Atrás de Magazine Luiza, dona da Casas Bahia quer retomar guerra do varejo

Sob nova direção, empresa valoriza mais de 100% na Bolsa e volta à corrida digital

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São Paulo

Para o alto comando da Via Varejo, a Black Friday deste ano representava um teste de fogo. A edição de 2018 fracassou, com site fora do ar, produtos não entregues e alto índice de reclamação. 

O faturamento de R$ 1,1 bilhão em um dia e as sequentes valorizações na Bolsa após a data deram confiança para o presidente da empresa, Roberto Fulcherberguer, comunicar que a guerra do varejo no país ainda não tem vencedor.

No comando desde junho, o executivo é responsável pela reestruturação da rede varejista. Nomeado por Michel Klein, filho do fundador da Casas Bahia, Fulcha, como é conhecido por alguns colegas, foi nomeado em junho, quando a família Klein comprou de volta as ações da Via do GPA, então controlador.

Roberto Fulcherberguer, presidente da Via Varejo; executivo iniciou carreira na Loja Arapuã
Roberto Fulcherberguer, presidente da Via Varejo; executivo iniciou carreira na Loja Arapuã - Karime Xavier/Folhapress

A empresa quer recuperar o terreno perdido para a Magazine Luiza, que virou recorrente exemplo de como digitalizar uma empresa tradicional. As ações da companhia gerida pelos Trajano valorizaram mais de 2.000% desde a abertura de capital, em 2011.

Fulcherberguer tem simpatia do mercado além da tradição varejista. O escolhido de Klein já foi do GPA e iniciou sua carreira nas Lojas Arapuã dos anos 1980, que apesar de quebradas, um dia foram líder em eletrodomésticos. Desde que tomou posse, a Via subiu mais de 100% na Bolsa.

O resultado negativo do último trimestre —prejuízo líquido de R$ 383 milhões— era esperado pelo executivo, para quem o momento é de “botar a casa no lugar”. As Casas Bahia pintaram lojas, mudaram fachadas e trocaram computadores no último semestre. 

Os resultados negativos do último trimestre —prejuízo líquido de R$ 383 milhões— eram esperados para “Fulcha”, como é chamado por alguns colegas, que resume o momento como o de “botar a casa no lugar”. Literalmente. A Casas Bahia está pintando lojas, mudando fachadas e trocando computadores. 

A digitalização e a operação de uma nova estratégia para a integração do comércio digital e físico são o próximo passo, disse o executivo à Folha em entrevista na sede da Via, em São Caetano do Sul.

Ele conta que, em seu diagnóstico de chegada, notou que a empresa prestava desserviço ao vender forte no online. 

“Não estávamos conseguindo entregar, o pós-venda não acontecia, no meio do caminho sumia pedido. Tomamos a decisão mais difícil que um varejista pode tomar na vida, tiramos o pé da venda online durante julho e agosto.” 

A digitalização total da companhia ele projeta para o médio prazo, “uma jornada de um ano, um ano e meio”, sem “Big Bang”.

"Fulcha", para colegas, está com a missão de reestruturar a Via, que perdeu a corrida para a Magazine Luiza nos últimos anos
"Fulcha", como é conhecido por colegas, está com a missão de reestruturar a Via, que perdeu a corrida para a Magazine Luiza nos últimos anos - Karime Xavier/Folhapress

A receita do último trimestre da Via é semelhante à da Magazine Luiza, em torno de R$ 6 bilhões. Só que, enquanto a primeira reportou prejuízo de R$ 383 milhões, a concorrente lucrou R$ 235 milhões.

Mesmo assim, o mercado se anima com a empresa. Analistas interpretam que a Via sinalizou para onde ruma, com infraestrutura para entrega e para o alto tráfego online.

A Black Friday turbinou as buscas por ações, e a varejista se valorizou mais de 17%. “Não há teste de estresse maior que uma Black Friday. Faturamos R$ 6 bilhões no terceiro trimestre e R$ 1,1 bilhão em um único dia. Daqui para a frente, estamos preparados para escalar a venda”, disse o presidente da holding.

Fundada há dez anos, com a fusão das operações online de Casas Bahia, Ponto Frio e Extra, a Via Varejo tem uma trajetória de gestão instável. O GPA, no controle até junho, é do endividado francês Casino.

“A Via sofreu na gestão do GPA, que tem essência fundamentada no varejo alimentar. Foi até bom [que os Klein comprassem ações de volta], porque o GPA está acelerando inovações e indo para um caminho virtuoso, enquanto a Via voltou a focar a área que perdeu”, afirma Alexandre Van Beeck, sócio da GS&Consult.

A Magalu apostou em uma estratégia de integração online e offline que rendeu bom desempenho financeiro e cerca de 15% do ecommerce. Analistas lembram, porém, que ela também se beneficiou do vácuo deixado pela Via e pela Ricardo Eletro. A dupla tinha boa performance no setor há cerca de sete anos, quando a Magalu estava em baixa. 

A expectativa é que a dona das Casas Bahia demonstre já no próximo trimestre, mesmo que de modo tímido, se a organização interna se concretizará em números melhores.

“O case Via Varejo é o clássico ‘sob nova direção’. Se unirmos isso ao ambiente macro, com queda de juros que favorece o consumo e crescimento, a gente pode chegar em um alinhamento de planetas para botar dinheiro nessa aposta, que é ainda é uma aposta”, diz Lauro Figueiredo, sócio fundador da SIX Investimentos, credenciada à XP.

Ele destaca que ninguém faz uma reviravolta dessa em seis meses, e que há um caminho tortuoso até migrar da intenções à execução. “Ficará mais claro no fim do ano que vem”, projeta.

É um desafio a uma empresa com cerca de 50 mil funcionários e mais de mil lojas.

Além disso, a Magazine Luiza, que já encheu o bolso de muito investidor, está longe de ser a única concorrente. Além da chegada da Amazon no Brasil, com abertura de centro de distribuição e descontos competitivos em assinaturas, cresce o espaço da B2W, que opera as Americanas, e do Mercado Livre.

Mesmo que as apostas não se concretizem no longo prazo, o espírito de guerrilha do presidente é visto com bons olhos mesmo pelos competidores. Um deles afirmou que a gestão está agressiva e “parecida com a época dos Klein”, o que beneficia o setor todo.

“A questão é que ela precisa ser rápida. Transformação digital é cumprir uma obrigação, não é um diferencial. As empresas precisam se orientar completamente aos dados, saber atingir o cliente na hora certa e com o produto certo”, recomenda Junior Bornelli, fundador da Startse.

Do lado de Fulcha, ele quer que a empresa cresça pelo que o mercado cresce —“e não vou dar esse guidance”—, ou por share ou pelos dois. “Estou torcendo pelos dois.” Apesar de empresa comunicar bastante seus últimos feitos, mantém em segredo as mudanças práticas de como retomará sua posição. 

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