Haddad diz que governo vai 'tirar granada do bolso' dos servidores com reajuste salarial

Executivo quer elevar remuneração do funcionalismo ainda neste ano, mas discute se incluirá militares

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse nesta terça-feira (7) que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai "tirar a granada do bolso" dos servidores públicos com a negociação de reajustes salariais para as categorias.

A atual administração reabriu a mesa permanente de negociação com o funcionalismo, que já havia funcionado em gestões anteriores do PT e ficará sob a condução da ministra de Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck.

A intenção é conceder um reajuste salarial ainda neste ano, após pelo menos quatro anos de congelamento. A maior parte dos servidores está há seis anos sem reposição salarial.

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos) em cerimônia no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 05.jan.2022/Folhapress

"O objetivo aqui é tirar a granada do bolso de vocês", disse Haddad durante solenidade de reabertura da mesa. O evento conta com representantes de 80 entidades sindicais, além de ministros do governo.

A citação à granada faz referência a uma declaração do ex-ministro da Economia Paulo Guedes em uma reunião ministerial de 22 de abril de 2020. O vídeo do encontro foi divulgado por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal) a pedido do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que acusava o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de tentar interferir na Polícia Federal.

No vídeo, Guedes aparece celebrando uma lei aprovada no auge da pandemia de Covid-19, que autorizava um socorro a estados e municípios, mas tinha como contrapartida o congelamento dos reajustes.

"Todo mundo está achando que estão distraídos, abraçaram a gente, enrolaram com a gente. Nós já botamos a granada no bolso do inimigo. Dois anos sem aumento de salário", disse Guedes à época.

Nesta terça, Haddad criticou diretamente a declaração de seu antecessor. "Aquela cena no Palácio do Planalto é uma das cenas mais vergonhosas que já vi na vida. Como alguém que está na chefia de um ministério tão importante diz que serviço público é inimigo a ser destruído, como se fosse inimigo de guerra?", afirmou.

A ministra da Gestão endossou as críticas ao ex-ministro da Economia. "Este governo jamais considerará os servidores um parasita", em referência a outra declaração feita por Guedes. Em fevereiro de 2020, ele comparou servidores públicos a parasitas, que estão matando o hospedeiro (o governo) ao receberem reajustes automáticos enquanto estados estão quebrados.

"Como disse o ministro Haddad, não tem granada nenhuma", complementou. "Acabou essa visão que os servidores não são essenciais. Ao contrário, os servidores são essenciais."

O Orçamento de 2023 já reserva R$ 11,6 bilhões para a ampliação da remuneração dos funcionários públicos ativos, inativos e pensionistas do Poder Executivo.

O maior impasse no momento é se esse reajuste vai contemplar ou não os militares, categoria que obteve maiores benefícios durante a gestão Bolsonaro.

A intenção do novo governo é aplicar um percentual linear para as categorias. No ano passado, membros da gestão Bolsonaro estimaram que o valor previsto no Orçamento seria suficiente para um aumento de 4,85% a partir de janeiro. Como o reajuste a ser negociado para este ano valerá por um número menor de meses, será possível ampliar esse percentual.

Se os militares forem incluídos, porém, a reposição será mais tímida para as demais categorias, dada a necessidade de manter o gasto já previsto no Orçamento.

Por isso, há uma discussão sobre a exclusão dos militares da negociação. Há, porém, um risco político envolvido nessa opção, uma vez que a relação da atual administração com as Forças Armadas já começou sob desgaste.

Em janeiro, Lula demitiu o então comandante do Exército, general Júlio Cesar de Arruda, em meio a uma crise de confiança aberta após os ataques do dia 8 de janeiro, em Brasília.

O cálculo de membros do atual governo é que os militares foram contemplados por aumentos e benesses na gestão anterior, enquanto os demais servidores ficaram com salários congelados.

Em 2019, o governo Bolsonaro propôs e obteve aprovação de uma lei que modificou as regras de aposentadoria e pensão dos militares, mas estipulou uma série de aumentos no soldo da categoria. A lei também ampliou os valores do adicional de habilitação (pago conforme a categoria de cursos feitos pelo militar), entre outras gratificações.

Enquanto isso, cerca de 1 milhão de servidores ativos, aposentados e pensionistas estão com a remuneração congelada desde 1º de janeiro de 2017, quando foi concedida a última parcela de aumento.

São servidores de órgãos como Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Funai (Fundação Nacional do Índio), Abin (Agência Brasileira de Inteligência), além de carreiras médicas e ligadas à Previdência.

As categorias desse grupo tiveram um aumento médio de 10,8%, proposto ainda no governo Dilma Rousseff (PT) e que foi parcelado em dois anos (2016 e 2017).

Outros 253 mil servidores tiveram o último reajuste aplicado em 1º de janeiro de 2019. Foi a quarta parcela de um aumento total médio de 27,9%. Nesse segundo grupo estão carreiras de Estado, como a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal.

Os servidores do Executivo ampliaram a cobrança por reposição salarial após a aprovação, no final de 2022, de aumentos salariais para ministros do STF, além do presidente da República, ministros e parlamentares. Com o reajuste, eles passarão a ter remuneração mensal de R$ 41,7 mil a partir de 1º de abril deste ano, chegando a R$ 46,4 mil a partir de 1º de fevereiro de 2025.

Como há uma defasagem maior nas carreiras da base do funcionalismo, que já têm remuneração menor, há uma possibilidade em estudo de promover dois tipos de reajuste linear: um maior para essas categorias que tiveram o último aumento em 2017, e outro menor para as demais, que tiveram o salário atualizado até 2019.

A expectativa é que as negociações avancem nos próximos meses. Nas últimas semanas, chefes de órgãos já têm buscado o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, responsável pela política de pessoal, para defender a reposição salarial aos seus servidores. Uma das demandas é que o reajuste seja feito por MP (medida provisória), para ter validade imediata.

Em um aceno de boa vontade, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), anunciou a liberação de R$ 350 milhões para o pagamento de direitos trabalhistas de servidores, referentes a anos anteriores. O desembolso deve beneficiar cerca de 10 mil funcionários.

Na cerimônia, Dweck defendeu o reajuste aos servidores do Executivo. "De fato, as carreiras dos outros Poderes tiveram reajuste aprovado já no final do ano passado, exceto o Poder Executivo. É uma injustiça com os trabalhadores do Executivo federal, e a gente pretende anunciar ainda este mês, se possível, se tiver acordo com eles, usando o espaço orçamentário que existe."

Participaram da solenidade de reabertura da mesa os ministros Rui Costa (Casa Civil), Márcio Macêdo (Secretaria-Geral), Luiz Marinho (Trabalho), Carlos Lupi (Previdência), Camilo Santana (Educação), além de Haddad, Tebet e Dweck.

A ministra da Gestão anunciou ainda a criação de um grupo de trabalho, que, na prática, suspende decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que transferia as aposentadorias dos servidores públicos para o INSS.

"Hoje em dia, nos RHs dos ministérios, está bastante descentralizado o processo de pedir aposentadoria. É feita a checagem de documentos e é concedida. Existia uma previsão de uma unificação disso. Só que o que o governo anterior fez foi unificar e mandar para o INSS, que não tem competência nenhuma com os servidores públicos federais do regime próprio", explicou a ministra.

"Passou para um órgão que está desfalcado, que nunca trabalhou nesta área e na verdade a gente entende que pode ter sido uma tentativa de reduzir o ritmo de concessão de aposentadorias para os servidores. Esse grupo vai avaliar se era razoável essa decisão, se não era, se for unificar onde será unificado."

A ministra afirmou que o grupo deve ter alguma solução em até 90 dias.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.