Gigantes da tecnologia também enfrentam desafios da transformação digital, diz especialista

Esta é a 10ª entrevista de Flavio Ferrari em uma série de encontros para o livro 'Atitude Digital'

Flavio Ferrari

Associamos o termo “digital” às tecnologias e negócios mais recentes como internet, ecommerce, inteligência artificial, realidade virtual, economia criativa, big data, rede sociais, Google, Facebook, Instagram, Twitter, Netflix, .

 

Mas o mundo digital nasceu antes de tudo isso, com a adoção dos “bits” (binary digit, ou dígito binário), no final da década de 1940. O conceito de “bit” foi popularizado pelo matemático e engenheiro Claude Shanon em seu artigo “A Mathematical Theory of Communication”, em 1948, como uma solução para codificação e transmissão de informações.  

Shanon é frequentemente lembrado como o pai da Teoria da Informação e o “bit” é o fundamento que permitiu o desenvolvimento dos computadores digitais.  

A ideia de representar valores por um conjunto de “zeros e uns” (sistema binário), entretanto, foi proposta por George Boole em 1847, e é a lógica Booleana, retomada por Shanon, que alimenta as máquinas modernas. IBM, SAP e Oracle são exemplos de gigantes precursoras do mundo digital que aplicam a tecnologia para a gestão da informação.

É interessante observar que, mesmo sendo pioneiras digitais, essas empresas recentes também enfrentam o desafio da transformação digital de seus modelos de negócio, que foram desenhados na década de 1970.

Adriana Gibrail é consultora na agência ITM Channel Marketing e sua principal atividade é apoiar os parceiros de negócios e distribuidores oficiais de grandes fabricantes do segmento de TI em seu processo de transformação digital.  

Ela tem mais de 20 anos de experiência nesse setor, com passagem pela IBM onde participou ativamente da organização da startup Lenovo.

Gibrail estima que, embora essas grandes empresas realizem a maioria de seus negócios através de representantes, 70% do processo de decisão de compra já acontece através da internet, onde o potencial cliente pesquisa as soluções e espera interagir com os fornecedores e seus parceiros para esclarecer dúvidas iniciais.

De acordo com a consultora, a área de TI que antes decidia a compra, hoje avalia as soluções e aconselha a área de negócios, que toma a decisão final.  "Não é mais uma venda baseada em relacionamentos", afirma.

Nesse cenário, os representantes dessas grandes empresas precisam ter uma atitude digital. A presença digital estruturada, com processos de atendimento ágeis (marketing responsivo), é fundamental.  

O cliente é impaciente, e a rapidez de resposta pode garantir a oportunidade de venda (“lead”). O vendedor precisa estar preparado para aproveitar a oportunidade, considerando que o processo de decisão já estará avançado no momento de sua visita ao potencial cliente.

“O comprador pesquisa muito, e tende a saber mais do que o vendedor sobre as soluções disponíveis no mercado. Não basta que o vendedor conheça seu produto. Ele precisa conhecer as alternativas existentes e ser capaz de diferenciar positivamente a solução que oferece, o que só é possível conhecendo, também, as especificidades do negócio de seu potencial cliente.  O fechamento da venda depende da objetividade dessa abordagem presencial", diz Gibrail.

Adriana Gibrail é consultora na agência ITM Channel Marketing
Adriana Gibrail é consultora na agência ITM Channel Marketing - Divulgação

Embora o marketing digital não seja responsável por um aumento exponencial de vendas para soluções complexas, que ainda dependem da presença física do representante para customização, ele é fundamental, e precisa ser integrado com a atuação da equipe de vendas.

Gibrail aponta dois grandes desafios para a transformação digital dos gigantes. “O primeiro desafio é que essas empresas têm parceiros tradicionais, resistentes a mudar sua estratégia de abordagem comercial que funcionou bem por muitos anos. O segundo desafio, comum a toda grande corporação e principalmente àquelas que operam através de representantes, é que os processos corporativos evoluem para modelos ´cartoriais´,  visando garantir a documentação, o controle e a conformidade (“compliance”), tornando mesmo as vendas de pequeno valor um processo extenuante.”

Essa burocracia costuma afastar novos parceiros, nativos digitais, acostumados a trabalhar com menor nível de formalização e maior foco na entrega.

“A distância entre a grande corporação e seus clientes finais impede que a organização capture essas particularidades que motivariam sua transformação.  Enquanto isso não ocorre, cabe ao representante responder ao sentido de urgência do cliente, antecipando os problemas, respondendo com rapidez e facilitando os processos, demonstrando comprometimento com as necessidades da área de negócios. Essa é atitude digital que deve resultar da transformação.“

Gibrail considera que o investimento na simplificação de controles e processos, por parte das grandes corporações, e no marketing digital e treinamento das equipes de vendas, por parte de seus representantes, é prioritário. 

“As áreas de negócio estão em busca de soluções simples e de rápida implementação, que resolvam seus problemas imediatos e permitam que aproveitem as oportunidades com agilidade. Se as gigantes, e seus representantes não atualizarem seus processos, o cliente poderá concluir que a melhor solução é aquela apresentada por uma empresa menor e mais ágil, ainda que não seja tão completa", afirma a profissional.

Flavio Ferrari é consultor e palestrante em comunicação, inovação e transformação digital. Foi diretor dos institutos Kantar Media, Ipsos e GfK. Esta entrevista faz parte de uma série de encontros para o livro "Atitude Digital", com o apoio da ABA (Associação Brasileira dos Anunciantes)

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