarem empréstimos.

O excesso de recursos para financiamento da casa própria disponível no mercado pode superar R$ 100 bilhões nos próximos dois anos, aponta o presidente da Abecip.

“Vai ter muito recurso disponível para emprestar, mas não vemos o mesmo ritmo de consumo na ponta, seja do consumidor, que vai demorar para obter ganho real e algum alívio no desemprego, ou da construtora”, diz Abreu Filho.

O cenário de oferta elevada com demanda ainda em baixa poderia significar que as taxas de juros cobradas pelos bancos cairiam. De fato, Abreu Filho afirma que os juros estão hoje em patamares próximos aos do ápice do mercado imobiliário, em 2014. Os preços não caem mais, no entanto, porque a piora nas perspectivas econômicas para o Brasil elevaram  as taxas de juros futuros.

Como os empréstimos imobiliários ficam, em média, dez anos nas carteiras dos bancos, são para essas taxas de longo prazo que as instituições costumam olhar na hora de compor os juros do financiamento. 

“Não vejo os preços caindo até agora, porque as curvas de juros futuros não cedem. Se isso acontecesse, poderíamos para o próximo ano ver algo inédito, como taxas abaixo de 8,5%”, diz Abreu Filho.

As taxas de juros futuros vinham caindo até março, mas começaram a subir em abril, em meio a incertezas sobre os rumos políticos e econômicos do país, e foram ainda mais pressionadas em maio, com a paralisação dos caminhoneiros.

“Esse movimento depende muito do cenário eleitoral e da perspectiva da economia. Parece que os bancos viram a curva subir, mas estão apostando em uma queda. Se o patamar se mantiver alto, no entanto, em algum momento veremos uma reversão, com aumento de taxas e queda na concessão.” 

O preço dos imóveis no país, também monitorado pela Abecip, acumula queda real (considerando a inflação do período) de 25% desde 2014. Apesar da queda refletir o desaquecimento do setor durante a crise e prejudicar o investidor, Abreu Filho aponta que há vantagens. "O lado bom é que aquele consumidor que há quatro anos via a compra do imóvel como cada vez mais cara agora observa que essas unidades estão mais acessíveis", afirma.

FGTS

Na contramão do SBPE, o crédito imobiliário com recursos do FGTS, fonte para financiamento dentro do programa Minha Casa Minha Vida, recuou 6,8%, na primeira queda semestral desde 2014. Foram R$ 31,5 bilhões em empréstimos. 

“O FGTS é diferente do SBPE, em que há competição entre os bancos. O FGTS segue a lógica de cumprir o orçamento definido pelo Conselho Curador”, afirma Abreu Filho. Esse orçamento previsto para o ano é de R$ 69 bilhões, o que significaria uma alta de 19% em 2018, aponta a Abecip.

Somando SBPE e FGTS, o crédito imobiliário avançou 4,5% no primeiro semestre, totalizando R$ 56,8 bilhões.

Segundo a Abecip, a inadimplência do segmento fechou o primeiro semestre em 1,8%, acima do 1,7% de 2017. "Não é algo que assuste, mas está no radar dos bancos. O patamar pré-crise era de 1,4%", diz Abreu Filho.

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