Dono da Itaipava, Grupo Petrópolis entra em recuperação judicial

Cervejaria diz viver 'tempestade perfeita' com queda em vendas e receita e aumento dos juros

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São Paulo

O Grupo Petrópolis, que produz as cervejas Itaipava, Black Princess e Cacildis, entrou em recuperação judicial.

No pedido encaminhado à Justiça do Rio de Janeiro na segunda-feira (27), a companhia afirma ter dívidas em aberto estimadas em cerca de R$ 4,2 bilhões, das quais R$ 2 bilhões seriam derivadas de operações financeiras e de mercados de capitais, e R$ 2,2 bilhões com grandes fornecedores. Nessa última, haveria também operações de risco sacado.

A Petrópolis afirma não ter um passivo trabalhista relevante, nem dívidas expressivas com microempresas ou empresas de pequeno porte.

Em nota encaminhada na quarta (29), o grupo disse que seu foco principal é garantir "a manutenção da operação, a qualidade de seus produtos, o abastecimento da cadeia de distribuição e, consequentemente, sua capacidade de geração de receita, bem como honrar seus compromissos com funcionários, fornecedores e parceiros."

Linha de produção da fábrica da cerveja Itaipava em Itapissuma (PE) - Sérgio Figueirêdo-23.jul.15/Folhapress

Além da recuperação judicial, a Petrópolis também pediu a concessão de tutela cautelar para suspender pagamentos já agendados para os próximos dias e semanas, bem como a liberação imediata desses valores, e para proibir a retenção de recebíveis futuros.

Segundo número apurados na sexta (24), a cervejaria previa ter que pagar, nas próximas semanas, R$ 215,7 milhões ao banco Santander; R$ 109,3 milhões ao Fundo Siena; R$ 47,5 milhões ao Daycoval; R$ 9,2 milhões ao BMG; e R$ 1,4 milhão ao Sofisa.

O pedido de recuperação judicial foi apresentado à Justiça pelos escritórios Galdino, Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados e Salomão, Kaiuca, Abrahão, Raposo e Cotta Advogados –os dois escritórios atuam em casos da recuperação judicial da Americanas, também em andamento na Justiça do Rio.

Os representantes da Petrópolis escreveram no pedido encaminhado à Justiça na segunda que o ajuizamento urgente foi necessário porque uma parcela bullet (quando os juros são cobrados de uma vez ao fim de um contrato) de R$ 105 milhões vencia naquele dia.

"Seu inadimplemento provocara o vencimento antecipado das demais operações existentes com a casa bancária, resultando na pronta liquidação dos recursos travados na conta vinculada e tentativa de apropriação dos recebíveis do Grupo Petrópolis que irão ingressar na referida conta nas próximas semanas", diz o pedido.

A Petrópolis afirmou que sua crise de liquidez vem se agravando há cerca de 18 meses, quando registrou drástica redução de receita. De 31,2 milhões de hectolitros (1 hectolitro equivale a 100 litros) vendidos em 2020, a companhia fechou 2022 com 24,1 milhões de hectolitros comercializados, e 2021, com 26,4 milhões.

A crise, segundo a companhia, é momentânea e decorre do que a empresa considerou ser uma "tempestade perfeita", com a queda em vendas e receitas sendo acompanhada pelo aumento da taxa básica de juros, a Selic. O patamar elevado de juros tem um impacto de cerca de R$ 395 milhões ao ano no fluxo de caixa do grupo.

Até março, a necessidade de capital de giro da cervejaria já está R$ 360 milhões superior ao que foi projetado para o período e, segundo o pedido de recuperação judicial, deve chegar a R$ 580 milhões até o dia 10 de abril.

Apesar das dificuldades relatadas na solicitação, o grupo defende que as empresas são "absolutamente viáveis". A cervejaria diz ter atualmente 24 mil empregados. Em impostos, a empresa diz ter pago R$ 20,7 bilhões em tributos federais, estaduais e municipais de 2018 a 2022.

Além da Itaipava, o grupo fabrica e distribui as cervejas Petra, Cabaré , Black Princess, Crystal, Lokal, Weltenburger, Brassaria Ampolis (com os rótulos Cacildis, Biritis, Ditriguis e Forevis). O portfólio inclui também as vodcas Blue Spirit Ice, Nordka e Cabaré Ice, os energéticos TNT Energy Drink e Magneto, o refrigerante It!, o isotônico TNT Sports Drink e a água Petra.

A juíza substituta Elisabete Franco Longobardi, da 5ª Vara Empresarial do Rio, ao antecipar os efeitos da recuperação judicial, afirmou que a companhia demonstrou a urgência no pedido, uma vez que o grupo é "constituído por incontáveis empresas com grande relevância nacional".

Em janeiro de 2020, o Grupo Petrópolis tinha 15,3% do mercado de cerveja (market share) no Brasil, segundo dados da Nielsen apresentados pela empresa no pedido. Essa fatia tinha recuado para 10,6% em agosto de 2022.

A cervejaria atribui a redução a uma "pronta resposta" de empresas concorrentes, que teria segurado os preços de seus produtos "mesmo com o aumento galopante da inflação e da verdadeira explosão do custo dos insumos empregados na fabricação de cerveja". O grupo não cita o nome de seus concorrentes, mas diz que "certos players" só conseguiram manter os preços de seus produtos graças ao que chamaram de "planejamento tributário abusivo."

A dona da Itaipava diz não ter conseguido mais segurar as contas e relatou ter precisado aumentar os preços de seus produtos no dia 1º de março. "Como consequência, houve retração nas vendas, na medida em que seus consumidores tradicionais, nesse primeiro momento, indispostos a pagar os preços reajustados, acabaram migrando para outras marcas", afirma a empresa no pedido.

A administração judicial do processo da Petrópolis caberá à Preserva-Ação Administração Judicial e aos escritório de advocacia Zveiter, ambos do Rio de Janeiro e que também atuam no caso da Americanas.

Walter Faria trabalhou na Schin e chegou a ser preso na Lava Jato

Os advogados do Grupo Petrópolis dedicaram parte do pedido de recuperação judicial encaminhado à Justiça na segunda para apresentar a história da companhia e de seu proprietário, Walter Faria.

Na década de 1990, ele trabalhou na área de distribuição da cervejaria Schincariol. Em 1998, comprou a Cervejaria Petrópolis, que era, na época, uma pequena planta industrial em Itaipava, na cidade de mesmo nome.

Nos anos seguintes, outros rótulos e unidades industriais foram sendo incorporados ao grupo, como a Crystal, em Boituva (SP), em 1999, e a Lokal, em Teresópolis (RJ), em 2007. O grupo tem fábricas em Rondonólis (MT), Alagoinhas (BA), Itapissuma (PE), Uberaba (MG) e Bragança Paulista (SP).

Em 2019, Walter Faria ocupou o noticiário por motivo alheio à produção de cervejas. Segundo investigação da operação Lava Jato, ele teria intermediado o repasse de propina em contratos da Petrobras.

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