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Suspeição de juíza coloca em risco investigação de desvio de R$ 5 bi

Magistrada que recebeu o inquérito da operação Rosa dos Ventos foi considerada parcial por ter relação prévia com réus

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São Paulo

Uma decisão da 5ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) está ameaçando o inquérito nascido da operação Rosa dos Ventos, que investigou um esquema de sonegação de impostos por distribuidoras de combustíveis em São Paulo.

Segundo a investigação, o esquema usava distribuidoras de fachada e deixou um rombo de R$ 5 bilhões em multas não pagas e impostos sonegados. Agora, todas as ações penais iniciadas a partir do inquérito estão sob risco porque a juíza que recebeu o caso na Justiça Federal foi considerada suspeita.

Valdirene Ribeiro de Souza Falcão é titular da 9ª Vara Criminal de Campinas (SP) e já tinha sido considerada suspeita –quando o julgador é avaliado como incapaz de mater a imparcialidade– pelo TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) porque conhecia dois dos denunciados pelo MPF (Ministério Público Federal), que investigou o caso em conjunto com Receita Federal e Polícia Federal.

Empresas de fachada era usadas para sonegar impostos e lavar dinheiro a partir de fraudes - Rivaldo Gomes-23.jun.22/Folhapress

Segundo o pedido apresentado pela defesa de Claudia Martins Borba Rossi e Miceno Rossi Neto, as famílias do casal e da juíza foram amigas até 2009, quando romperam após um desentendimento. Ele era um dos principais alvos da operação Rosa do Ventos.

O TRF-3 concluiu que Valdirene Falcão deveria ser considerada suspeita a partir da audiência de custódia resultante do inquérito. A defesa do casal recorreu ao STJ e, no dia 27 de setembro, a 5ª Turma concluiu o julgamento que, por maioria, entendeu que ela não poderia ter atuado no caso desde o início, pois o desentendimento entre as famílias é anterior ao início do inquérito.

Em nota, a juíza diz que "todas as suas decisões foram tomadas com fundamento nas provas e representações da Polícia Federal, Receita Federal e Ministério Público Federal constantes nos autos, e que respeitará e cumprirá as decisões dos tribunais superiores".

O Ministério Público Federal em São Paulo diz que ainda aguarda o trânsito em julgado (o encerramento) da decisão do STJ para decidir o que fazer.

O advogado Aury Lopes Jr, que representou o casal, afirma que aguarda a publicação do acórdão para pedir a anulação de sete ações penais derivadas do inquérito e uma outra que o cita na sentença. Miceno Rossi chegou a ficar 20 dias preso e saiu sob fiança de R$ 187 mil. A mulher, Claudia, teve prisão preventiva decretada, cumprida em casa, e o passaporte retido.

Nem todas as ações iniciadas a partir da operação Rosa dos Ventos passaram pela juíza da 9ª Vara de Campinas, porém, segundo Lopes Jr, os atos do inquérito, como quebras de sigilo telefônico e telemático, poderão ser anulados a partir da confirmação da suspeição.

"Vamos ter um efeito dominó e mesmo ações que não derivam diretamente do inquérito, mas o citam, também serão afetadas."

Ao STJ, o advogado do casal disse que a juíza viu no processo a chance de se vingar por um assunto particular envolvendo as duas famílias. Para ele, a juíza se excedeu em pelo menos três situações, o que demonstraria a parcialidade dela na condução do processo.

A primeira delas, afirma Lopes, foi na distribuição do inquérito na Justiça Federal de Campinas. Pela numeração do relatório, ele deveria ser encaminhado ao juiz substituto.

Ainda segundo o advogado, Valdirene Falcão quebrou o sigilo de dados de uma outra empresa da qual Rossi Neto era dono, mas que não era alvo da investigação.

"Ela pediu a quebra de sigilo bancário retroativo a 20 anos, de sigilo telemático desde a criação dos emails, tudo muito excessivo", afirma.

A terceira seria a fiança determinada, de R$ 10 milhões —depois foi reduzida, no STF, a R$ 187 mil.

A defesa do casal fez, no decorrer do processo, uma reclamação disciplinar ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça), mas o pedido foi negado. Agora, o advogado avalia fazer nova reclamação.

Entenda o que foi a operação Rosa dos Ventos

A operação foi realizada em duas fases, uma em 2017, outra em 2018. Participaram MPF, Polícia Federal e Receita Federal.

Segundo a investigação, Miceno Rossi Neto montou um grupo de empresas que se beneficiava da legislação da tributação do álcool combustível para fraudar o recolhimento de impostos. O grupo, diz o MPF, sonegava Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), PIS/Pasep e Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).

Miceno Rossi Neto foi denunciado ainda na primeira etapa da operação, com mais duas pessoas, que seriam seus "testas de ferro", por sonegação de impostos. Segundo o MPF, entre 2008 e 2011, ele usou a empresa Euro Petróleo como fachada para deixar de pagar impostos.

A investigação apontou uma dívida de R$ 692,9 milhões, em 2017, considerando juros e multas. Depois, em 2018, a esposa de Rossi Neto, Claudia, e outro "testa de ferro" também foram denunciados. Nesse caso, a investigação concluía que eles tinham sonegado R$ 17,7 milhões em 2011 e 2021, gerando uma dívida de R$ 48 milhões com o Fisco.

Em uma terceira denúncia, o MPF acusou o irmão de Rossi Neto, Adriano, que por meio de testas de ferro usariam a empresa Tux Distribuidora de Combustíveis para sonegar R$ 64 milhões em PIS e Cofins entre 2005 e 2008. Em 2018, a dívida atualizada era de R$ 318 milhões.

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