Dólar acumula alta de 8,5% em agosto e tem pior mês em três anos

No dia moeda recua 1,73% e fecha a R$ 4,073

Anaïs Fernandes Danielle Brant
São Paulo e Nova York

Uma expressão popular é recorrente entre profissionais do mercado financeiro para definir agosto: foi o mês do cachorro louco. E, por enquanto, não há expectativas de que setembro seja muito diferente.

O dólar comercial fechou nesta sexta-feira (31) acumulando o maior salto mensal em três anos, em um mês marcado por incertezas políticas no Brasil e adversidades generalizadas para países emergentes.

Apesar da trégua neste pregão ao recuar 1,73%, para R$ 4,073, a moeda subiu 8,5% em agosto, a maior alta desde os 9,2% registrados em setembro de 2015.

"O dólar sair de R$ 3,70 e chegar a R$ 4,20 em um mês, um movimento de 50 centavos, é muito forte", diz Carlos Pedroso, economista sênior do Banco MUFG Brasil.

Levantamento de Einar Rivero, da empresa de informações financeiras Economatica, mostra ainda que o dólar médio de mercado calculado pelo Banco Central do Brasil --o chamado dólar Ptax-- registrou a maior valorização sobre a moeda brasileira para um agosto desde o Plano Real (1994).

O avanço em 2018 foi de 10,13%, contra o último recorde de 7,45% em 2015.

No ano, o dólar comercial acumula alta de 23%.

Nessa base de comparação, entre as 31 principais divisas do mundo, o real apresenta a terceira maior desvalorização ante o dólar, perdendo apenas para Argentina (-50,5%) e Turquia (-42,5%), emergentes com fundamentos econômicos como déficit em conta-corrente e reservas internacionais mais frágeis do que os do Brasil.

No início do mês, uma tensão política e comercial entre Washington e Ancara envolvendo a detenção de um pastor americano na Turquia derrubou a lira e arrastou consigo os mercados emergentes.

Quando o cenário internacional começava a dar algum alívio, pesquisas de intenção de voto mostraram Geraldo Alckmin (PSDB), candidato preferido do mercado, ainda sem tração, e investidores passaram a precificar a chance de um nome do PT chegar ao segundo turno.

O estresse empurrou o dólar a R$ 4 pela primeira vez em mais de dois anos.

Analistas apontam que o alívio temporário desta sexta é reflexo de um movimento de correção, após mais instabilidades em um emergente, desta vez a Argentina, levarem o dólar a R$ 4,21 na véspera e forçarem a atuação do BC.

O CDS (credit default swap), termômetro do risco-país, chegou a atingir 301,2 pontos na quinta-feira (30), patamar que não alcançava desde dezembro de 2016. Agora, está em 302 pontos.

"O movimento do câmbio ontem foi exagerado, então há um rescaldo", afirma Pedroso.

"A intervenção do Banco Central sinaliza ainda para o mercado que a autoridade vai atuar se for necessário", diz o economista sênior do MUFG Brasil.

Além disso, a queda do dólar ganhou força na parte da tarde após a formação da Ptax (taxa calculada pelo BC e que serve de referência para diversos contratos).

Quem ganha com a alta da moeda vinha operando para segurar a taxa em um nível elevado, mas aliviou a pressão depois de seu fechamento.

Investidores reagiram também à notícia de que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) analisaria nesta sessão o pedido do registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Até a conclusão desta edição, dos sete ministros, cinco haviam votado pela inelegibilidade do petista. À noite, a expectativa de que ele fosse enquadrado na Lei da Ficha Limpa se confirmou.

O Ibovespa, índice das ações mais negociadas da Bolsa brasileira, subiu 0,36% nesta sexta, a 76.677,53 pontos. Em agosto, acumula baixa de 3,2%, mas no ano sustenta leve alta de 0,36%.

"O cenário externo conturbado acabou refletindo em um investidor global mais avesso a risco e optando por opções mais conservadoras", afirma Filipe Villegas, analista de ações da Genial Investimentos.

"E, com o contexto das eleições, o Brasil acaba sofrendo um pouco mais", diz.

Para o banco suíço UBS, até as eleições terminarem, não deve haver alívio sobre o preço dos ativos.

"Nós presumimos que o atual nível de prêmio de risco relacionado às eleições vai durar até o fim de outubro --embora admitamos que níveis de volatilidade e incerteza podem aumentar até lá", diz a instituição em relatório.

Segundo o UBS, o fim das eleições trará menos incerteza, mas não de uma vez, porque os mercados ainda terão dúvidas sobre a habilidade do governo recém-eleito de aprovar reformas para estabilizar as contas do país.

No relatório, o UBS elevou de R$ 3,50 para R$ 3,70 a projeção para o dólar no fim do ano.

Para o fim de 2019, a expectativa é de um dólar de R$ 3,60, ante R$ 3,45 em junho.

Campanha na TV

Em setembro, investidores estarão de olho nas primeiras pesquisas de intenção de voto após o início da campanha eleitoral na TV, que começou nesta sexta.

Com 44% do tempo em disputa, Alckmin terá de mostrar se conseguiu usar a vantagem para angariar eleitores.

"Historicamente, o mês de setembro costuma ser de baixa para a Bolsa e mais ainda em anos com eleição. Estamos recomendando cautela aos investidores. Mas é preciso considerar que muito de um cenário pessimista já foi precificado", diz Villegas.

Pedroso projeta tensões externas ainda presentes, mas diz que, se não houver nenhuma grande novidade, elas tendem a se acomodar.

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