Descrição de chapéu Governo Lula Agrofolha

Em aceno ao agro, Lula volta a Mato Grosso após 11 anos

Presidente se reúne com entidades do setor, que viu encontro como uma espécie de acordo de paz

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Ribeirão Preto e Rondonópolis (MT)

O evento era a entrega de moradias populares, mas a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Rondonópolis (MT) nesta sexta-feira (3) foi um aceno ao agronegócio mato-grossense, que na eleição do ano passado esteve majoritariamente com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Um encontro do petista com dirigentes do setor foi visto como um "acordo de paz".

Conhecido polo do agronegócio no Centro-Oeste e com grande produção de grãos para exportação, Rondonópolis recebeu Lula num cenário que guardou semelhanças com a primeira ida do petista à cidade, 20 anos atrás, quando estava no início de seu primeiro mandato como presidente —ele nunca havia voltado ao município.

Mas também há mudanças, como a mostrada pelas urnas no ano passado. Lula não foi ao estado na campanha de 2022. A última vez que o petista esteve em Mato Grosso foi em 2012, em um ato eleitoral em Cuiabá.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é cumprimentado por moradores no lançamento das obras de 200 casas populares em Rondonópolis (MT), em 2003
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é cumprimentado por moradores no lançamento das obras de 200 casas populares em Rondonópolis (MT), em 2003 - Sérgio Lima-6.jun.2003/Folhapress

Em junho de 2003, o petista participou de um evento habitacional, como nesta sexta, e em seu discurso fez citações ao agronegócio, setor que agora está novamente em rota de colisão com o governo federal devido às invasões do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) na Bahia.

"O Brasil, graças a Deus, não deve a nenhum país do mundo em capacidade produtiva, sobretudo, na agricultura. Agora, não adianta produzir se a gente não fizer o nosso produto chegar aos portos", disse Lula em seu discurso duas décadas atrás.

A rejeição a Lula é grande no agronegócio local e no estado. A Folha procurou seis lideranças regionais do setor, mas só duas aceitaram falar com a reportagem sobre o tema, ainda assim de forma reservada.

Para os representantes do agro que se manifestaram, Lula terá de mostrar uma postura de mais equilíbrio em relação às invasões de terra e dar sinais positivos ao setor.

Na avaliação do governo, um desses sinais já foi dado com a nomeação do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), senador por Mato Grosso, na pasta da Agricultura.

Nesta sexta, após o evento para a entrega de 1.440 unidades habitacionais, Lula se encontrou com a instituição Fórum Agro MT, que representa entidades do agro mato-grossense como Acrimat (associação dos criadores), Acrismat (criadores de suínos), Ampa (produtores de algodão) e Aprosmat (produtores de sementes) e, segundo participantes, disse que irá pacificar a relação entre produtores e MST para evitar conflitos.

"O presidente colocou essa questão e afirmou que atuará para evitar conflitos com o MST por conta das invasões. Ele deixou claro que muitas pessoas que estão fazendo isso [invasões] não têm relação com ele e o governo. E alguns nem teriam mais ligações com o MST", disse o presidente do Fórum Agro MT, Itamar Canossa, que também preside a Acrismat.

Ele avaliou a reunião como positiva e viu o encontro como um acordo de paz entre o setor e o governo Lula. "Essa fala nos tranquiliza bastante porque demonstra que o governo entende as nossas preocupações. Tanto que nós apresentamos as nossas demandas e foi ele que citou o MST."

O encontro foi articulado pelo ministro da Agricultura. "Nós apresentamos três demandas e o assunto está sendo tratado de maneira técnica e não política. Nós apresentamos a necessidade de se investir em logística, como a questão das ferrovias, principalmente a Ferrogrão que está paralisada, e a conclusão da duplicação da BR-163. E isso precisa de investimento, principalmente do BNDES. O governo demonstrou estar aberto para isso", disse Canossa.

A reunião durou pouco mais de uma hora. Além do Fórum Agro MT, também participaram associações rurais representando os pequenos produtores, o governador Mauro Mendes (União Brasil), senadores e deputados do estado.

Prefeito anfitrião e apoiador de Lula na eleição, José Carlos Junqueira de Araújo, o José Carlos do Pátio (PSB), disse antes do encontro que a visita auxiliaria nas conversas com o agronegócio.

"A vinda dele aqui, a primeira [visita] à região Centro-Oeste, a satisfação é grande, mas não resta dúvida, o propósito é construir essa relação com o agro, construir essa aproximação com o agro e com toda a sociedade mato-grossense. O presidente Lula, mesmo sendo o político que mais fez por essa região, não ganhou a eleição aqui. É um gesto de estadista dele no sentido de olhar para a frente, construir essa relação", disse o prefeito.

CONFLITOS

A viagem de Lula foi um novo capítulo de uma história que se acentuou no conturbado período eleitoral, em que o presidente foi alvo de movimentos conservadores de Rondonópolis, que instalaram outdoor na cidade chamando-o de "bandido" e "traidor". "Aqui esse bandido é reconhecido como ‘O Traidor da Pátria’. Fora… maldito!", dizia o texto do outdoor.

A peça foi instalada às margens da BR-364 na cidade, que reflete praticamente com exatidão o cenário eleitoral de Mato Grosso em 2022.

Lula obteve somente 35,13% dos votos no segundo turno na cidade, ante os 34,92% que obteve no estado. Bolsonaro alcançou 64,87% e 65,08%, respectivamente.

Grupos conservadores de Rondonópolis (MT) instalaram outdoor chamando Lula de traidor e maldito
Grupos conservadores de Rondonópolis (MT) instalaram outdoor chamando Lula de traidor e maldito - Reprodução Instagram

Não foi, porém, a única cidade do estado a instalar outdoor contra candidaturas da esquerda. Em Sinop, um outdoor assinado pelo Sindicato Rural tinha em seu texto as frases "Eu não voto em ladrão" e "Não a políticos que apoiam a esquerda".

A visita de agora teve uma diferença primordial em relação à de 2002, já que naquele ano Lula alcançou 52,34% dos votos no segundo turno na cidade, quando derrotou José Serra (PSDB).

"Temos que virar a página do processo eleitoral de 22. Olhar o Brasil, com os seus problemas presentes e futuros. O presidente Lula é o presidente de todos os brasileiros, independentemente de quem votou ou não, de qual estado ele ganhou ou não", disse o governador à Folha.

Ele disse que a visita de Lula se deve à relevância que o estado tem por ser líder do agro. "O agronegócio é uma cadeia importante na economia brasileira, e tem em Mato Grosso o seu maior expoente. Talvez seja um reconhecimento do que nosso estado é e daquilo que o agronegócio representa para o Brasil. É um reconhecimento da importância que o estado tem no agronegócio." Na entrega das moradias, Mendes disse que é preciso respeitar a democracia e os vitoriosos nas eleições.

SEGURANÇA

A segurança preparada para esta sexta-feira na entrega dos 1.440 apartamentos no Residencial Celina Bezerra foi mais rígida que a visita de 2003, segundo funcionários da prefeitura que se reuniram com a equipe presidencial na quarta-feira (1º).

Garrafas, embalagens de alumínio, objetos perfurantes, vidros, guarda-chuvas, talheres, hastes de bandeira e capacetes foram vetados e a recomendação da segurança era de que as pessoas não portassem mochilas ou bolsas grandes.

Rondonópolis não cobrou tarifa no transporte coletivo nesta sexta, sob a alegação de atender as famílias que participariam da entrega dos apartamentos.

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