Adolescentes são encontrados em condição análoga à escravidão em fazendas de arroz, dizem autoridades

Operação em Uruguaiana (RS) resgatou 56 pessoas, entre elas 10 com idades de 14 a 17 anos, segundo investigação

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Rio de Janeiro

Uma operação conjunta na tarde de sexta-feira (10) resgatou 56 trabalhadores que estariam submetidos a condições análogas à escravidão em duas fazendas de arroz no interior do Rio Grande do Sul, de acordo com autoridades.

O caso ocorreu no município de Uruguaiana (a cerca de 630 km de Porto Alegre), na fronteira com a Argentina.

O grupo resgatado era formado por homens e tinha dez adolescentes com idades entre 14 e 17 anos, segundo a PF (Polícia Federal) e o MPT-RS (Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul). Os dois órgãos atuaram na ação de resgate.

Na reta final de fevereiro, o Rio Grande do Sul registrou outro caso de trabalho considerado análogo à escravidão. Na ocasião, uma operação resgatou pessoas contratadas para a colheita de uva em Bento Gonçalves (a cerca de 120 km de Porto Alegre), na região da serra gaúcha.

Uma operação conjunta entre Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho e Gerência Regional do Trabalho resgatou, na tarde desta sexta-feira (10), 56 trabalhadores em condições análogas à escravidão em duas fazendas de arroz no interior de Uruguaiana (RS). Segundo dados da fiscalização do trabalho, este é o maior resgate já registrado na cidade. Os trabalhadores estavam em fazendas de arroz.
Operação foi realizada em Uruguaiana (RS) nesta sexta-feira (10) - Polícia Federal/Divulgação

De acordo com a PF e o MPT-RS, os trabalhadores encontrados nesta sexta em Uruguaiana faziam o corte manual de arroz vermelho e a aplicação de agrotóxicos sem equipamentos de proteção.

Também segundo os órgãos, eles chegavam a andar por jornadas extenuantes antes de chegarem aos locais de trabalho.

"A operação foi realizada nas estâncias Santa Adelaide e São Joaquim, em Uruguaiana, após uma denúncia informar a presença dos jovens na propriedade, em trabalho irregular e sem carteira assinada. O grupo móvel de fiscalização se dirigiu ao local e encontrou não apenas os adolescentes, mas trabalhadores adultos em situação análoga à escravidão", afirmou o MPT-RS.

A Folha não conseguiu contato com as fazendas citadas pelo órgão até a publicação deste texto.

Os trabalhadores eram da mesma região, dos municípios de Itaqui, São Borja, Alegrete e Uruguaiana. Eles teriam sido recrutados por um "gato", como é chamado o agenciador de mão de obra, que atuava na fronteira oeste do estado.

O MPT-RS e a PF afirmaram que o grupo fazia o corte manual do arroz vermelho com instrumentos "completamente inapropriados". Parte dos resgatados estaria usando apenas facas domésticas de serrinha, além de aplicar agrotóxicos com as mãos.

"Em uma das propriedades, era feita a aplicação de veneno pelo método de barra, em que dois trabalhadores aplicam o agrotóxico usando uma barra metálica perfurada conectada a latas do produto –um tipo de atividade que exige equipamentos individuais de proteção", afirmou a PF.

Os órgãos envolvidos na operação também disseram que os trabalhadores muitas vezes precisavam andar 50 minutos sob o sol até chegarem ao local de atuação.

Os resgatados afirmaram que recebiam R$ 100 por dia, mas que a alimentação e as ferramentas de trabalho eram por conta do grupo.

"Nessas condições, a comida estragava constantemente e os trabalhadores não comiam nada o dia inteiro. Se algum deles adoecesse, teria remuneração descontada", disse a PF.

O MPT-RS afirmou que, conforme os relatos recebidos, um dos menores sofreu um acidente com um facão e ficou sem movimentos de dois dedos do pé.

O homem apontado como o responsável pelo agenciamento ilícito foi preso em flagrante por redução à condição análoga à de escravo e conduzido à Polícia Federal.

Os trabalhadores devem receber de imediato três parcelas de seguro-desemprego. Os empregadores, por sua vez, devem ser notificados para assinar a carteira de trabalho dos resgatados e pagar as verbas rescisórias.

O MPT vai pleitear depois disso pagamentos de indenizações por danos morais individuais e coletivos. Os trabalhadores foram encaminhados para suas casas. Segundo dados da fiscalização do trabalho, esse é o maior resgate já registrado em Uruguaiana.

O caso gaúcho anterior, de Bento Gonçalves, veio à tona em 22 de fevereiro. Uma empresa que prestava serviço às vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton mantinha trabalhadores em condições degradantes, segundo as investigações. O grupo, formado na maioria por baianos, foi resgatado pelas autoridades.

Após a operação, as vinícolas disseram que respeitavam as leis e que se solidarizavam com os trabalhadores. Elas também assinaram na quinta-feira (9) um termo de ajustamento de conduta com o MPT-RS.

Por meio do acordo, pagarão R$ 7 milhões em indenizações. Dessa quantia, R$ 2 milhões serão repassados aos trabalhadores e R$ 5 milhões serão em multa por dano moral coletivo.

A Fênix, terceirizada apontada como responsável direta pela situação em que se encontrava o grupo resgatado em Bento, não firmou o acordo.

O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, disse na sexta que pretende tornar mais rigorosas as punições a empresas que entrarem na lista do trabalho escravo.

"Empresas que, por exemplo, têm empréstimos com BNDES, ao entrarem na lista suja, vão ter a dívida executada sumariamente. Vai ficar impedida por um tempo de tomar financiamento público e de fazer prestação de serviços públicos", afirmou.

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