Lula mira mulheres endividadas e desenha programa para renegociar débitos com luz e água

Integrantes da campanha querem levar programa à TV e testam nome 'Desenrola'

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Brasília

A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) elabora um programa específico para viabilizar a renegociação de dívidas de famílias de baixa renda e parcela da classe média.

O esboço atual prevê a repactuação de débitos fora do sistema bancário, como contas de luz, água e alimentos. O público planejado são famílias que recebem até três salários mínimos (o equivalente hoje a R$ 3.636).

A ideia é debater o modelo do programa com o sistema financeiro e fazer parcerias com o Serasa e o SPC. A iniciativa deve ser levada à propaganda do candidato na televisão em algum momento da campanha.

O nome "Desenrola" está sendo testado pela equipe de comunicação de Lula por meio de pesquisas, mas o martelo ainda será batido pela equipe da campanha e pelo ex-presidente. Os detalhes da proposta ainda estão em elaboração.

O candidato a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em entrevista ao Jornal Nacional. - Reprodução

Lula introduziu o tema em entrevista ao Jornal Nacional na noite de quinta-feira (25) e deu uma ideia do desenho.

"Nós temos quase 70% das famílias brasileiras endividadas, e a grande maioria delas é mulher, 22% endividadas porque não pode pagar a conta de água, a conta de luz, a conta do gás. Nós vamos negociar essa dívida. Pode ficar certo que nós vamos negociar com o setor privado e com o sistema financeiro", disse o ex-presidente.

Caso o ex-presidente compareça ao debate promovido em pool por Folha, UOL e TVs Bandeirantes e Cultura, no domingo (28), há a expectativa de que ele apresente mais detalhes da proposta.

Integrantes da campanha de Lula esperam acenar para dois públicos importantes com a proposta. Um deles são as mulheres, parcela mais endividada da população.

De quebra, a equipe avalia ser possível alcançar eleitores de Ciro Gomes (PDT), que está em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto. O pedetista mantém em seu programa uma proposta apresentada na campanha de 2018 para tirar 66 milhões de brasileiros do SPC.

Pesquisa divulgada neste mês pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) mostra que o endividamento e a inadimplência das famílias brasileiras voltaram a subir e bateram recorde em julho.

Segundo o levantamento, 78% das famílias brasileiras estão endividadas, e 29% estão com contas atrasadas. Os números são os maiores desde o início da pesquisa, em 2010.

A pesquisa mostra ainda que as mulheres não só têm o maior nível de endividamento, mas também têm visto esse patamar aumentar nos últimos meses.

Segundo a CNC, 80,6% do público feminino relatam, em julho, ter dívidas entre cartão de crédito, cheque especial, crédito pessoal ou consignado, carnês, financiamento de carro ou imóvel, ou outros débitos. Em junho, esse porcentual era de 80,1%.

Entre os homens, a fatia dos endividados é um pouco menor, embora também tenha aumentado na passagem do mês. O porcentual saiu de 76,5% em junho para 77,5% em julho.

Antes da entrevista de Lula ao Jornal Nacional, o economista Guilherme Mello, coordenador do NAPP (Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas) Economia da Fundação Perseu Abramo e que tem colaborado para a elaboração do programa do PT, disse à Folha que o nível elevado de endividamento das famílias é um empecilho para a reativação do consumo, considerado um motor para a geração de renda.

"É um tema que certamente vai aparecer num debate em breve, mas ainda não temos ele fechado", disse Mello, sem dar detalhes da medida.

"O importante é que esse seja um problema a ser enfrentado. É evidente que, com famílias e pequenas empresas profundamente endividadas, há uma dificuldade muito grande de reativar o mercado de consumo e de geração de renda. Toda renda que entra sai para pagamento de dívida", afirmou.

O economista pondera que a dívida das famílias não está concentrada em um único tipo de débito, o que vai demandar uma discussão de política para cada um dos segmentos. "Tem dívidas das pessoas com os bancos, em cartão de crédito, cheque especial, crédito pessoal. Tem dívidas das pessoas com empresas públicas de energia, em lojas", disse.

Lula não é o único a prometer uma solução para o endividamento das famílias brasileiras. Também em entrevista ao Jornal Nacional, Ciro Gomes renovou a promessa feita há quatro anos e propôs criar uma "lei antiganância", por meio da qual o cidadão que pagasse o equivalente a duas vezes sua dívida teria seu débito saldado.

Na prática, a proposta poderia significar um tabelamento dos juros cobrados nas operações de crédito, embora Ciro não tenha detalhado sua ideia, apresentada no minuto final da sabatina.

Nesta sexta-feira (26), em uma publicação no Twitter, o pedetista acusou Lula de "copiar" a proposta de sua campanha de limpar o nome dos brasileiros do SPC/Serasa. Em 2018, o Ciro propôs uma renegociação de dívidas de famílias e empresas, com taxas de juros menores e prazos mais longos de pagamento. À época, o programa chegou a ser batizado de Nome Limpo.

Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou um perdão de até 99% das dívidas de estudantes no Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).

O texto priorizou estudantes inscritos no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal) ou beneficiados pelo auxílio emergencial na contemplação do perdão máximo do valor devido. À época da proposta, em fevereiro, o ministro Paulo Guedes (Economia) estimou que 1,2 milhão de pessoas poderiam ser beneficiadas com a renegociação de até R$ 38,6 bilhões em débitos.

A medida foi citada pela primeira vez por Bolsonaro em uma transmissão nas redes sociais em 9 de dezembro de 2021. Uma semana antes, Lula havia dito no podcast Podpah que era preciso "anistiar os meninos" do Fies.

Além do perdão aos estudantes, o atual governo apostou em uma nova rodada de saques extraordinários do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) para ajudar as famílias no pagamento de dívidas.

De acordo com a última pesquisa Datafolha, Lula segue em primeiro lugar na disputa à Presidência, com 47% das intenções no primeiro turno, e Bolsonaro permanece em segundo lugar, com 32%.

O ex-ministro Ciro Gomes (PDT) vem na sequência, com 7%. A senadora Simone Tebet (MDB) aparece em quarto lugar, com 2%.

Entre quem declara voto em Ciro, porém, 64% ainda podem mudar de candidato, e 35% se dizem plenamente decididos.

Ouça o Sufrágio, novo podcast da Folha:

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