8 em 10 municípios grandes estão irregulares para receber emenda de relator, diz estudo

Para destravar o dinheiro, algumas prefeituras recorrem ao Judiciário ou então pagam a primeira parcela da dívida

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Brasília

A cada dez municípios brasileiros com mais de 50 mil habitantes, oito têm algum tipo de restrição que impediria o recebimento de emendas de relator, que são distribuídas por deputados e senadores com base em critérios políticos.

Os municípios ficam proibidos de receber essa verba quando estão em situação de inadimplência, principalmente em relação ao pagamento de precatórios e Previdência. As únicas exceções para a regra são emendas cujos recursos são transmitidos no âmbito de fundos federais para locais, em áreas como saúde, educação e assistência social.

Um estudo do Inop (Instituto Nacional de Orçamento Público) mostrou que 82% (497) dos municípios com mais de 50 mil habitantes estavam inadimplentes no final de abril. Em São Paulo, 94 dos 123 municípios desse porte tinham irregularidades no CAUC (Sistema de Informações sobre Requisitos Fiscais), de acordo com o instituto. No Rio de Janeiro, a situação é ainda mais complicada: 34 de 37 estavam inadimplentes.

A emenda de relator é um mecanismo criado pelo Congresso que possibilita o envio de recurso federal para os redutos dos parlamentares sem que haja transparência sobre o processo de liberação da verba.

Esse tipo de emenda passou a ser usado como uma poderosa ferramenta de cooptação política do Planalto com o Legislativo. A liberação dessa verba é controlada pela cúpula da Câmara e do Senado.

Além disso, a emenda de relator se tornou um dos principais instrumentos de negociação com o Congresso Nacional durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que usou o mecanismo para angariar apoio para pautas do interesse do Planalto e evitar a abertura de processos de impeachment.

No orçamento de 2022, foram reservados R$ 16,5 bilhões em emendas de relator.

A consulta do Inop nas bases de dados sobre inadimplência foi realizada no final de abril deste ano.

As emendas enviadas às prefeituras envolvem recursos para compra de equipamentos, ajuda à agricultura familiar, asfaltamento de ruas e reforma de praças e quadras esportivas, entre outros.

Para destravar o dinheiro quando estão inadimplentes, algumas prefeituras recorrem ao Judiciário ou então pagam uma parcela da dívida.

A prefeita de Buritinópolis (GO), Ana Paula Soares Dourado, disse já ter entrado com uma liminar para conseguir receber emendas de relator. No entanto, ela não quis detalhar os valores e as emendas.

"Entramos com uma liminar, mas não houve retorno. O que a gente fez no município foi regularizar a situação no CAUC", disse a prefeita, que administra uma cidade com 3.300 habitantes.

As emendas de relator seguem as mesmas regras de transferências voluntárias do orçamento discricionário de ministério. Somente as emendas individuais e de bancada têm o pagamento obrigatório estabelecida na Constituição, independentemente de adimplência do ente federado.

As condições de regularidade para transferência de emendas variam conforme o tamanho do município.

Municípios com menos de 50 mil habitantes devem estar em dia com Previdência e precatórios. Estão nessa situação 33,5% (1.661) das cidades. No entanto, a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) deste ano e de 2023 dispensou a necessidade de adimplência para municípios desse porte receberem os recursos.

As regras são mais rígidas para municípios com população superior a 50 mil habitantes. Eles precisam estar regularizados no CAUC, sistema que abrange a Certidão Previdenciária e dos precatórios, além de outros itens.

O serviço disponibiliza informações sobre o cumprimento de requisitos fiscais necessários para entes federativos, órgãos, entidades e organizações da sociedade civil poderem celebrar instrumentos de transferência de recursos do governo federal.

Os cálculos preliminares indicam que, no próximo ano, os recursos para as emendas de relator devem somar cerca de R$ 19 bilhões no Orçamento. Esse valor, no entanto, só deve ser definido na LOA (Lei Orçamentária Anual), a ser discutida neste segundo semestre.

Na LDO de 2023, houve uma tentativa de tornar o pagamento dessas emendas obrigatória. O artigo que determinava a execução dessas emendas tinha apoio de líderes do centrão e havia sido articulado diante do cenário de favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na corrida presidencial.

​Com reação do presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no entanto, deputados e senadores recuaram e decidiram retirar a impositividade das diretrizes orçamentárias do próximo ano.

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