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Por que as novas tecnologias não estão nos tornando mais produtivos?

Inovações como a computação em nuvem e a inteligência artificial até agora não tiveram efeitos amplos sobre a economia

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Steve Lohr
The New York Times

Por muitos anos, as grandes empresas americanas acreditaram firmemente em que a computação em nuvem e a inteligência artificial alimentariam uma disparada na produtividade e, assim, na criação de riqueza. Essa convicção justificou um dilúvio de investimentos pelo setor de capital para empreendimentos, e de gastos pelas empresas. E os resultados, insistem os proponentes, não ficarão confinados a um pequeno grupo de gigantes da tecnologia, mas se farão sentir em toda a economia.

Nada disso aconteceu até agora.

A produtividade, definida como o valor de bens e serviços produzidos por hora de trabalho, caiu acentuadamente no primeiro trimestre deste ano, anunciou este mês o governo dos Estados Unidos. Os números trimestrais costumam ser voláteis, mas o relatório pareceu destruir as esperanças anteriores de que uma retomada no crescimento da produtividade enfim tinha chegado, ajudada pelo investimento acelerado em tecnologias digitais durante a pandemia.

O crescimento da produtividade desde que a pandemia surgiu está agora em cerca de 1% ao ano, o que se alinha à média medíocre prevalecente desde 2010 –e fica bem abaixo do último período de melhora robusta na produtividade, entre 1996 e 2004, quando seu crescimento foi de mais de 3% ao ano.

ilustração de trabalhadores verdes em um escritório cinza
O crescimento da produtividade desde que a pandemia surgiu está agora em cerca de 1% ao ano, o que se alinha à média medíocre prevalecente desde 2010. - Timo Lenzen/The New York Times

Economias crescem não só ao adicionar mais capital e mais mão de obra. Outro ingrediente vital é a competência de um país em criar e comercializar inovação, o que torna o investimento e os trabalhadores mais produtivos.

Ganhos percentuais aparentemente pequenos em produtividade podem fazer grande diferença para a riqueza e o padrão de vida de um país, ao longo do tempo. Um avanço anual de 1% adicional na produtividade, por alguns anos –digamos até 2024–, geraria renda per capita adicional de US$ 3.500 para os americanos, estimou a consultoria McKinsey em um relatório no ano passado.

O avanço anual médio de 3,8% na produtividade, entre 1948 e 1972, foi o propulsor da prosperidade dos Estados Unidos no pós-guerra.

Desigualdade se perpetua com baixa produtividade

A produtividade não é cura para todos os males econômicos. "Mesmo que o otimismo sobre a onda atual de tecnologia digital se prove justificado, isso não significa que os benefícios seriam realmente compartilhados", disse Laura Tyson, professora da Escola Haas de Administração de Empresas, na Universidade da Califórnia em Berkeley, e presidente do Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca na presidência de Bill Clinton.

Mas uma economia menos produtiva é uma economia menor, e dotada de menos recursos para lidar com desafios sociais como a desigualdade.

O enigma atual com relação à produtividade é tema de debate vigoroso entre os economistas. Robert Gordon, economista da Universidade Northwestern, é um dos analistas mais céticos com relação à nova tecnologia.

A inteligência artificial atual, ele disse, é basicamente uma tecnologia de reconhecimento de padrões, e vasculha vastos repositórios de palavras, imagens e números. Suas façanhas, segundo Gordon, são "impressionantes, mas não transformadoras", ao contrário, por exemplo, da energia elétrica e do motor de combustão interna.

Erik Brynjolfsson, diretor do Laboratório de Economia Digital da Universidade Stanford, é o líder no campo dos otimistas. Ele confessa se sentir um tanto desapontado por a elevação da produtividade ainda não ter se confirmado, mas está convencido de que é só questão de tempo.

"Há mudanças reais acontecendo. Um maremoto de transformação está em curso", disse Brynjolfsson. "Estamos vendo mais e mais provas concretas".

Provavelmente vai demorar anos para que surjam respostas definitivas no debate quanto à produtividade. Brynjolfsson e Gordon fizeram uma "aposta longa" no ano passado, da qual o vencedor será decidido em 2029. Mas estudos em nível setorial e de empresas individuais, aproveitando dados que derivam de resultados de recenseamento empresarial e anúncios de emprego online, demonstram o padrão de difusão das tecnologias, e os obstáculos que elas enfrentam.

Os líderes são em sua maioria empresas que investem em tecnologia digital há anos e companhias mais jovens e de alto crescimento, muitas das quais constituídas com apoio do setor de capital para empreendimentos. A computação em nuvem foi adotada amplamente, mas tecnologias mais avançadas, como aplicações de inteligência artificial, ainda não.

A adoção limitada, dizem alguns especialistas, não é tão surpreendente, a esta altura, se considerarmos que três quartos das empresas americanas são pequenas, com menos de 10 trabalhadores.

amplo salão com mesas de madeira e cadeiras, com pessoas sentadas
Loja da varejista de carros usados CarMax, nos EUA: empresa afirma observar resultados encorajadores com uso de inteligência artificial no call center. - Matt Eich/The New York Times

Revolução no teleatendimento

Na Anthem, uma empresa de seguro-saúde cujos planos cobrem mais de 45 milhões de clientes, cerca de 75% das perguntas dos consumidores são respondidas por meio de canais digitais, agora, entre os quais um portal na web, um app para celulares e software de reconhecimento de voz. Três anos atrás, a fatia do atendimento digital era de cerca de 30%.

A tecnologia de resposta a perguntas para ajudar pessoas em tarefas básicas como verificar a situação de um pedido de reembolso, pagar uma mensalidade ou encontrar um médico, é acionada parcialmente por inteligência artificial.

A automação digital eliminou 10 milhões de telefonemas que os call centers da Anthem teriam de atender, estimou Rajeev Ronanki, presidente de plataformas digitais da empresa.

A Anthem, que no mês que vem mudará de nome para Elevance Health, não reduziu sua equipe de atendimento ao cliente. Mas o papel dos trabalhadores que fazem parte dela e a maneira pela qual o desempenho deles é avaliado mudou. O indicador tradicional de desempenho dos call centers é o "tempo de atendimento de chamada", e quanto menos tempo, melhor.

A Anthem agora quer que suas equipes resolvam os problemas dos clientes com um telefonema só, sempre que possível, em lugar de repassá-los a outro departamento.

Muitos dos atendentes nos call centers da empresa receberam treinamento adicional para se tornarem o que a empresa define como "navegadores de atendimento". Os indicadores quanto ao desempenho deles agora incluem questões resolvidas e pesquisas de satisfação dos consumidores.

Sob esse conjunto mais amplo de indicadores, disse Ronanki, os atendentes da empresa se tornaram entre 30% e 40% mais produtivos. Adicionar capacitações e redesenhar o trabalho, ele disse, é tão importante quanto melhorar a tecnologia.

"Construir a capacidade técnica é só o começo", disse Ronanki.

Tradução de Paulo Migliacci

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