Varejo têxtil tenta se livrar de estigma de trabalho escravo

Programa da associação do setor fiscaliza anualmente cadeia de fornecedores

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São Paulo

Casos de oficinas de costura com trabalhadores em regime análogo ao de escravo exigiram do setor um controle mais firme da cadeia produtiva e já garantem que 100% dos fornecedores das 115 maiores marcas do setor são auditados pelo menos uma vez ao ano.

Apesar do progresso, segundo a Abvtex (Associação Brasileira do Varejo Têxtil), ainda falta chegar à parte informal da indústria. A associação calcula que 35% de tudo o que se comercializa de vestuário no Brasil seja produzido de maneira informal ou irregular.

"Na região central de São Paulo há uma comunidade muito grande de imigrantes e que muitas vezes está sendo explorada."

A Abvtex representa nomes como Arezzo&CO (Anacapri, Reserva, Arezzo, Alexandre Birman), C&A, Centauro, Riachuelo, Dafiti, Malwee, Marisa, Renner, e os grupos Soma (Animale, Farm, Hering, Cris Barros, NV) e InBrands (Ellus, Richards, Bobstore, VR, Herchcovitch;Alexandre e Salinas), que se mobilizam para garantir que os funcionários estejam regularizados, tenham seus direitos trabalhistas e de liberdade de associação respeitados e recebam EPIs (equipamentos de proteção individual).

Loja de roupas em São Paulo; associadas da Abvtex dizem fiscalizar a cadeia de fornecedores para garantir respeito às leis trabalhistas - Zanone Fraissat-11.set.20/Folhapress

A lista de itens da auto-fiscalização feita pela associação inclui questões sobre segurança e estrutura predial e de combate a incêndio, fornecimento de móveis ergonômicos e periodicidade de manutenção de maquinário –ao todo, são 170 itens.

Chamado de Programa Abvtex, o protocolo de conformidade iniciado em 2010 tem hoje 3.888 empresas cadastradas. Elas ficam em 620 municípios de 18 estados e empregam cerca de 425 mil pessoas. A lista é pública.

Um fornecedor que queria atender empresas associadas à Abvtex precisa solicitar à associação o ingresso no programa, e isso vale também para as subcontratadas. Em 2022, o programa recebeu da Prefeitura de São Paulo o selo de Direitos Humanos e Diversidade na categoria transversalidades.

"Ainda há esse estigma porque, no passado, algumas empresas tiveram em suas cadeias produtivas situações degradantes em terceirizadas e quarteirizadas. E a estratégia [de divulgação usada pelos órgãos de fiscalização] foi o de responsabilizar o elo mais forte", diz Edmundo Lima, diretor-executivo da Abvtex.

Nos principais polos têxteis do Brasil –ele destaca Santa Catarina e São Paulo–, a indústria tem reforçado mecanismos de monitoramento para cumprir todos os requisitos legais e, mais recentemente, também dos demais parâmetros da agenda ESG (sigla para práticas sociais, ambientais e de governança), como o atendimento a questões ambientais e combate a assédio moral e sexual.

Segundo o Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, desde 2010, 494 trabalhadores foram resgatados pela fiscalização em confecções de peças de vestuário. Em 2022, foram 39 resgatados nessas empresas, entre os 2.575 totais.

"É um tema importante e por isso a gente começou a criar o programa [de auditoria]. Os varejistas desconheciam todos esses elos de contratação e subcontratação, tudo isso foi sendo uma evolução."

O diretor-executivo da Abvtex diz também que a partir de 2023 o programa quer levar a auditoria para o demais elos da cadeia e incluir no monitoramento tecelagens e fiações.

Para Edmundo Lima, as grandes marcas são tímidas em relação às ações que promovem para garantir a conformidade no setor. Há pouco mais de um ano, lançaram o movimento ModaComVerso, em um esforço do setor para dar mais visibilidade a boas práticas trabalhistas e de produção.

É um esforço também de transformar esses investimentos feitos pelo varejo em decisão de consumo. "Queremos que na decisão de compra, o consumidor privilegie quem realmente assume esses compromissos, que ele também atue de maneira responsável", diz o executivo.

Casos de trabalho escravo tornados públicos nos últimos anos envolviam confecções que produziam para grifes como Animale, M.Officer e Le Lis Blanc.

Os casos envolviam terceirização e até quarteirização dos serviços. Uma confecção contratada por uma marca levava parte da produção a uma segunda empresa. No ramo têxtil de produção de vestuário, é comum que cada fase do processo fique com uma companhia diferente.

Os cortes são feitos em local, a costura em outro. Às vezes, mesmo o acabamento vai para outra oficina. Há também uma especialização, de modo que nem toda confecção trabalha com os mesmos tecidos e acabamentos, pulverizando a cadeia em diversos pequenos fornecedores.

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