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Casos que verificamos: A foto de uma obra do governo Lula na BR-163 que foi usada para elogiar Bolsonaro

Passo a passo traz dicas de como verificar publicações na internet

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São Paulo

Como finalização da segunda fase do projeto, o Comprova destrinchou o passo a passo de cinco das verificações realizadas ao longo do semestre. ​

A pavimentação da BR-163 no Pará, rota de escoamento da produção agrícola do Centro-Oeste, foi um tema recorrente nas redes do presidente Jair Bolsonaro em 2019. Ao longo do ano, ele fez pelo menos 13 postagens no Twitter sobre as obras na estrada, cujo asfaltamento terminou em novembro, informou o governo.

Imagem mostra uma montagem com duas fotos, a primeira delas mostra uma estrada bastante enlameada e com ônibus e caminhões tendo dificuldade para se locomover, junto da frase governo Lula e Dilma. Na segunda imagem, máquinas trabalham no asfaltamento da pista, o que é creditado ao governo de Jair Bolsonaro
Para checar essa montagem, o Comprova fez uma cópia de cada uma das fotos e procurou por elas no Google imagens - Reprodução/Facebook

Mesmo com os trabalhos sendo realizados, houve quem preferisse abordar o assunto de forma mentirosa nas redes. No começo do ano, Agência Lupa, Estadão Verifica, Aos Fatos, e-Farsas, e Boatos.org fizeram verificações sobre postagens que usavam dados falsos ou fora de contexto com o objetivo de dizer que o governo Bolsonaro tinha começado os trabalhos na rodovia.

Em julho, chegou a vez de o Comprova entrar nesta história. Uma postagem feita no Facebook pela página “O Mito” comparava duas fotos que seriam da BR-163 para dizer que, no governo Bolsonaro, as obras estavam a todo vapor. O contraste era feito com a suposta situação da estrada nos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff: um atoleiro só. A montagem tinha mais de 20 mil compartilhamentos. ​

A verificação feita pelo Comprova revelou, no entanto, uma história bem diferente daquela que a postagem pretendia passar.

Passo a passo da verificação

Para checar a veracidade das imagens e do contexto em que elas foram apresentadas, precisávamos responder algumas perguntas:

  • As fotos mostravam trechos da BR-163? Se sim, de quais locais?

  • Quando as fotos foram feitas?

  • Quem tirou as fotos?

Vimos que a montagem trazia um selo escrito “Geração Conservadora”. Procurando por esse termo no Google, descobrimos que havia um perfil no Instagram com esse nome. Acessamos o perfil e, fazendo uma busca manual, encontramos um post de março com a mesma montagem.

A postagem do Geração Conservadora ainda não respondia, no entanto, a nenhuma pergunta nossa. Por isso, o passo seguinte foi separar as duas imagens – a do atoleiro e a das obras – para podermos fazer buscas por elas na internet e verificar se tinham sido publicadas em outro lugar. Esse processo é chamado de busca reversa de imagens.

A separação das fotos foi feita de forma simples no Paint, um programa básico do Windows. Depois, foi a hora de fazer a busca reversa no Google Imagens. A busca nos mostrou que as duas imagens já tinham sido publicadas em outros sites, e que representavam coisas bastante diferentes dos posts que viralizaram.

A foto do atoleiro foi publicada pelo site paraense Folha do Progresso, em 6 de fevereiro de 2017, em uma notícia sobre o aumento do tempo de viagem na BR-163 justamente por causa das más condições da estrada.

Por telefone, conseguimos contato com o editor do Folha do Progresso, Adécio Piran, que nos ajudou a chegar ao autor da foto, o jornalista Juliano Simionato. Ele nos contou que fez uma viagem de caminhonete pela BR-163 justamente em fevereiro de 2017.

Além disso, nos confirmou que o ônibus que aparece na foto fazia o trajeto entre as cidades de Itaituba e Rurópolis, no qual a BR-163 e a BR-230 (Transamazônica) são a mesma estrada.

Ou seja: a foto do atoleiro era sim da BR-163, mas não da época dos governos Lula e Dilma, e sim do governo de Michel Temer (MDB).

Texto de 2017 na Folha do Progresso traz a mesma montagem
O jornalista Juliano Simionato contou ao Comprova que tirou a foto na BR-163 em fevereiro de 2017. - Reprodução/Folha do Progresso

Já a busca reversa pela foto dos tratores na estrada nos levou a uma notícia no site do Superior Tribunal Militar (STM) publicada em setembro de 2017. Isso já seria suficiente para dizermos que a imagem não mostrava obras do governo Bolsonaro, que começou só em janeiro de 2019. Mas nosso objetivo era chegar à origem da imagem.

O site do STM não tinha informações suficientes sobre isso. A legenda dizia apenas “imagem ilustrativa - obras de engenharia do Exército”. Procuramos a assessoria de imprensa do tribunal, que nos informou que a foto era do site do 8º BEC (Batalhão de Engenharia de Construção), que atua no Pará. No entanto, o site não existia mais, e os emails que mandamos para o 8º BEC não foram respondidos.

Fim da linha? Não. Acessamos o Flickr do Exército e, fazendo a boa e velha busca manual, olhando uma a uma as imagens, chegamos à foto – com a data de 15 de dezembro de 2008.

Reprodução da tela
Depois de mais buscas, descobriu-se o registro era de 2008 e tinha sido publicado originalmente pelo próprio Exército em sua conta no Flickr. - Reprodução/Google

Para nossa sorte, entre as informações da foto no Flickr do Exército estavam seus dados EXIF. Os dados EXIF são uma espécie de carimbo de informações que a câmera coloca no arquivo da foto. Uma destas informações é a data: sim, a foto era de 15 de dezembro de 2008.

Agora sim, fim de papo: a foto era de obras na BR-163 – só que ainda no período de Lula, que governou entre 2003 e 2010.

Conclusão
Assim, a verificação do Comprova levou à conclusão de que a montagem era enganosa, já que o post verificado usou imagens verdadeiras, mas retirou-as do contexto correto, alterando seu significado.


Esta verificação foi feita por Ana Carolina Santos (piauí) e Bernardo Barbosa (UOL) e publicada pelo Comprova em 27 de julho de 2019.

Projeto Comprova

O Comprova é uma coalizão de veículos jornalísticos que visa identificar, checar e combater rumores, manipulações e notícias falsas sobre políticas públicas. É possível sugerir checagens pelo WhatsApp da iniciativa, no número (11) 97795-0022.

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