A reforma da Previdência deverá ser o primeiro teste de realidade pelo qual passará Paulo Guedes à frente da área econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).
O futuro ministro considera a reforma "a mais importante e rápida" medida a ser adotada pelo governo, com o objetivo de atacar o aumento dos gastos públicos.
Ao chegar à reunião com a equipe do presidente eleito, nesta terça-feira (30), Guedes defendeu a aprovação da reforma de Michel Temer, além de uma segunda rodada de mudanças, com vistas a adotar o regime de capitalização.
Guedes tem apoio de Bolsonaro. Em entrevistas a TVs na segunda-feira (29), o presidente eleito afirmou que conversaria com o atual presidente, Michel Temer (MDB), para tentar aprovar "ao menos parte" da reforma previdenciária ainda em 2018.
Guedes, porém, atribuiu a reação negativa do mercado após a eleição a críticas de Onyx Lorenzoni sobre a viabilidade de aprovar a reforma ainda neste ano.
"Houve gente falando que não tem pressa de fazer a reforma da Previdência. O mercado reagiu mal", disse.
"É um político falando de economia, é a mesma coisa de eu sair falando de política, não vai dar certo", afirmou Guedes.
Mais tarde, porém, admitiu a dificuldade política.
"Do ponto de vista econômico, nós estamos atrasados. Essa reforma podia ter sido feita lá atrás, evidentemente tem o cálculo político. O nosso Onyx corretamente não quer que uma vitória nas urnas se transforme numa confusão no Congresso. Se o Congresso não tiver condições de aprovar, nos submetemos", disse Guedes.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já alertou a equipe do presidente eleito para o fato de que uma derrota na votação da reforma seria ruim para Bolsonaro e pediu paciência.
"Precipitado é votar qualquer coisa sem voto. Com voto, nada é precipitado. Votar qualquer matéria, Previdência ou não, para o futuro governo sofrer uma derrota, eu acho que é ruim. Então vamos ter que ter paciência", disse.
SEM CLIMA
Líderes partidários consideram que é improvável que a reforma da Previdência avance no Congresso ainda nesta legislatura, como deseja a equipe do presidente eleito.
Para o líder do governo no Congresso, André Moura (PSC-SE), a aprovação será difícil e não houve orientação do Palácio do Planalto para que seja tocada a pauta. "Ninguém tocou no assunto", disse o deputado nesta terça.
À frente de uma bancada de 40 parlamentares, José Rocha (PR-BA) diz que não há clima na Casa para votar a matéria nesta legislatura.
De acordo com ele, o texto atual não acabaria com o déficit previdenciário e não há previsão para que seja votado.
O líder do PPS, Alex Manente (SP), também afirma que é muito difícil. "Acho que não é nem o caminho adequado, é o caso de esperar o novo governo e o novo Congresso e debater com a sociedade", afirmou.
Segundo um assessor ouvido pela Folha, outros projetos da pauta econômica, como cadastro positivo e autonomia do Banco Central, têm mais chances de caminhar na Casa.
Aliado do presidente eleito, o presidente da bancada da bala, Alberto Fraga (DEM-DF), diz que a aprovação é inviável.
"Nós esperamos e até preferimos que a matéria seja votada pelo novo Congresso", afirmou o deputado, que não terá mandato em 2019.
Fraga concorreu ao governo do Distrito Federal, mas não se elegeu.
Segundo ele, a votação de uma reforma agora por parte dos congressistas que não se reelegeram poderia ser interpretada como vingança.
"Pode receber uma pecha de ter sido retaliação. Por isso acho melhor a gente pensar num novo texto mais adequado para o próximo ano", afirmou.
Membro do núcleo de aliados de Bolsonaro, o deputado federal e senador eleito Major Olímpio (PSL) afirmou que não há condição de votar a reforma neste ano.
Para ele, muitos deputados não foram reeleitos e, por isso, faltam "ânimo e legitimidade" para aprovar a proposta agora.
"Não vejo condição. E, se fosse colocado em votação o projeto como está, não passaria. Eu votaria contra", disse.
No Senado, líderes partidários não veem com confiança a possibilidade de votação de mudanças nas regras da aposentadoria neste ano.
A reforma exigirá longos debates e negociações em um momento em que Bolsonaro nem sequer estruturou uma base aliada.
O grande número de parlamentares que não se reelegeram também pode ser um entrave para as articulações, avalia o senador Ciro Nogueira (PP-PI). "Com metade do Congresso saindo, não vejo como [ser votada]", disse.
Ele afirma que o partido dará apoio à reforma e defende o ajuste das regras da aposentadoria para civis e militares, ponto que encontra resistência entre membros do partido de Bolsonaro.
Na avaliação da líder do MDB, senadora Simone Tebet (MS), falta clareza sobre qual proposta de reforma o novo governo vai defender. Para ela, depois de uma proposta concreta, os parlamentares terão condições de avaliar.
"As informações do presidente eleito estão um pouco truncadas. A gente precisa primeiro que eles entrem em sintonia, entendam o que querem, para depois propor para o Congresso", afirmou.
O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que preside a Comissão de Assuntos Econômicos, considera que seria positivo o Congresso dar andamento à proposta de reforma. "Se a gente puder avançar em alguma coisa, é bom, porque a situação fiscal é muito grave."
Assessores do atual comando do Planalto dizem haver boa vontade de Temer em colocar a reforma em votação, mas querem um sinal mais claro da equipe de Bolsonaro.
Integrantes do primeiro escalão do governo dizem que o presidente eleito e seus auxiliares têm emitido sinais trocados e aguardam uma conversa formal para saber que reforma Bolsonaro quer conduzir e quem vai liderar a articulação na Câmara.
Um encontro entre o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, e o já anunciado titular da pasta a partir de 2019, Onyx Lorenzoni, está previsto para esta quarta-feira (31).
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