Descrição de chapéu Folhajus

Volkswagen diz ao MPT que não é responsável por trabalho escravo em fazenda no Brasil

Por escrito, montadora argumenta que caso é antigo; procuradores querem compensação para 14 trabalhadores

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São Paulo

A Volkswagen disse ao Ministério Público do Trabalho, por escrito, que entende não ter responsabilidade pela ocorrência de trabalho escravo e outras violações dos direitos humanos em uma fazenda da qual era dona no sul do Pará durante as décadas de 1970 e 1980, quando o Brasil ainda vivia sob a ditadura militar (1964-1985).

O MPT investiga a empresa pela ocorrência de trabalho escravo na fazenda Vale do Rio Cristalino, que era conhecida como Fazenda Volkswagen, localizada no município de Santana do Araguaia.

A reunião com a Volkswagen ocorreu nesta quinta-feira (29), em São Paulo, e durou pouco mais de duas horas.

Segundo o procurador Rafael Garcia, coordenador do grupo especial que investiga o caso, os representantes da montadora de origem alemã argumentaram que a ocorrência é antiga e que havia envolvimento de outras pessoas no que acontecia na propriedade.

O diretor jurídico da Volkswagen para a América Latina, Marcelo Quio Ribeiro Nascimento, e os três advogados da companhia que participaram da reunião não quiseram comentar.

Fábrica da Volks, no ABC paulista, em 1970; linha de produção do Fusca a primeira da montadora fora da Alemanha - Divulgação/Volkswagen do Brasil

"O Ministério Público do Trabalho mais uma vez reforçou a gravidade dos fatos ocorridos dentro da fazenda. As violações graves de direitos humanos a que os trabalhadores foram submetidos, da servidão por dívida à violência contundente de vigilância armada, as condições absolutamente precárias a que eram submetidos", afirma Garcia.

Para o MPT, não há dúvidas de que a empresa sabia do que acontecia em sua propriedade.

"As provas que existem nos autos, e isso foi tratado hoje de maneira muito contundente, de que a Volkswagen sempre teve, que a gerência da fazenda sempre teve domínio do que acontecia no espaço físico da fazenda", diz o procurador do Trabalho.

Um dos indícios, segundo o MPT, é que o controle das atividades dos trabalhadores na abertura de pastos e de derrubada de floresta não teria como acontecer sem que a empresa entrasse em contato com as condições de moradia e trabalho desses funcionários.

Representantes da Volkswagen, de costas, se reuniram nesta quinta (29), com procuradores do Ministério Público do Trabalho que investigam trabalho escravo - Carla Carniel/Reuters

Havia ainda a vigilância armada. "Seria impossível sem a conivência ou autorização da gerência da fazenda."

Uma nova audiência ficou marcada para o dia 29 de novembro. A expectativa do MPT é chegar a um acordo de reparação individual a 14 trabalhadores identificados como vítimas, além de uma compensação coletiva.

Em acordos e condenações desse tipo, os procuradores costumam incluir o dano moral coletivo e a compensação financeira prevista pode ir para um fundo ou entidade da sociedade civil.

A judicialização do caso não está descartada, mas, segundo Garcia, não está em discussão no momento. Apesar de não ter havido avanço rumo a um acordo, o coordenador da investigação diz que a montadora se mantém aberta ao diálogo.

Os próximos procedimentos relacionados à apuração do caso deverão ocorrer sob sigilo, a pedido da defesa da Volkswagen.

A audiência desta quinta foi o segundo encontro de representantes da montadora com o grupo de atuação especial criado pelo MPT para investigar o caso. A primeira audiência foi em junho, em Brasília (DF).

Quando o caso se tornou público, a Volkswagen disse que levava o assunto "muito a sério".

Em 2020, referente a outro caso, a Volkswagen do Brasil se comprometeu a destinar R$ 36,3 milhões a ex-funcionários da empresa que foram presos, perseguidos ou torturados durante a ditadura militar.

O pagamento acontece com a conclusão de três inquéritos civis no Ministério Público Federal, no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público do Trabalho.

Entenda o caso

O Ministério Público do Trabalho recebeu em 2019 documentação relatando o que os procuradores consideraram ser " situações de submissão de trabalhadores a condições degradantes de trabalho".

O material foi organizado pelo padre Ricardo Rezende Figueira, que foi coordenador da CPT (Comissão Pastoral da Terra) para região de Araguaia e Tocantins.

Após três anos analisando o dossiê que Figueira montou, o MPT entendeu que existiam fundamentos para iniciar uma investigação. O padre é autor de um livro sobre trabalho escravo.

A Fazenda Volkswagen tinha, segundo o MPT, mais de 139 mil hectares. A vegetação nativa foi transformada em área de pasto. Para fazer esse trabalho, os gatos (como são chamados os aliciadores de mão de obra escrava) recrutavam trabalhadores em pequenos povoados em Mato Grosso, Maranhão e Goiás, de acordo com o MPT.

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