Descrição de chapéu juros

Impedida de gastar, alta renda fez 'poupança forçada' na pandemia

Redução do nível de reservas deve sustentar atividade à frente, diz Itaú

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São Paulo

“Uma rede de shoppings voltados à alta renda reporta que alguns de seus centros já têm vendas acima de 80% das de 2019 – aparentemente, a impossibilidade de viagens internacionais traz algum alívio para as grifes de luxo, já que parte dos consumidores substituiu compras no exterior pelas lojas locais.”

O relato é da equipe do Itaú, no relatório Orange Book publicado ao fim de setembro.

Segundo os economistas do banco, o aumento do consumo de luxo em grifes locais é uma manifestação do que aconteceu com a renda dos muito ricos durante a pandemia.

Com empregos mais preservados do que os mais pobres e investimentos rendendo com a rápida recuperação dos mercados, essa parcela da população se viu impedida de gastar ao nível costumeiro devido às medidas de isolamento. Uma parte da renda dos mais privilegiados foi destinada ao consumo sofisticado, mas outra virou poupança, com as reservas atingindo níveis recordes em meio à pandemia.

Reabertura do comércio na rua Oscar Freire, endereço de consumo de luxo na capital paulista - Eduardo Anizelli - 10.jun.20/Folhapress,

No relatório de inflação publicado pelo Banco Central também ao fim de setembro, a autoridade monetária analisou o consumo por faixas de renda e constatou que o consumo das famílias de menores rendimentos já recuperou o nível pré-crise, enquanto o consumo da alta renda ainda está longe do patamar anterior às medidas de distanciamento social.

“A renda do trabalho das pessoas de menor poder aquisitivo caiu, mas o governo compensou com a transferência de renda do coronavoucher”, observa Luka Barbosa, economista do Itaú. “Já a alta renda segue com consumo muito abaixo do nível pré-crise. Nossa tese é a de que ocorreu uma poupança forçada entre os mais ricos por causa do isolamento social.”

O gasto mais afetado é aquele que era direcionado ao consumo de serviços, o que ajuda a explicar o reforço no consumo de bens. “O consumo da alta renda estaria bem mais alto, se não fosse o isolamento. Bens de luxo ela comprou, porque não envolve aglomeração.”

Essa também é a avaliação de Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse no Brasil. “Quando a economia volta a operar, ninguém vai consumir serviços em dobro. O consumo em restaurantes e as viagens que uma pessoa deixou de realizar, ela não vai fazer agora dobrado. Então sobrou renda para essa parcela da população, isso ajuda a explicar o consumo de luxo.”

O Itaú estima que a taxa de poupança das famílias deve chegar a 19% da renda em 2020, bem acima dos 10% a 12% registrados entre 2010 e 2018. Já para 2021, a perspectiva é que essa taxa volte a cair, para patamar em torno de 14%.

“Estamos vendo uma desaceleração do vírus, possibilidade de vacina e restrições de mobilidade sendo afrouxadas. À medida que o isolamento social vai caindo, imaginamos que as famílias vão poupar menos à frente e isso vai ajudar o consumo a continuar se expandindo.”

Barbosa destaca que isso não significa que quem poupou vai usar o dinheiro guardado para gastar no ano que vem, mas sim, que as pessoas vão poupar menos do seu novo fluxo de renda daqui para a frente.

“Há uma parte do mercado que acredita que a economia vai desacelerar quando o governo retirar os auxílios emergenciais. Nós temos uma visão diferente. Acreditamos que a economia consegue se sustentar porque a taxa de poupança das famílias vai cair, o mercado de trabalho vai se recuperar –algo que já está acontecendo desde maio–, além da recuperação global da economia, com preços de commodities em alta, e do juro baixo que fomenta o crédito.”

O economista observa que esse movimento do crédito já é visível no mercado imobiliário e de automóveis, que registram forte alta nos últimos meses e não têm nenhuma relação com o auxílio emergencial, já que ninguém compra casa ou carro com R$ 300 ou R$ 600 por mês.

Solange, do Credit Suisse, destaca que parte desse movimento do mercado imobiliário também pode ser explicada pela busca dos investidores mais abastados por diversificação, em meio à queda das taxas de juros.

“Com a taxa de juros baixa, estamos vendo o crédito imobiliário crescer fortemente. Muitas vezes, faz sentido utilizar o crédito imobiliário, porque o custo está muito baixo, e investir em ativo real. O imóvel é um ativo que diversifica a carteira, mas também o juro baixo diminui muito o custo de oportunidade de entrar em certos empreendimentos.”

Com a perda de rentabilidade da renda fixa, outras opções que têm sido procuradas são os fundos multimercados, fundos de ações e investimentos no exterior, como fundos de hedge, bolsas estrangeiras e o mercado de crédito.

Assim, os ricos brasileiros podem não estar viajando, mas o dinheiro deles está. “Há uma busca por risco tanto aqui dentro, quanto lá fora. Com o juro baixo aqui, ficou muito atrativo investir também fora do país.”

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