Embraer não resistiria sozinha, diz especialista

Brasileira seria sufocada pela concorrência com a Airbus e chinesa

Anaïs Fernandes Joana Cunha
São Paulo

Apesar da reação negativa do mercado, que derrubou as ações da Embraer nesta quinta (5) diante da notícia do acordo com a Boeing, especialistas no setor aéreo avaliam que, sem a gigante americana, a brasileira seria sufocada pela concorrência.

Depois que a Airbus anunciou, em outubro, que comprou a linha de jatos regionais da Bombardier, entrando definitivamente para concorrer no segmento de aviões de médio porte —carro-chefe da Embraer—, ficou claro que não haveria espaço para tantos gigantes.

"A Boeing iria entrar nesse mercado de qualquer jeito, ou desenvolvendo o próprio avião ou comprando outra empresa que fabricasse", diz André Castellini, sócio da Bain & Company.

Na opinião de Guilherme Amaral, sócio do escritório ASBZ e especialista em direito aeronáutico, a operação previne uma entrada da Boeing nesse nicho por outros meios.

"Se ela entrasse por outros meios, isso poderia acirrar a competição e dificultar ainda mais a evolução da Embraer", afirma Amaral.

Soma-se a isso, o avanço do segmento de aviões de cem lugares na China, onde recentes mudanças regulatórias animaram fabricantes de aviões médios.

"Antes de começar a vazar informações dessa possível compra da Embraer, o valor das ações, que refletem as perspectivas para o futuro da empresa, estava sofrendo. A sobrevivência da Embraer a longo prazo era questionada. Dito isso, foi uma solução boa", afirma Castellini.

O especialista cita uma série de vantagens na transação. A Embraer poderia contar com a estrutura de capital da Boeing para enfrentar uma eventual recessão no segmento, com falta de encomendas.

A brasileira também se beneficia de escala, portfólio de clientes, capacitação na força de vendas e pesquisa. Do ponto de vista dos funcionários, Castellini também vê maior proteção ao emprego sob a Boeing.

"A longo prazo, os empregos dependerão da atratividade do Brasil como destino de produção industrial. Se o país não for capaz de gerar empregos, mesmo que a Embraer continuasse independente, ela iria quebrar", diz o especialista.

Na área tecnológica, a Embraer ganha porque vinha tendo dificuldade de se manter atualizada devido ao enxugamento do apoio governamental para investimentos na área, segundo Glauco Arbix, professor titular da USP e co-coordenador do Observatório da Inovação do IEA (Instituto de Estudos Avançados).

"A Boeing tem uma simbiose com o governo americano na área militar e com universidades na área civil. O acordo com a americana poderia trazer respiro à Embraer, que talvez tenha encontrado uma forma de sobreviver."

Arbix receia o enfraquecimento da Embraer como motor da cadeia de fornecedores do setor aeronáutico brasileiro.

"É difícil imaginar que a Boeing terá controle de 80% e vá utilizar fornecedores brasileiros. Acho que a construção de um setor robusto aeronáutico no Brasil ficou postergada ou terá mais dificuldade. A Boeing vai pegar o filé mignon da Embraer, sua engenharia, que é forte e invejada no mundo todo", afirma.

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