Descrição de chapéu Financial Times

Como a economia comportamental me ajudou a superar o vício em telefone

Não estava feliz com o papel das tecnologias na minha vida, mas também não queria abandoná-las

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Tim Harford
Nova York | Financial Times

2011 foi um grande ano para mim. Meu filho nasceu. Mudamos para outra cidade. Publiquei um livro. Mas aconteceu uma outra coisa que de certa forma foi mais importante: em 9 de fevereiro de 2011 comprei meu primeiro smartphone.

Na época não pareceu um marco significativo na minha vida. Não o anotei em um diário ou fixei a data na memória. Só porque encontrei o recibo da compra eu pude saber o dia exato. Mas passei a entender que o telefone foi realmente uma coisa muito importante.

Daniel Kahneman, prêmio Nobel e autor de "Thinking, Fast and Slow" (2011) [Pensando, depressa e devagar], distingue entre o "self experimentador" e o "self lembrador". Meu self lembrador habita momentos marcantes como o novo bebê. Mas meu self experimentador está totalmente no telefone. 

Passei mais tempo interagindo com ele do que com meus filhos. Estou mais na presença do aparelho do que na presença de minha mulher, apesar de ter prioridades claras sobre com quem vou para a cama.

Como diz Cal Newport em um novo livro, "Digital Minimalism" [Minimalismo digital], nós não nos inscrevemos nisso. Minha primeira conta de e-mail (1994) recebia um punhado de mensagens por dia, na maioria boletins que eu assinava para evitar teias de aranha na caixa de entrada. O Facebook (2004) foi uma curiosidade, menos interessante que o último jogo de computador. 

O primeiro iPhone (2007) não tinha loja de apps e foi originalmente concebido como um iPod que fazia ligações –mas como "crackberry" tinha acabado de ser citada como a palavra do ano pelo "Webster’s New World Dictionary", talvez devêssemos prever o que estava por vir. 

Mas não previmos. O hardware e o software da era móvel se entranharam de maneira gradual e profunda na vida da maioria das pessoas. Se você for um pouco como eu, você pega seu telefone com muito mais frequência do que pega um garfo e uma faca, e passa muito mais tempo lendo e-mail do que lendo livros. 

Não que eu queira me queixar. Essas ferramentas são extremamente poderosas. Sem elas eu teria de contratar uma secretária, passar horas fazendo ligações incompletas e desistir de trabalhar durante longas viagens de trem e avião. Sim, eles podem às vezes me distrair durante a peça de Natal na escola, mas a alternativa seria perder a peça totalmente, porque o escritório e a escola ficam a 80 km de distância. 

Não estou totalmente feliz com o papel que essas tecnologias têm na minha vida, mas também não quero abandoná-las. Sei que não sou o único. Há vários anos venho dando conselhos esporádicos sobre o excesso de e-mails para leitores e –sou honesto– para mim mesmo. 

Mas no final do ano passado decidi fazer algo mais radical: empregar tudo o que eu sabia sobre teoria econômica e ciência do comportamento, juntamente com algumas descobertas práticas duramente alcançadas, para reconstruir minha relação com o mundo digital, a partir do zero. Esta é a história do que aprendi.

O poder do 'status quo'

A inércia é sempre o primeiro obstáculo. Richard Thaler, que ganhou um Prêmio Nobel Memorial por suas contribuições à economia comportamental, cunhou a expressão "efeito posse" para rotular o comportamento de um economista enófilo.

O economista tinha conseguido uns vinhos de Bordeaux por US$ 10 (R$ 36) a garrafa, e as viu aumentar de valor para US$ 200 (R$ 732) cada uma. O economista não sonharia em pagar US$ 200 por um vinho, mas também não queria vendê-los por US$ 200. Ficou contente em bebê-los em ocasiões especiais. 

Esse comportamento é ilógico: ou o economista deveria preferir US$ 200 ou deveria preferir o vinho, e qual ele de fato possui não deveria fazer diferença. Mas seus atos parecem perfeitamente naturais, e Thaler e colegas puderam demonstrar um comportamento semelhante em experimentos em laboratório. 

Nós gostamos do que temos, e esses experimentos sugerem que não temos outro motivo para gostar daquilo que temos a não ser o fato de que é nosso: as desvantagens de escolher alguma outra coisa muitas vezes parecem maiores que as vantagens. Em consequência, relutamos em abandonar o que temos –incluindo as ferramentas digitais que nos acostumamos a usar. 

Por esse motivo, céticos digitais como Cal Newport e Jaron Lanier sugerem que o primeiro passo em uma reavaliação de seus hábitos digitais deve ser uma súbita interrupção temporária.

Lanier, um pioneiro em realidade virtual e autor de "Ten Arguments for Deleting Your Social Media Accounts Right Now" (2018) [Dez argumentos para deletar imediatamente suas contas nas redes sociais], aconselha pelo menos uma interrupção de seis meses em todas as redes sociais. Newport sugere um afastamento mais curto, porém mais amplo: não só das redes sociais, mas nada de Netflix, Google Maps, nem smartphones –nenhuma ferramenta digital por 30 dias, fora o que seja essencial para a profissão.

A questão aqui não é um "detox". Não há benefício intrínseco em tirar um mês de folga dos computadores, assim como se poderia recomendar uma pausa breve e revigorante de fumar cigarros ou usar opiáceos.

O objetivo é mudar a situação atual para permitir uma reavaliação. Só depois que você larga a mochila eletrônica lotada de possibilidades digitais e sai desimpedido é que está em posição de tomar uma decisão sensata sobre se realmente quer carregá-la durante o dia todo.

Assim, retirei vários apps do meu smartphone. A primeira vez em que arrastei um ícone para a lata "desinstalar" pareceu um grande passo, mas logo se tornou um prazer estonteante. Lá se foram os apps de notícias, e um leitor de blogs chamado Feedly que absorvia uma quantidade enorme do meu tempo e atenção. Eu já evito games no telefone, mas os teria removido com prazer. 

Poupei o app do "Financial Times" (que certamente passa no teste de Newport de necessidade profissional) e também mantive o Google Maps, um tocador de podcasts, o app Espresso da "Economist", a câmera e o app da meteorologia. Newport teria sido mais radical, mas fiquei satisfeito com minhas opções.

A grande pergunta era: o que fazer com minhas contas nas redes sociais? O Facebook era simplesmente complicado demais para deletar, especialmente porque minha conta pessoal está conectada de maneiras opacas com uma página "Tim Harford" mantida por minha editora. Mas eu nunca tive Facebook no telefone, e depois de rapidamente deixar de seguir ou emudecer todos os meus contatos não tive problemas em ficar desconectado.

Meu hábito do Twitter é mais problemático. Tenho 145 mil seguidores, gentilmente convencidos a me seguir durante dez anos e 40 mil tuítes –o que praticamente equivale a dez livros, ou 20 anos de colunas semanais. Só isso já me lembrava do esforço que o Twitter pode ser; mas apagar a conta parecia a opção nuclear. 

Então o que eu poderia fazer? Dois anos atrás, escondi a coluna "menções" para não ver o que os outros dizem sobre mim no Twitter. (Muita coisa é amigável, algumas são prejudiciais e quase todas, supérfluas.)

Mas eu ainda perdia muito tempo circulando por lá sem ganhos evidentes. Por isso deletei o app do smartphone, e em 23 de novembro de 2018 tuitei que estava planejando "sair do Twitter por um tempo". Por uma agradável coincidência, a última pessoa com quem interagi antes de desconectar foi o homem que batizou o efeito posse, Richard Thaler. 

Tempo para quê?

Uma das ideias mais importantes –e mal compreendidas– da economia é a do custo de oportunidade.

Tudo o que fazemos é uma decisão implícita de não fazer outra coisa. Se você decide ir a uma palestra à noite, está decidindo não ficar em casa lendo uma história de ninar. Se você passa meia hora percorrendo sites de notícias, é meia hora que você poderia passar vendo futebol. Aqueles 40 mil tuítes me custaram alguma coisa, mas não tenho certeza do quê, e certamente não avaliei o preço enquanto os tuitava. 

Essa negligência com o custo de oportunidade é uma característica muito humana; muitas vezes deixamos de pensar no custo de oportunidade de nossas escolhas. Uma ilustração engraçada disso, embora ligeiramente antiquada, é a opção entre um CD-player de ponta de £ 1.000 (R$ 4780) ou um aparelho ligeiramente menos excelente de £  700.

Uma opção difícil –até ser enunciada como uma escolha entre um CD-player de ponta de £ 1.000 e um player de £ 700 mais £ 300 de CDs. Nessa altura, a maioria das pessoas claramente prefere a segunda opção. O custo de oportunidade do aparelho mais caro dificilmente poderia ser mais óbvio; no entanto, trazer o óbvio à nossa atenção modifica nossas decisões.

Por esse motivo, eu estava decidido não somente a reduzir minhas atividades digitais, como a preencher o tempo e a energia liberados com alguma outra coisa. Concentrei-me em três atividades. Primeiro, mais exercício: substituí o Twitter por um app que poderia me orientar por breves e vigorosas sessões de ginástica.

Segundo, mais diversão: procurei alguns velhos amigos e os convidei para jogar role-playing comigo nas noites de domingo a cada 15 dias, rolando dados e fingindo ser feiticeiros. (Sei que Dungeons & Dragons não é moderno, mas eu também não sou, por isso não me importa.)

E terceiro, como as redes sociais deveriam ser para nos conectarmos com pessoas distantes, e como o Natal estava próximo, decidi começar a escrever cartas para mandar com os cartões de natal. Não consegui escrever adequadamente para todos, mas escrevi cartas sérias para quase 30 velhos amigos, a maioria dos quais eu não via há algum tempo. Refleti sobre nossas longas amizades, lembrei dos bons tempos passados e, em particular, de momentos importantes compartilhados só por nós dois, e mais ninguém. As cartas foram a antítese de clicar "Like" no Facebook. A experiência começava a ficar interessante.

Movimentos de dedos, rápidos e lentos

Como Daniel Kahneman explicou em "Thinking, Fast and Slow": "Quando enfrentamos uma pergunta difícil, muitas vezes respondemos a outra mais fácil, geralmente sem notar a substituição". Em vez de perguntarmos se devemos comprar ações da Amazon, perguntamos: "Eu gosto de fazer compras na Amazon?" Em vez de avaliar as qualidades de liderança e administrativas de um candidato presidencial, nos perguntamos se gostaríamos de tomar uma cerveja com ele. 

Tristan Harris, diretor-executivo do Centro para Tecnologia Humana, afirma que os serviços digitais que usamos muitas vezes fazem essa substituição por nós. Imagine, diz Harris, um grupo de amigos numa saída noturna, tentando descobrir aonde poderiam ir para manter a conversa fluindo. Eles procuram em seus telefones uma recomendação e se veem olhando para imagens de coquetéis no Instagram.
Os telefones, segundo Harris, substituem a pergunta "Aonde podemos ir para continuarmos conversando?" por "Qual é um bar com boas fotos de bebidas?" Os telefones simplesmente não sugerem opções como ir ao apartamento de alguém ou passear à beira do rio.

Isso acontece o tempo todo, e muitas vezes não percebemos a substituição. Procurando por amor, simplesmente repassamos rostos no Tinder, em vez de procurar clubes locais ou atividades de voluntariado. Pegando o telefone para ver a hora de manhã, a pergunta "Que horas são?" é rapidamente substituída por "O que eu perdi enquanto dormia?"

Enquanto eu escrevia o último parágrafo, fui confrontado com o exemplo perfeito. Começou a chover. Desejando saber se a chuva ia durar, digitei "tempo" no Google. Recebi uma resposta instantânea, mas também me mostraram uma lista de apresentadores do tempo. Rostos humanos! Sempre atraem a atenção.

Uma velha conhecida da faculdade se tornou uma moça do tempo; eu me perguntei como ela estaria. Algo comum. É claro que o Google substituiu por uma pergunta mais simples: qual é a aparência dela hoje em dia? Outras fotos de apresentadores do tempo também foram mostradas, e 30 segundos depois eu estava olhando imagens de uma personalidade meteorológica completamente diferente, Tomasz Schafernaker, nu até a cintura. 

Quinze anos atrás, eu teria me esforçado para explicar à minha mulher essa sequência de acontecimentos. Mas hoje não há realmente necessidade de explicação. Todos sabemos quão rápida e facilmente "Quando vai parar de chover?" pode levar a "Como são os mamilos de Tomasz Schafernaker?"

Tentar fazer um trabalho com um aparelho conectado à internet é como tentar fazer regime quando há um minibar cheio de cerveja e sorvete sobre sua mesa, ao alcance da mão. Você pode abrir uma lata e dar um gole antes de perceber o que fez.

Talvez ainda pior, as recompensas tentadoras são imprevisíveis. O psicólogo B.F. Skinner certa vez se viu tentando economizar um estoque de bolinhas de alimento que ele usava para recompensar camundongos. Para sua surpresa, ele descobriu que "reforço intermitente" --às vezes os ratos ganhavam uma bolinha, às vezes não-- era mais motivador do que recompensas confiáveis. Prêmios imprevisíveis são altamente viciantes, como o e-mail, as redes sociais ou manchetes caça-cliques.

Então o que fazer sobre esse problema? Não é fácil: por definição, uma resposta intuitiva ocorre antes que tenhamos tempo de parar para pensar. A solução óbvia é criar certo atrito. Instalei um plug-in de software chamado Strict Workflow [Fluxo de trabalho rígido] em meu computador. Com um clique, ele bloqueia ralos de tempo como o Twitter, YouTube e vários sites de notícias caça-cliques por um período de 25 minutos.

É surpreendente quantas vezes durante esses 25 minutos eu verifiquei por reflexo, vi a mensagem de bloqueio e voltei ao trabalho. Espero que algumas semanas ou meses com esse bloqueador possam romper esse hábito de mudar de tela, mas em todo caso o software funciona.

Enquanto isso, ao desinstalar apps de notícias, Twitter e Feedly, tornei meu telefone menos parecido com uma doceira. Como testemunho do poder do hábito inconsciente, depois de desinstalar o Feedly deletei alguns e-mails que chegaram, depois sem pensar tentei encontrá-los. Levei um momento para perceber que estava procurando um aplicativo que eu tinha eliminado menos de um minuto atrás. 

Foi um lembrete de que há mais coisas acontecendo aqui do que tomada de decisões fraca ou míope: muitas vezes quando usamos nossos telefones não estamos realmente tomando decisões conscientes.

Benefícios do excesso

Paul Romer ganhou um Prêmio Nobel Memorial recentemente por analisar o modo como diversas inovações se propagariam, permitindo outras inovações e o próprio processo de crescimento econômico.

Quatro semanas após iniciar meu experimento, percebi alguns benefícios inesperados que se propagaram. O telefone ainda era tentador, mas cada vez menos. Levei meus filhos para ver um filme de Natal e, pela primeira vez em anos, não senti a necessidade de checar o telefone. 

Estava tendo um sentido real da natureza mutuamente reforçadora do ecossistema de distração --e como eu tinha deixado de vê-lo claramente quando estava dentro dele. Em novembro, por exemplo, eu ficaria percorrendo o Feedly procurando material interessante. Eu dizia a mim mesmo que procurava coisas para ler, mas na verdade procurava coisas para comentar no Twitter. Se estivesse com o tempo apertado, às vezes tuitava coisas em vez de lê-las. Essa bobagem era evidência de um hábito muito grave.

Mas depois de desinstalar o Twitter me vi menos tentado a verificar minhas estatísticas do Twitter (nada para ver) e também menos tentado a percorrer os blogs. Afinal, se eu não ia tuitar sobre eles, por que não ler um livro? Cada novo app que eu removia do meu telefone diminuía minha tendência a pegar o aparelho; muitas vezes tornava outros apps menos úteis ou interessantes. Eu não tinha previsto esse efeito, mas não estava me queixando. 

Adaptando-se aos fatos

Primeiro de janeiro geralmente é a data para virar uma nova página, mas, em retrospectiva, iniciar meu experimento no final de novembro foi um golpe de mestre acidental. A aproximação do Natal é um tipo diferente de ocupação: o volume de e-mails diminui, substituídos por cartões de Natal e listas de compras.

É uma época em que muitas vezes vemos as pessoas face a face, em vez de no Facebook.

Ao desplugar vários dispositivos digitais, eu estava me movendo com vento em popa: fazendo com firmeza e deliberação o que eu poderia de qualquer modo ter escolhido lentamente. 

O experimento estava funcionando bem. Eu não sentia a menor falta do Twitter. Passava muito menos tempo com o telefone. Alguns velhos amigos surgiram do escuro para me dizer que tinham apreciado minha carta. Alguns temeram que eu estivesse passando por algum tipo de crise, mas em geral as cartas pareceram uma maneira extremamente melhor de contatar pessoas do que pelo Facebook. 

Quando encontrei amigos e parentes, achei muito mais fácil lhes dar minha total atenção. Sherry Turkle, autora de "Reclaiming Conversation" (2015) [Recuperando a conversa], descobriu que as pessoas inicialmente usavam textos como um acréscimo à conversa face a face, mas os textos logo se tornaram um substituto: mais convenientes, mais controláveis. 

O problema da conversa real, segundo disse a ela um estudante do último ano colegial, era que "ela ocorre em tempo real e você não pode controlar o que vai dizer". 

Entendo isso, e provavelmente todos tivemos conversas face a face durante o Natal que gostaríamos de ter conduzido a mil quilômetros de distância. Mas enquanto a conversa real pode ser cansativa também é extremamente mais rica e profunda do que alguns bytes de texto. Quanto menos atraente eu achava meu telefone, mais eu gostava de conversar com a pessoa na minha frente. 

No final de dezembro, veio um teste estranho e inesperado: recebi uma Ordem do Império Britânico na lista de homenageados de Ano Novo. De repente o silêncio digital do final do ano foi interrompido por um fluxo constante de mensagens de cumprimentos. 

Eu saí para passear com velhos amigos, atualizando as notícias dos últimos meses e conversando sobre o próximo ano. Em meu bolso, o telefone apitava, e eu me senti cada vez mais ansioso sobre deixar as mensagens sem resposta. Consegui alguns momentos para digitar respostas, dando desculpas ligeiramente envergonhadas a meus companheiros.

Não é uma experiência que eu gostaria de repetir, mas me ensinou algumas lições. Primeiro, até mensagens digitais amistosas podem provocar ansiedade. Eu temia parecer ingrato por não responder rapidamente. Isso era besteira. Um atraso não teria incomodado ninguém. Mas eu não podia me convencer. Devia ter deixado o telefone em casa.

Segundo, é fácil reativar maus hábitos. Depois de algumas semanas em que verifiquei meu telefone algumas vezes por dia, em vez de várias vezes por hora, o fluxo de mensagens me levou de volta ao hábito de verificar o telefone como um rato que espera uma bolinha de comida. Levei vários dias a mais para recuperar a calma. 

Terceiro, e mais positivo, o investimento em desprezar as redes sociais estava dando dividendos. Eu me conectei ao Facebook pela primeira vez em semanas, pois não queria ignorar as mensagens de parabéns. Estava totalmente silencioso. As pessoas tinham entendido, ao que parece, que o Facebook não era uma boa forma de me contatar. Consegui resistir totalmente a me conectar ao Twitter. 

Mas comecei a me perguntar se o novo regime sobreviveria ao contato com as rotinas de trabalho em janeiro. Liguei para Jocelyn Glei, autora de "Unsubscribe" (2016) [Desinscrever] e apresentadora do podcast Hurry Slowly [Corra devagar]. "A ideia de que você vai mudar seus hábitos e tudo bem é absurda", disse ela alegremente. Está bem, mas então como manter o novo padrão? 

O conselho de Glei foi manter-me vigilante. Uma coisa é sair no Natal, outra é em setembro. Tem sentido ficar fora do Twitter enquanto você escreve um livro; menos sentido, talvez, enquanto o comercializa. Cada novo projeto, aconselhou ela, exige uma rápida reavaliação de onde traçar os limites digitais. A reconfiguração digital seria um "work in progress".

Lições aprendidas

O ponto de ruptura foi permitir uma avaliação profunda de quais serviços digitais valiam a pena ser readmitidos em minha vida. Assim, enquanto o novo ano começa, e os e-mails voltam a fluir livremente, o que eu aprendi?

Primeiro, não senti nenhuma falta de me plugar no Twitter. Ignoro as notificações há anos –perdendo alguns benefícios e muita irritação da plataforma–, mas continuo tuitando por uma estranha combinação de dever e inércia. 

Meu novo plano é me conectar durante algumas horas na sexta-feira, colocar alguns links para minhas colunas e outros projetos que possam interessar às pessoas, e desconectar. Se um dia eu encontrar algum motivo para usar a plataforma mais intensamente, voltarei.

Segundo, gostei de ter um telefone mais tedioso. Com muito pouco nele, mas uma caixa de entrada de e-mails facilmente esvaziada e o app do "FT", eu o pego com menos frequência e durante menos tempo, e tenho maior probabilidade de fazer algo útil com ele quando o checo. 

Reinstalei o Feedly –que acho essencial para meu trabalho–, mas ficarei de olho na utilização. Sem tuítes para enviar, o app ficou mais útil. Eu leio para aprender algo, em vez de para tuitar.

Terceiro, o bloqueador de "fluxo de trabalho rígido" funcionou tão bem, poupando-me de meus impulsos digitais que acrescentei minha caixa de mensagens à lista de bloqueados. Eu havia tido sucesso limitado com um bloqueador de e-mails antes, mas desta vez foi muito mais eficiente, talvez porque o bloqueador fizesse parte de um plano maior.

Finalmente, foi bom enfocar o lado positivo da faxina digital. Embora fizesse parte de um exercício de quebra de hábitos ou autonegação, foi muito mais útil pensar nele como aplicar tempo e atenção em coisas importantes. 

Alguns velhos amigos pareceram genuinamente comovidos de receber uma carta de verdade; ninguém jamais ficou emocionado com um "like" no Facebook. Eu me sentia em melhor forma no início de janeiro do que no início de dezembro, o que dificilmente é a experiência habitual no Natal. Caminhei, conversei, comi e bebi com velhos amigos. Até lutei com alguns feiticeiros imaginários.

Não pretendo abandonar tudo isso para passar mais tempo com meu telefone. 

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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