Epidemia sob controle e esquemas contra desemprego fazem varejo recobrar fôlego na Europa

Vendas na União Europeia já recuperaram 93% do nível pré-coronavírus, mas incerteza ainda é alta e PIB deve cair mais de 8% neste ano

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Bruxelas

Bares e restaurantes ficaram tão cheios com a chegada do verão em Bruxelas que a polícia teve que fechar dez deles no começo de julho em bairros de concentração de jovens, como Anderlecht e Saint-Gilles.

Com números que indicam pandemia de coronavírus sob controle (menos de 100 novos casos por dia e dias com zero morte), a retomada das atividades entra no terceiro mês na Bélgica, e o movimento do comércio “só não é maior porque nas férias todo mundo voa daqui”, segundo Dominic, que serve uma mesa na praça de Londres, na vizinhança do Parlamento Europeu.

Dados recém-lançados pelo departamento de estatísticas da União Europeia mostram que o total de vendas no varejo europeu já atinge 93% do que foi registrado em fevereiro deste ano, quando a epidemia mal começara a atingir o bloco.

A maioria dos países europeus adotou quarentenas bastante restritas em março, fechando todas as lojas e estabelecimentos menos os de produtos essenciais, como mercados e farmácias.

No mês de maio, quando a economia começou a ser retomada, o consumo que estava represado disparou: vendas de roupas, calçados e tecidos saltaram 131% em relação ao abril, um crescimento que mais que compensou a redução de 77,8% registrada entre fevereiro e abril, quando o comércio parou.

Mesmo produtos mais caros, como móveis e eletrônicos, tiveram alta, de 30%. Computadores e livros subiram 24%, e as vendas de produtos não alimentícios, impulsionados por uma corrida às lojas de jardinagem e bricolage, subiram 30%.

O único setor do varejo que não teve forte alta em maio foi o de alimentos, bebidas e tabaco. A venda desses produtos tinha disparado em março, quando os europeus esvaziaram prateleiras para fazer estoques, mas recuaram em abril quando ficou claro que não haveria desabastecimento. Em maio, o crescimento no volume de comércio desses produtos em relação ao mês anterior foi de 2%.

Na média, o comércio europeu saltou 16,4% em maio, na comparação com abril.

Além do alívio na gravidade da epidemia de coronavírus, contribuiu para a recuperação das vendas o fato de que muitos países da União Europeia adotaram esquemas para prevenir o desemprego e manter a renda das famílias.

No primeiro trimestre deste ano, 2,3 milhões de europeus entre 20 e 64 anos tiveram seu trabalho paralisado pela crise, mas mantiveram uma parte dos ganhos com financiamento público. Programas que permitiram a redução das horas trabalhadas com compensação da perda de renda beneficiaram cerca de 60 milhões de pessoas em toda a Europa.

O vigor da volta às compras após os confinamentos acabou animando lojas e restaurantes a contratar, segundo uma das maiores agências de recrutamento temporário da Europa, a Adecco, provocando um ciclo virtuoso.

Em junho, o indicador de perspectivas para o mercado de trabalho da Comissão Europeia saltou 11,9 pontos em relação a maio, para 82,7.

Com menos famílias afetadas pela incerteza em relação ao futuro, os índices de confiança de empresas e consumidores também subiram por dois meses consecutivos, em maio e junho, embora estejam abaixo dos níveis pré-pandemia.

O indicador de sentimento econômico da Comissão, que pesquisa cerca de 135 mil empresas e 32 mil consumidores, aumentou 8,1 pontos de maio para junho (para 74,8), a maior alta mensal desde que a pesquisa começou, em 1961.

O indicador recuperou 30% de seu nível em relação a março e abril, quando a maior parte da economia europeia havia sido congelada pela tentativa de barrar o coronavírus.

O otimismo cresceu em todos os setores em junho, e foi mais acentuado entre os negócios de varejo.

Na França, que registrou a maior alta, de 9,4 pontos, as TVs e jornais têm repetido o clichê “Paris é uma festa” sobre imagens de cafés lotados. O movimento nas ruas é crescente desde 11 de maio, quando o país começou a levantar sua sua proibição para bares e restaurantes.

O país garantiu um dos mais amplos programas de proteção ao emprego, que atingiu até 50% dos trabalhadores, mais que o dobro da taxa alemã, por exemplo.

Em um telejornal, o sócio de um restaurante em Montparnasse chegou a dizer que “os negócios nunca foram melhores”, enquanto a câmera mostra uma fila que chega à esquina no começo da tarde de um domingo.

A festa, no entanto, pode ser prejudicada pelo término dos esquemas públicos de auxílio, a partir de setembro. As estimativas são de que a crise do coronavírus feche mais de 700 mil de vagas na França e, ainda que o país tenha um seguro-desemprego de longa duração, a perda de renda pode provocar nova queda nas vendas.

A confiança também não é igualmente distribuída na Europa neste começo de verão. No Reino Unido, onde o governo hesitou para implantar o confinamento, restaurantes e bares só reabriram no dia 4 de julho e, como os números não refletem tanto alívio (média de 700 novos casos e 90 mortes por dia, na última quinzena), três quintos dos britânicos dizem não se sentir à vontade para jantar fora, segundo o Escritório de Estatísticas Nacionais.

Como tudo o que envolve o coronavírus, porém, ainda há muita incerteza sobre a recuperação econômica na Europa —e no mundo.

As previsões revisadas na semana passada pela UE são de queda de mais de 8% no PIB do bloco em 2020, com uma recuperação de menos de 6% em 2021. Se não houver segunda onda.

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