Câmara contraria tese do governo e diz que estender desoneração não fere a Constituição

Argumento sobre inconstitucionalidade foi apresentado pela equipe econômica para vetar benefício; governo tenta evitar reversão da medida

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Brasília

Um parecer da Câmara concluiu que a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos, que beneficia 17 setores da economia, não seria inconstitucional, contrariando a tese do governo.

O time do ministro Paulo Guedes (Economia) tem afirmado que, desde a reforma da Previdência, ficou vedado adotar medidas que possam reduzir a arrecadação de recursos do fundo que banca a aposentadoria dos trabalhadores do setor privado.

A conclusão da Mesa Diretora da Câmara é que estender o benefício estaria de acordo com Constituição, pois o incentivo fiscal já é dado a empresas de setores com alto grau de mão de obra.

Procurado, o Ministério da Economia e a Secretaria Geral da Presidência não quiseram se manifestar.

Ministro da Economia, Paulo Guedes, em cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília
Ministro da Economia, Paulo Guedes, em cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

Nesta semana, técnicos do governo afirmaram que derrubar o veto e ampliar —em um ano— o prazo da desoneração da folha, medida que reduz encargos pagos pelos patrões, seria inconstitucional.

No entanto, esse argumento não foi citado para sustentar o veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à decisão do Congresso.

Mesmo fora do embasamento jurídico do veto, a Câmara analisou a tese do Ministério da Economia. Técnicos afirmaram que, por a desoneração da folha já existir, a medida poderia ser prorrogada, pois a reforma da Previdência impediria apenas a criação de novos benefícios.

O parecer lembra que a emenda constitucional que mudou as regras da previdência veda substituição da base de cálculo das contribuições feitas pelas empresas. No entanto, exclui dessa vedação as substituições já estabelecidas —como era o caso da desoneração aos 17 setores.

No documento, os técnicos argumentam que a prorrogação não caracterizaria a criação de uma nova substituição da contribuição patronal. “Corrobora esse entendimento o fato de não serem alterados alíquotas, beneficiários ou quaisquer outros elementos que configuram a substituição”, indica o parecer.

O texto diz inclusive que o Congresso poderia tornar permanentes as substituições instituídas antes da emenda da Previdência.

A desoneração da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre o faturamento bruto, em vez de 20% sobre a remuneração dos funcionários para a Previdência Social (contribuição patronal).

Com a troca, setores com elevado grau de mão de obra pagam menos aos cofres públicos. O inventivo foi criado para estimular a contratação de funcionários.

Atualmente, a medida beneficia companhias de call center, o ramo da informática, com desenvolvimento de sistemas, processamento de dados e criação de jogos eletrônicos, além de empresas de comunicação, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiros e empresas de construção civil e de obras de infraestrutura.

A medida se encerraria em dezembro. Em junho, o Congresso aprovou a extensão do incentivo tributário por mais um ano, o que foi vetado por Bolsonaro. Por ano, o Ministério da Economia estima que deixaria de arrecadar R$ 10,2 bilhões.

Empresários desses 17 setores, que reúnem cerca de 6 milhões empregos diretos, dizem que não suportariam esse aumento de custo e que 1 milhão de pessoas poderiam perder os empregos caso o veto seja mantido.

A avaliação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), está em linha com o parecer técnico da Casa. Para ele, o governo tem condição de manter a desoneração por mais um ano, como aprovado pelo Congresso.

“Nós precisamos manter os empregos. Sabemos que a desoneração por mais de um ano [até o fim de 2022] seria um período muito longo, um custo grande, mas a prorrogação por um ano acho que é perfeitamente possível que o governo tenha condições de colocar no orçamento”, disse na terça-feira (14).

Maia defende a derrubada do veto pelo Congresso e que os parlamentares encontrem uma forma de compensar, no Orçamento, a manutenção da desoneração até o fim de 2021.

No veto, o governo alegou que alongar o prazo de desoneração fere a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2020 e a Lei de Responsabilidade Fiscal —sem mencionar a tese envolvendo a reforma da Previdência.

Além disso, citou um artigo da Constituição que pede estimativa de impacto orçamentário, o que geralmente não é feito em caso de modificações de um projeto ao longo da tramitação. Disse ainda que a prorrogação da desoneração não estava na versão original do texto —embora o próprio governo já tenha recorrido à estratégia de incluir medidas por emenda parlamentar em diversas propostas legislativas.

O clima é contrário à decisão do presidente. Por isso, interlocutores do Palácio do Planalto tentam postergar a votação. Para derrubar o veto é necessário o voto da maioria absoluta das duas Casas —257 deputados e 41 senadores.

Está prevista para a próxima semana uma reunião de líderes no Senado para decidir sobre quando o veto será analisado. O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), tentar conter a pressão interna no Parlamento e de empresários para que o item seja incluído já na sessão que deve ocorrer até quinta-feira (23).

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